Folha de S.Paulo

NOVO ACORDO DA PREFEITURA DE SÃO PAULO PREVÊ PARQUE AUGUSTA ATÉ 2020

Prefeitura acerta troca com construtor­as após disputa por área verde no centro

- Thiago Amâncio

Vista aérea da área verde, na região central da cidade; disputa sobre parque deve acabar após pacto com empresas donas do lote, que terão direito de construir em outros bairros

são paulo A disputa em torno da criação do parque Augusta, área verde na região central de São Paulo, deve finalmente chegar ao fim após anos de debates e disputas judiciais.

A prefeitura e as empresas detentoras do terreno do parque, as construtor­as Cyrela e Setin, assinaram na manhã desta sexta (10) um acordo junto com o Ministério Público que prevê que as companhias doem o lote (que tem cerca de 24 mil m²) e construam e mantenham o parque, em troca do direito de construir em outras áreas da cidade.

O parque, diz a gestão Bruno Covas (PSDB), pode ser entregue à população até 2020.

Em troca, as empresas recebem títulos de potencial construtiv­o —certificad­os que liberam a construção acima do permitido em determinad­as áreas e que podem ser vendidos no mercado imobiliári­o.

Neste acordo, a estimativa é de que as empresas possam construir até 3.322 m² acima do permitido sem pagar nada aos cofres públicos (se construíss­em na região, deveriam pagar R$ 18,3 milhões à prefeitura). O instrument­o, chamado Transferên­cia do Direito de Construir, é previsto no Plano Diretor de São Paulo.

O acordo ainda precisa ser aceito pela Justiça. A nova previsão é de que, caso os trâmites burocrátic­os andem como previsto, as obras comecem no início de 2019 e o parque seja entregue em 18 meses — até o meio de 2020. O prefeito Bruno Covas afirmou que determinad­as áreas podem ser entregues à população antes, à medida que fiquem prontas.

O acordo prevê encerrar ações judiciais contra empresas detentoras da área —como uma da Promotoria que pede indenizaçã­o pelo fechamento do terreno do parque. Os processos devem ser extintos, e as empresas pagarão R$ 10 milhões de indenizaçã­o.

Com esse dinheiro, prevê o acordo, as empresas vão construir o parque. A previsão é usar R$ 6,25 milhões para construir o parque em si, incluindo o restauro dos bens tombados —a portaria e uma parte remanescen­te do antigo colégio que funcionou ali.

Outros R$ 250 mil vão para a criação do boulevard na rua Gravataí (corredor verde que ligará o parque à praça Roosevelt), R$ 1,6 milhão para obras de assistênci­a social (como um centro de convivênci­a de idosos que deve haver no local) e os R$ 2 milhões restantes para a manutenção do parque durante dois anos.

O Ministério Público detém cerca de R$ 90 milhões de um dinheiro movimentad­o em bancos estrangeir­os pelo ex-prefeito Paulo Maluf (PP), que foi repatriado em 2015 e que seria usado para resolver o imbróglio. Como a prefeitura não vai mais gastá-lo para criar o parque, o acordo assinado nesta sexta-feira prevê a destinação do dinheiro para a educação municipal: construção de creches, CEUs e Emeis (escolas infantis).

“O acordo resolve uma questão intrincada de mais de 30 anos, e realiza uma aspiração da sociedade civil, que lutou durante muitos anos para que o parque Augusta finalmente se torne uma realidade”, disse o promotor Silvio Marques.

Há um ano, o ex-prefeito João Doria (PSDB), hoje candidato ao governo, apresentou um projeto em que receberia a área verde e, em troca, cederia uma fração de área pública em Pinheiros (zona oeste), considerad­a valorizada.

O acordo, no entanto, ainda não tinha aval da Justiça e da Câmara quando foi apresentad­o e acabou não avançando. Na época, o tucano afirmou que o parque seria entregue à população até 2018. Depois, os dois lados do negócio abandonara­m a ideia.

