Estado de discórdia
Não fossem já bastantes e significativos os percalços que distanciam o conflito israelo-palestino de um fim, eis que surge mais um fator a desestimular esforços por uma melhor convivência.
O Parlamento de Israel aprovou na quinta-feira (19), por 62 votos a 55, uma lei que define o país como “Estado-nação do povo judeu”, e somente a este se faculta o direito de autodeterminação. Ademais, estabelece o hebraico como única língua oficial; o árabe terá “status especial” nas instituições estatais.
De modo compreensível, cidadãos árabes-israelenses —que correspondem a cerca de 20% da população, ou 1,8 milhão de pessoas— alertaram para o risco de se institucionalizarem práticas discriminatórias. Esse grupo se queixa de tratamento diferenciado em relação à maioria judaica no acesso a serviços como saúde e educação.
Outros dois artigos da lei contribuem para agravar o quadro conturbado. Trata-se de reconhecer Jerusalém como capital indivisível de Israel e de conferir “interesse nacional” às colônias em territórios originalmente destinados a um Estado palestino, segundo o plano de partilha aprovado pelas Nações Unidas em 1947.
Essas medidas, cumpre dizer, já eram adotadas na prática pelo primeiro-ministro conservador Binyamin Netanyahu, e a decisão de Donald Trump de transferir a embaixada americana de Tel Aviv para Jerusalém o fortaleceu.
A despeito de ampla recriminação internacional, o líder israelense tem dado aval a novas construções em assentamentos judaicos —os colonos são uma importante base de apoio de seu governo.
Por mais ressalvas que se possam fazer em relação a Netanyahu, o outro lado da disputa tem parcela considerável de culpa pelo cenário moribundo das negociações em prol da solução de dois Estados, a qual esta Folha apoia.
Não há consenso mínimo entre as lideranças palestinas, cindidas entre Fatah e Hamas. Este, no comando da faixa de Gaza, não só se recusa a reconhecer o direito de existência de Israel como explora o ressentimento da população local para instigá-la a atacar o vizinho.
Por essas razões, episódios como o desta sexta-feira (20), em que forças israelenses bombardearam Gaza após um confronto com supostos membros do Hamas na fronteira, tornaram-se quase rotineiros.
Sob tal realidade, qualquer argumento sobre a impossibilidade de dialogar será plausível —o que não justifica, entretanto, que as duas partes perpetuem a inércia atual.