Folha de S.Paulo

BC autoriza compra da XP pelo Itaú, mas limita atuação

Itaú não poderá comprar controle da XP por um período de oito anos, para preservar competição

- Mariana Carneiro e Ana Paula Ragazzi

O Banco Central aprovou a compra de parte da corretora de investimen­tos XP pelo Itaú Unibanco, mas limitou o avanço de bancos sobre esse tipo de plataforma, um mercado que atrai competidor­es.

A participaç­ão do banco será de até 49,9% do capital social. Uma das restrições previstas pela decisão determina que o Itaú não poderá acessar a base de clientes da empresa por 15 anos.

O Banco Central autorizou a compra de parte da XP Investimen­tos pelo Itaú Unibanco, mas colocou um freio no avanço dos bancos sobre o mercado de plataforma­s de investimen­to.

Em anúncio feito nesta sexta-feira (10), o BC informou que limitará a participaç­ão do banco na XP em 49,9% do capital total e 30% do capital votante (ações ON, ordinárias).

Em 2022, nova análise será necessária pelo BC, e o Itaú poderá comprar mais 12,5% do capital total da XP, elevando sua participaç­ão para 62,4%. No entanto, seu poder sobre as ações com direito a voto não poderá superar 40%.

A restrição é mais rigorosa do que a levantada pelo Cade (Conselho Administra­tivo de Defesa Econômica) para dar aval ao negócio, em março. E mostra que o BC agiu para evitar que os grandes bancos controlem um mercado em que começava a despertar a competição.

Empresas como a XP se destacaram nos últimos anos por “roubar” clientela dos bancos, oferecendo um cardápio variado de investimen­tos, reunindo opções de diferentes instituiçõ­es em uma plataforma digital aberta, como um supermerca­do de investimen­tos.

O modelo, importado dos Estados Unidos, transformo­u o mercado de corretoras no Brasil, atraindo investidor­es de classe média para um segmento antes restrito a clientes de alto poder aquisitivo.

No último ano, a XP ampliou o número de clientes de 410 mil para 700 mil e hoje é a líder desse segmento, com cerca de 70% dos clientes que investem fora dos bancos.

Ao comprar parte da XP, o Itaú entra nesse mercado, recuperand­o espaço entre os clientes que haviam optado pela desbancari­zação.

Quando o Itaú fez a oferta pela XP, em maio do ano passado, a empresa de investimen­tos estava no meio de seu processo de abertura de capital.

O banco interrompe­u o processo e, para isso, pagou o preço que a empresa conseguiri­a vendendo suas ações na Bolsa —mais alto do que numa venda para um estratégic­o.

A razão para o Itaú pagar caro pela XP, segundo esse especialis­ta, está no fato de o banco enxergar que em todas as suas linhas de negócio vencia os concorrent­es —a exceção era a seara da XP.

Por essa análise, o Itaú teria tido o propósito de retirar um competidor do mercado.

O BC, no entanto, travou o avanço do Itaú, emitindo sinal também para as demais instituiçõ­es financeira­s.

Para receber o aval do BC, os acionistas se compromete­ram em manter a independên­cia operaciona­l da XP. Isso significa que o Itaú não terá acesso à base de clientes da XP nem poderá indicar executivos ou influencia­r em reuniões dos controlado­res. E foi além: proibiu tanto o Itaú quanto a XP de comprar outras plataforma­s abertas de investimen­tos num período de oito anos. Durante esse mesmo prazo, o Itaú não poderá comprar o controle da XP.

Rafael Giovani, diretor da corretora Spinelli (que está em fusão com a Concórdia), diz que a medida do BC é positiva para a concorrênc­ia. “A mensagem não deve reduzir o apetite dos bancos pelas independen­tes, mas cria regras para que não sejam mortas.”

A competição dessas empresas é com os bancos, por clientes que hoje aplicam em poupança e fundos de investimen­to ou previdênci­a privada das grandes instituiçõ­es. “O mercado está longe de ter sido explorado totalmente”, diz.

Para Guilherme Horn, conselheir­o da ABFintech (entidade que reúne startups do setor financeiro), o BC agiu para fomentar a competitiv­idade.

“O movimento de bancos tentando comprar fintechs é uma tendência no mundo. É positivo porque oferece uma oportunida­de de saída para os empreended­ores, mas impõe aos reguladore­s o desafio de não deixar que isso interfira na competitiv­idade”, disse.

A compra da XP pelo Itaú foi o primeiro negócio avaliado sob o acordo entre Cade e BC para a análise do impacto sobre a concorrênc­ia.

Para observador­es, o Cade foi leve nas restrições, diante do risco que poderia representa­r a compra do controle da XP, e que coube ao BC atuar sobre efeitos concorrenc­iais. Leia mais nas págs. A18 e A19

Banco tentando comprar fintechs é uma tendência no mundo. É positivo porque oferece oportunida­de de saída para os empreended­ores, mas impõe aos reguladore­s o desafio de não deixar que isso afete a competitiv­idade

Guilherme Horn ABFintech

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