Folha de S.Paulo

Nadadoras tentam emergir depois da depressão

- Harry How - 25.jul.18/AFP Karen Crouse The New York Times, tradução de Paulo Migliacci

A prova feminina dos 200 metros em estilo livre, no campeonato nacional de natação dos Estados Unidos, serviu como um gigantesco tubo de ensaio para estudar a cultura da saúde mental no esporte.

Allison Schmitt, que participou de três Olimpíadas e conquistou oito medalhas, avançou para a final, depois de falar francament­e sobre sua luta contra a ansiedade quanto ao desempenho e à depressão.

Fechando a final C em terceiro lugar, ou seja, no 19º posto da classifica­ção geral do torneio, Missy Franklin, que participou de duas Olimpíadas e conquistou seis medalhas, viu na prata conquistad­a por Schmitt um motivo para acreditar que ela também conseguiri­a voltar à superfície.

Franklin, no passado uma menina que sempre parecia exuberante e muita gente encarava como o novo Michael Phelps, agora se vê forçada a tentar emergir de profundeza­s obscuras. Seis anos atrás, aos 17 anos, ela conquistou quatro medalhas de ouro na Olimpíada de Londres.

Na semana passada, depois de uma cirurgia nos dois ombros e em meio à constante batalha contra a depressão, ela fracassou em busca de vaga na equipe que representa­rá os EUA no torneio Pan-Pacífico deste ano e no Mundial de natação de 2019, o que significa que sua próxima grande competição internacio­nal será a Olimpíada de 2020 —se ela conseguiu chegar lá.

“Ver Allison Schmitt esta noite me inspirou muito”, disse Franklin, sobre outra campeã que enfrentou uma doença mental. “É incrível que ela tenha conseguido, e com essa rapidez. Mas acredito, até por isso, que tenho de tomar cuidado e não me comparar a ela, para não me sentir desencoraj­ada com a situação em que estou agora”.

Ao concluir a sentença, Franklin estava segurando as lágrimas. A demonstraç­ão de vulnerabil­idade já deveria ser vista como triunfo. Em 2016, Franklin disputou sua segunda Olimpíada, mas não conseguiu avançar à final nas duas modalidade­s individuai­s em que competiu.

Ela ficou com uma medalha de ouro por nadar uma das primeiras pernas de prova de revezament­o, e tentou desesperad­amente fingir que isso a deixava feliz. O esforço a deixou esgotada, deprimida e desesperad­a por respostas.

Segurando novas lágrimas, na noite de quinta-feira (26), Franklin disse que tentar resolver isso tudo e voltar a amar o esporte vem sendo uma jornada complicada”.

Abrindo caminho para Franklin, 23, está Schmitt, 28, que depois da prova vestia camiseta com os dizeres “a saúde mental é tão importante quanto a saúde física”. Empinando o peito, ela perguntou: “Você gosta da mensagem?”

Franklin não é como Schmitt, que disse que a natação salvou sua vida porque a forçava a sair da cama a cada manhã para treinar quando ela estava se sentindo profundame­nte deprimida. O esporte lhe dava um propósito.

“No meu caso acho que o esporte era mais a causa do desânimo”, disse Franklin, rindo.

“Serei bem honesta. Havia muitos dias em que me levantar e ir para o treino era absolutame­nte a última coisa que eu queria. Mas ficar deitada na cama quase me fazia sentir ainda pior, e mais culpada, e conduzia a uma espiral de emoções, a sentimento­s negativos quanto a mim mesma, por não conseguir encontrar motivação”.

A resposta sucinta sobre o motivo de Franklin para voltar ao esporte que lhe deu tantas coisas e, recentemen­te, também lhe causou muita dor é que ela não quer sentir arrependim­ento.

“Penso muito no longo prazo quando tento estabelece­r minhas metas”, disse Franklin, cujo foco é a seletiva americana para a Olimpíada de 2020.

“Por exemplo, sobre o que acontecerá se, ao chegar lá, depois de dois anos e meio de treinament­o muito sacrificad­o, eu não conseguir a vaga. E sempre digo a mim mesma que prefiro 100 vezes estar [na seletiva] em 2020 e não conseguir a classifica­ção, sabendo que tentei, do que contemplar os dois anos passados e pensar no que poderia ter sido”.

“Havia muitos dias em que me levantar e ir para o treino era absolutame­nte a última coisa que eu queria. Mas ficar deitada na cama quase me fazia sentir ainda pior Missy Franklin nadadora americana

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A nadadora Missy Franklin após competir na seletiva americana, em Irvine, na Califórnia

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