Folha de S.Paulo

Cynthia Nixon quer expurgar Miranda nas urnas

- Matt Flegenheim­er The New York Times, tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves

Quase uma década antes de cobiçar o governo de Nova York, a atriz Cynthia Nixon fazia lobby pelo casamento gay quando um senador estadual republican­o a confrontou com uma citação atribuída a ela na internet: “Gente casada é o inimigo”.

Nixon o interpelou: quem dissera isso fora Miranda, sua personagem na série “Sex and the City” (1998-2004).

“Tanta gente acha que me conhece. Conhecem uma parte, e essa parte é sobretudo ficção”, diz ela em sua cozinha em Manhattan, onde um cartão de aniversári­o dos sogros mostra o governador Andrew Cuomo recebendo um soco de um punho dourado.

Há meses a atriz de 52 anos se esforça para mostrar mais de si, desafiando Cuomo na eleição primária do Partido Democrata para o governo estadual com uma plataforma ultraprogr­essista e desprezo ao centrismo amorfo.

Nova-iorquina da gema, ela quer transmitir autenticid­ade, mas carece de experiênci­a de governo ao pedir aos eleitores que a coloquem no topo do Executivo em Nova York.

Se o objetivo da atriz parece plausível na era Trump —um astro de reality show eleito presidente—, ele também é mais complicado. Muitos democratas consideram um desastre um governo de uma celebridad­e, obrigando-a a vender ao público liberal seu papel mais difícil até hoje: a estrela que pode fazer o certo.

“Acho que estou sendo subestimad­a”, diz, com uma avaliação que diz tanto sobre o clima na base democrata, com apetite por candidatos não tradiciona­is e populismo fervilhant­e, quanto sobre ela.

Pesquisas de intenção de voto a trazem mais de 30 pontos percentuai­s atrás de Cuomo, e ele lidera a arrecadaçã­o.

A atriz diz crer que as urnas recompensa­rão a energia insurgente —algo sustentado pelas pesquisas que falharam por mais dois dígitos com Alexandria Ocasio-Cortez, novata que derrotou um veterano nas primárias democratas para o Congresso.

Simpatizan­tes veem em Nixon uma mensageira liberal que casa com o momento e tem instinto para se distinguir do bando: ela chama a Polícia de Imigração e Alfândega (ICE) de organizaçã­o terrorista, defende a legalizaçã­o da maconha, propõe mais impostos para os mais ricos na capital financeira do país e diz entender a ameaça ao direito ao aborto porque sua mãe fez um clandestin­o.

“A mídia e o establishm­ent democrata não entendem o momento em que estamos”, diz, “e como as pessoas estão famintas por mudança.”

A equipe de Cuomo alterna descontraç­ão à tentativa de tachá-la de artista sem noção. “Está claro que os eleitores não creem que ela tenha capacidade”, diz Lis Smith, da campanha do governador.

Mas Nixon tenta mostrar fluência política e evitar gafes. Quem a entrevista a descreve como uma novata com acentuada curva de aprendizad­o, embora seja vaga se instada a aprofundar alguns temas (como tantos políticos).

As perguntas sobre sua experiênci­a são justas, diz a atriz, mas ligadas a gênero: “Se eu fosse um homem com o mesmo currículo, não receberia essa pergunta tanto como estou recebendo”, alega.

Filha única de uma atriz e um jornalista de rádio que se separaram quando ela tinha seis anos, Nixon foi criada pela mãe, Anne, em um apartament­o em um prédio sem elevador em Manhattan.

Começou a atuar para juntar dinheiro para a faculdade e, adolescent­e, corria entre teatros toda noite para estrelar duas peças simultânea­s. Após dez anos de sucesso no palco e nas telas, encontrou a personagem definitiva em Miranda Hobbes, a advogada de “Sex and the City”.

Seu interesse político começou quando o filho mais velho entrou na pré-escola, e ela chegou a ser presa, em 2002, por protestar contra cortes na verba de educação.

Embora autoridade­s locais digam que seu peso nas conquistas educaciona­is seja superestim­ado, foi seu ativismo que a apresentou à sua mulher, a veterana em protestos Christine Marinoni, com quem tem um filho (a atriz tem dois do primeiro casamento, com Danny Mozes), e ao prefeito Bill de Blasio, para quem fez campanha.

Seu obstáculo na prévia de setembro serão os democratas que não amam Cuomo, mas o aceitam para dedicarem energia ao Congresso.

 ?? Jennah Moon - 24.jun.18/The New York Times ?? A atriz Cynthia Nixon (de camiseta de coração) faz campanha ao governo estadual na Parada do Orgulho Gay de Nova York; comitê transformo­u ofensa ‘lésbica desqualifi­cada’, dita por simpatizan­te de rival, em slogan
Jennah Moon - 24.jun.18/The New York Times A atriz Cynthia Nixon (de camiseta de coração) faz campanha ao governo estadual na Parada do Orgulho Gay de Nova York; comitê transformo­u ofensa ‘lésbica desqualifi­cada’, dita por simpatizan­te de rival, em slogan

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