Lei que desburocratiza pesquisa tem gargalo na universidade
Cientistas dizem que ainda há obstáculos para que o país consiga usufruir das mudanças promovidas pelo Marco Legal da Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I), sancionado em 2016 e regulamentado neste ano.
A meta era facilitar a contratação de serviços, por meio de dispensa de licitação, ampliação das possibilidades de convênio entre instituições públicas e empresas, simplificação da gestão de projetos de CT&I e desburocratização dos processos de importação.
O problema é que ainda não houve a adaptação das universidades, instituições públicas e estados. O tema foi discutido em uma mesa redonda da reunião anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, maior evento científico do país, que acontece em Maceió, no campus da Universidade Federal de Alagoas.
“Eu esperava que não se criasse uma corrida de barreiras —salta a primeira e vêm outras cada vez mais altas”, disse Helena Nader, presidente de honra da SBPC, sobre as dificuldades que aparecem dentro de institutos de pesquisa.
“O que eu estou vendo em muitas instituições [públicas] é o seguinte: quem conseguir em seis meses fazer uma parceria [com uma empresa], é um felizardo. Só que nenhuma relação com o setor produtivo aguenta ou pode esperar seis meses.”
Gianna Sagazio, diretora de inovação da Confederação Nacional da Indústria, disse que o marco pode ajudar o Brasil a melhorar seu desempenho na inovação.
Hoje o país ocupa a 64ª posição entre 126 países, apesar do posto de oitava economia do mundo, no Índice Global de Inovação. Ele é publicado anualmente pela Universidade Cornell, o Instituto Europeu de Administração de Empresas (INSEAD) e a Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI).
No quesito, o Brasil perde para Costa Rica (54º), México (56º) e Bolívia (63º).
Com os incentivos à inovação para benefício tanto da indústria quanto de instituições públicas —que podem, de acordo com as regras vigentes, inclusive fundar uma empresa em conjunto— espera-se que o Brasil se aproxime das primeiras colocações no ranking de inovação.
Para Alvaro Prata, secretário de Políticas e Programas de Pesquisa e de Desenvolvimento do MCTIC (Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações), o paradoxo no país chega a ser tão grande que “é possível que tenhamos um especialista em doenças tropicais e, ao redor dele, as pessoas estejam morrendo de malária”.
Ainda falta que as instituições estabeleçam suas visões sobre o marco legal e deixem claro os caminhos internos que os processos de formação de convênio ou de contratação em regime especial devem percorrer, diz Prata.
Francilene Garcia, secretária de Ciência, Tecnologia e Inovação da Paraíba e presidente do Consecti, que representa as secretarias estaduais de CT&I, explica que um dos gargalos é a atualização das constituições estaduais, para que os pontos modificados pelo marco legal sejam postos em prática —como a isenção de impostos e facilitação de importação de produtos para pesquisa.
As mudanças podem se dar tanto por decretos quanto por lei ordinária.
Um risco, porém, é o de que, em meio às mudanças, as fontes de financiamento para as fundações estaduais de amparo à pesquisa (Faps) deixem de ser garantidas.