Folha de S.Paulo

Mais uma goleada

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Ana Estela de Sousa Pinto Na Folha desde 1988, já atuou em política, economia, ciências, educação e fotografia

são paulo É erro mortal achar que “em time que está ganhando não se mexe”.

Se há algo de valor em disputa (dinheiro, poder e as infinitas combinaçõe­s entre os dois), alguém vai estudar o vitorioso, entender seu segredo e criar uma estratégia para anulá-lo.

O líder que não antevê esse movimento e fica imóvel é engolido.

Não é por outro motivo que a posse de bola —que já foi critério de qualidade— valeu tão pouco nesta Copa.

Na mesma toada, pontas já encheram nossos olhos, desaparece­ram dos esquemas táticos e reaparecer­am com outra dinâmica, rebatizado­s de wingers.

Brilhou o poder dos meias criativos, e logo marcar no campo todo se impôs. Ação; reação.

Futebol-arte, futebol de resultados, tiki-taka, retranca e contra-ataque, nada é a resposta definitiva, nada está definitiva­mente superado.

Nenhum descanso fica impune quando há competição —vale para o esporte, para os negócios, para a política.

As mulheres continuamo­s perdendo de goleada nesta Copa do Mundo. 32 a 0 nos técnicos das equipes.

99 a 0 nos árbitros das partidas. 86 a 14 na proporção de jornalista­s credenciad­os.

Os números são só a face mais visível de um ambiente em que nem as oportunida­des nem a receptivid­ade são justas.

“A mulher sempre tem que provar que sabe do que está falando”, relata a repórter da Folha Camila Mattoso, que sabe do que está falando.

Ligada a esportes desde criança, as- sim que se formou passou a trabalhar em Londres com Andrew Jennings, repórter da BBC que investigou e noticiou grandes escândalos da Fifa.

Na Inglaterra, Camila cobriu a Olimpíada de 2012. De volta ao Brasil, fez jornalismo esportivo na ESPN, no jornal Lance! e na Folha.

Em 2016, mudou-se para Brasília e para o jornalismo político.

Nesta Copa, cobriu a seleção brasileira na Rússia e reencontro­u o machismo com o olhar mais aguçado de quem saiu e voltou. “É estranho chegar aqui e ouvir as mesmas piadas, as mesmas brincadeir­as. Quem está no meio nem percebe o quão preconceit­uoso o ambiente ainda é.”

As mulheres precisam continuar entrando. Mas quem sabe os homens também ganhassem se se arriscasse­m a sair um pouco. A mudar.

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