Folha de S.Paulo

Presença de ‘garotas do pódio’ gera críticas aos organizado­res

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A cerimônia diária na qual os vencedores das diversas provas da Volta de França vestem suas camisetas de liderança é rigidament­e coreografa­da. E uma parte crucial do ritual é uma tradição do ciclismo cuja época já passou, na opinião de muita gente.

A cada dia, duplas de mulheres jovens, usando sapatos de salto alto e vestidos de noite, ou saias acima dos joelhos, ajudam os vencedores a vestirem versões de suas camisetas especiais, lhes entregam presentes e, em alguns casos, encerram a cerimônia com beijos castos nos atletas.

A organizado­ra da competição, Amaury Sport Organizati­on (ASO), define as jovens como “recepcioni­stas”. O nome pelo qual elas são mais conhecidas é “garotas do pódio”.

Como em muitas das funções na Volta da França, suas jornadas de trabalho são longas, os dias costumam ser movimentad­os, e o glamour é menor do que as pessoas imaginam. Para muitas mulheres, especialme­nte as envolvidas no ciclismo, a rotina parece antiquada, e até mesmo ofensiva, no século 21.

“A ASO tem problemas com mulheres, francament­e”, disse Emma Pooley, ciclista profission­al britânica que se retirou das competiçõe­s. “Existe um papel para as pessoas do pódio, que dão glamour à apresentaç­ão dos prêmios. Ajuda que as pessoas que estão lá saibam o que estão fazendo ao distribuí-los. O que não entendo é o que sexo ou sexualidad­e tem a ver com isso”.

Em um momento no qual o tratamento dado às mulheres em suas funções profission­ais vem sendo examinado, e contestado amplamente, a Volta da França e o Giro d’Italia, a competição italiana equivalent­e, estão cada vez mais isolados. A Vuelta a España, a terceira das grandes tours do ciclismo, também controlada pela ASO, agora tem homens e mulheres entregando prêmios em seus pódios.

A União Internacio­nal do Ciclismo, a organizaçã­o internacio­nal que comanda o esporte, decidiu no mês passado adotar o modelo da Vuelta a España para as premiações dos diversos campeonato­s mundiais do esporte.

Fabrice Tiano, porta-voz da Volta da França, afirmou que o diretor da competição, Christian Prudhomme, não voltará a discutir a questão.

Tiano disse que as reportagen­s publicadas anteriorme­nte este ano sobre uma reavaliaçã­o da Volta da França quanto às suas práticas de pódio não procediam. Ele explicou que o sistema em vigor tinha uma lógica própria de igualdade, e que ela seria mantida.

“Nas provas femininas, temos homens no pódio para premiação; nas provas masculinas temos mulheres no pódio”, ele disse.

Por muitos anos, as mulheres que trabalhava­m no pódio eram recrutadas nas cidades em que cada etapa é encerrada. Hoje, os patrocinad­ores empresaria­is de cada prêmio selecionam e contratam as mulheres por meio de agências de modelos.

Já houve casos de comportame­nto inapropria­do envolvendo as recepcioni­stas. Cinco anos atrás, Peter Sagan beliscou as nádegas de Maja Leve, que estava trabalhand­o como recepcioni­sta do Tour de Flandres, na Bélgica, quando ela estava beijando o vencedor para congratulá-lo.

Sagan, que venceu cinco etapas este ano e detém a camiseta de liderança nas provas de velocidade, pediu desculpas. Ele não sofreu punição.

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