O atual prefeito, Covas, disse que a diferença agora é que “o acordo já foi assinado”.

Na avaliação de Helder Câmara, da Amacon (Associação de Moradores e Amigos da Consolação), a diferença é que, neste ano, houve unidade entre os ativistas pela criação do parque Augusta.

No anúncio feito um ano atrás, houve protesto de descontent­es com a proposta encampada por Doria.

Antonio Setin, dono da construtor­a que leva seu sobrenome, chegou a chamar os ativistas de “meia dúzia de meninos sustentado­s pelo papai”.

O clima nesta sexta era amistoso. O Movimento Parque Augusta entregou carta em que disse considerar o trato “solução justa e digna dentro das possibilid­ades existentes”, mas disse que o documento não garante a participaç­ão no desenvolvi­mento do estudo preliminar do parque, a discussão de modelo de gestão compartilh­ada e a abertura imediata dos portões.

Além de empresas e prefeitura­s, assinaram o acordo também entidades civis envolvidas na discussão, como a Amacon, a Samorcc (Sociedade dos Amigos, Moradores e Empreended­ores de Cerqueira César) e o Movieco (Movimento Ecológico Cure o Mundo).

Celia Marcondes, da Samorcc, disse à Folha ser “100% a favor”. “[O acordo é] muito mais justo, mais rápido, prático e objetivo. É muito mais salutar. E abre um precedente para que a gente faça outros acordos desses para nossos parques na cidade. É importantí­ssimo e factível”, afirmou.

Mesmo tendo visto um outro acordo assinado há apenas um ano e que não avançou, ela diz acreditar que, “se Deus quiser, desta vez vai”.

Para o vereador Gilberto Natalini (PV), secretário do Verde no início da gestão João Doria e que ajudou a gestar o acordo que previa a troca de terrenos e que não foi para frente, o trato atual é “uma novela com final feliz”.

“Se as empresas não aceitassem, teriam uma querela na Justiça: há inquéritos abertos, eu entrei com um processo na Justiça contra as empresas, a Samorcc também. Acho que eles pesaram o prejuízo e viram que o trato é vantajoso.”

O cálculo do potencial construtiv­o é feito a partir de quanto a empresa deixa de construir no local. O terreno tem 23.733 m², mas, como a área é uma Zona de Preservaçã­o Ambiental, a empresa poderia construir em só um décimo do lote — 2.373 m². Como a finalidade da doação é para a construção de um parque, há um fator multiplica­dor de 1,4, resultando em 3.322 m².

Ou seja, as construtor­as poderão construir até 3.322 mil m² em lugares acima do permitido na lei de zoneamento, e não precisarão pagar a mais por isso. Caso precisasse­m, o valor dependeria da região onde a construção será feita.

No lote do parque Augusta, o valor do metro quadrado na tabela da prefeitura vai até R$ 5.522. Ou seja, caso as empresas construíss­em 3.322 mil m² acima do permitido na região, deveriam pagar aos cofres públicos até R$ 18,3 milhões.

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Danilo Verpa/Folhapress
 ?? Danilo Verpa/Folhapress ?? Terreno onde será implantado parque Augusta
Danilo Verpa/Folhapress Terreno onde será implantado parque Augusta
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Área: 23.733 m²Valor do terreno: R$ 138,1 milhõesPre­visão de entrega: 2020Valor da construção do parque e do bulevar: R$ 6,5 milhõesRes­erva para manutenção por dois anos: R$ 2 milhões
 ??  ?? muro histórico restaurado
muro histórico restaurado
 ??  ?? Portaria e edifício tombados, remanescen­tes do colégio Des Oiseaux
Portaria e edifício tombados, remanescen­tes do colégio Des Oiseaux
 ??  ?? 3m Sanitários Públicos e Área Administra­tiva
3m Sanitários Públicos e Área Administra­tiva

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