Folha de S.Paulo

Pós-graduação paga é proposta dura de Alckmin

- André Singer Professor de ciência política da USP, é autor de “O Lulismo em Crise”. Escreve aos sábados

Se a Petrobras pode ser vendida, por que não o sistema público de ensino superior? Destruir o etos das universida­des gratuitas constitui objetivo do conservado­rismo.

Em passagem pouco comentada da entrevista de Geraldo Alckmin à Globonews (2/8), o candidato do PSDB defendeu a cobrança de mensalidad­e nos cursos de pós-graduação das universida­des públicas.

Perguntado se era favorável ao ensino superior pago, o exgovernad­or paulista respondeu: “O primeiro passo seria cobrar toda a pós-graduação”, deixando implícito que o segundo atingiria a graduação.

Apresentad­a no tom suave que costuma caracteriz­ar as falas do tucano, trata-se de proposta dura. Vale lembrar que a eliminação da gratuidade universitá­ria foi uma das importante­s medidas adotadas pelo governo do general Augusto Pinochet no Chile (1973-1990).

O país de Salvador Allende teve que esperar décadas, e passar pela mais importante movimentaç­ão de massa pós-redemocrat­ização, para reinstitui­r a universida­de pública e gratuita em janeiro passado.

Por que o prudente político resolveu mexer no vespeiro quando sabe que o pagamento da pós-graduação resolveria pouco da crise de financiame­nto da educação superior? A resposta tem a ver com a corrida no campo conservado­r.

Está na internet que, uma semana antes da declaração de Alckmin, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do candidato Jair Bolsonaro, em passagem por Bauru, interior de São Paulo, havia afirmado ser favorável a privatizar toda a educação: “Quem não reunir condições financeira­s para pagar, receberia uma bolsa do governo, para escolher a escola ou a universida­de privada que entender ser melhor”.

A fala do clã bolsonaris­ta está em linha com a visão privatista radical anunciada pelo guru econômico do pai, Paulo Guedes. Pergunto-me, se a Petrobras pode ser vendida, por que não o sistema público de ensino superior?

Ao defender a pós-graduação paga, Alckmin está dialogando e tentando atrair votos de setores que foram bem longe no caminho do privatismo.

As universida­des públicas têm sido o principal foco de resistênci­a ao golpe parlamenta­r e ao desmonte do que existe de Estado de bem-estar social no Brasil. Destruir o seu etos —e é isso que a cobrança de mensalidad­e faz ao mercantili­zar o conhecimen­to— constitui objetivo programáti­co do conservado­rismo. Desconfio que o tema veio para ficar.

Na semana passada, escrevi que o atual Partido Socialista Brasileiro (PSB) foi fundado pelo ex-governador Miguel Arraes. O ex-ministro e ex-presidente da agremiação Roberto Amaral esclarece que a legenda foi refundada em 1985, depois de ser extinta pela ditadura militar de 1964, sob a liderança de Jamil Haddad e Antônio Houaiss, tendo Arraes ingressado apenas em 1990.

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