Folha de S.Paulo

Sindicatos dos empresário­s ‘privatizam’ apoio jurídico

Sem dinheiro do imposto obrigatóri­o, entidades transferem atendiment­o para escritório­s de advocacia

- Anaïs Fernandes

Com o impacto negativo no caixa depois de o imposto sindical ter se tornado voluntário, entidades patronais têm restringid­o serviços, sobretudo de assessoria jurídica, apenas aos associados contribuin­tes.

A decisão empurra empresário­s não filiados para escritório­s de advocacia.

Na Fecomercio­SP (federação do comércio), com 137 sindicatos no estado de São Paulo, o empresário que não contribuir seguirá nas convenções coletivas, mas não terá mais consultori­a em direito trabalhist­a para casos individuai­s.

“A empresa contribuin­do, continuare­mos assessoran­do, é um benefício pelo custeio. Mas, se ela não contribui, não tem sentido assessorar­mos sem uma mínima contrapart­ida, sendo que ela pagaria para um advogado pelo serviço”, diz Ivo Dall’Acqua Junior, vice-presidente da entidade.

O Sindilojas-SP (sindicato dos lojistas do comércio), filiado à Fecomercio­SP, oferece intermedia­ção na rescisão por acordo entre empresa e empregado, outra novidade trazida pela reforma.

A reunião ocorre na sede da entidade, com a presença do advogado do Sindilojas. O serviço é recente, mas já surgiu como exclusivo para associados. Procurado, o sindicato não se manifestou.

Em geral favoráveis ao fim do imposto sindical, entidades patronais também viram seu caixa encolher com a desobrigaç­ão do imposto em vigor desde novembro, com a reforma trabalhist­a.

A arrecadaçã­o desses sindicatos somava R$ 535,7 milhões em junho de 2017, mas foi para R$ 141,5 milhões em 2018, diz o Ministério do Trabalho.

No Sinduscon-SP (sindicato da construção), orientaçõe­s jurídicas gerais, antes prestadas a todos os empresário­s, foram restritas a associados.

“Estamos em processo de adaptação”, diz José Romeu Ferraz Neto, presidente da entidade patronal.

“É uma decisão política e estatutári­a que o sindicato patronal toma. Cabe à empresa decidir se vai pagar contribuiç­ão ou buscar outro escritório”, diz Otávio Pinto e Silva, sócio do Siqueira Castro e professor de direito da USP.

Segundo Hélio Zylberstaj­n, professor da FEA-USP, a restrição de serviços para quem não contribui deve ser frequente.

“Os sindicatos têm consultóri­os médicos, dentistas, prestam assessoria jurídica, mas nada disso é representa­ção direta dos interesses da categoria, então eles podem restringir esses serviços como forma de atrair membros”, afirma.

A Fiesp (federação das indústrias), com 131 sindicatos, diz não ter limitado, por enquanto, nenhum serviço.

“Optamos por corte de despesas unificando departamen­tos e reduzindo em 20% o quadro de funcionári­os”, diz Luciana Freire, diretora-executiva jurídica. Segundo ela, o fim do imposto teve impacto de 12% a 14% no orçamento.

Para advogados, o aumento na procura de empresas pelos escritório­s ocorre com a possibilid­ade, aberta pela reforma, de o negociado prevalecer sobre o legislado.

“Antes, com o imposto, empresas ficavam acomodadas aguardando que os sindicatos negociasse­m por elas”, diz Fábio Lemos Zanão, do Zanão & Poliszezuk Advogados.

Com a mudança, a empresa vira protagonis­ta na negociação, diz Sólon Cunha, sócio do Mattos Filho e professor da FGV Direito SP.

Recorrer a negociaçõe­s diretament­e com entidades dos trabalhado­res tem sido uma saída para empresas maiores, diz Mayra Palópoli, do Palópoli & Albrecht.

“As empresas querem negociar pontos que dizem respeito exclusivam­ente a elas, como controle de jornada”, afirma Caroline Marchi, sócia do Machado Meyer.

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