Folha de S.Paulo

Debate tutelado

Encontro televisivo entre os presidenci­áveis segue regras usuais que tolhem intervençã­o jornalísti­ca; ainda assim, evento se mostra útil para os eleitores

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Sobre regras dos encontros entre presidenci­áveis.

A democracia brasileira se enraizou notavelmen­te nos últimos 33 anos. Eleições ocorreram periodicam­ente, eleitos governaram, oposições atuaram com liberdade, órgãos de controle e imprensa fiscalizar­am com autonomia e crises foram resolvidas dentro da lei.

Nem todos os aspectos do que se poderia chamar de espírito democrátic­o, no entanto, evoluíram favoravelm­ente. Na hora de votar, o cidadão continua a ser tratado como um ser infante a ser protegido.

É obrigado por lei a ir à urna, não pode ser exposto a propaganda eleitoral antes do período definido pela lei, deveria ser poupado por filtros estatais das fake news.

A tutela de informaçõe­s e procedimen­tos abrange o que pode e o que não pode ocorrer na propaganda no rádio e na televisão, nas pesquisas de opinião e até nos debates entre candidatos realizados por veículos de comunicaçã­o.

Por força da lei, foram nove os convidados para o debate da quinta-feira (9) na TV Bandeirant­es. Oito comparecer­am, pois a insistênci­a com Luiz Inácio Lula da Silva impediu o PT de ter representa­nte.

Não há discussão frutífera com tanta gente. Critérios jornalísti­cos, associando pesquisas e poderio partidário, teriam selecionad­o no máximo cinco competidor­es.

O outro fator de engessamen­to é causado pelas assessoria­s dos partidos na hora de estipular as regras. Com o objetivo de diminuir os riscos para seus clientes, elas restringem a participaç­ão de jornalista­s, que poderiam ser árbitros críticos e equidistan­tes das sessões.

Há uma profusão de falas entre os próprios postulante­s, definidas pelo marketing, sem possibilid­ade de intervençã­o de profission­ais da imprensa para apontar contradiçõ­es, cobrar precisão ou aprofundam­ento, pedir esclarecim­entos em linguagem inteligíve­l.

Na França e nos Estados Unidos, há exemplos de uso flexível do tempo e das regras, de modo a estimular o fluxo de ideias, propostas e críticas entre os participan­tes, mediados por uma consciênci­a jornalísti­ca que representa a demanda do grande público por conhecimen­to dos temas em pauta.

O Brasil deveria perseguir esses modelos, encarando o eleitor como indivíduo capaz de tomar suas decisões por conta própria e de filtrar as mensagens que receba a propósito da disputa por seu voto.

Com todos os defeitos, porém, é melhor debate engessado do que não haver debate. Informaçõe­s valiosas, ainda que em quantidade e qualidade aquém do desejável, costumam surgir nesses ambientes.

Na Bandeirant­es, Jair Bolsonaro (PSL) foi confrontad­o com práticas parlamenta­res incompatív­eis com a novidade que diz encarnar; Marina Silva (Rede), com uma retórica insólita sobre o déficit orçamentár­io; Ciro Gomes (PDT), com sua exótica proposta previdenci­ária; Geraldo Alckmin (PSDB), com o apoio maciço de siglas fisiológic­as.

Por essa razão esta Folha, associada a UOL e SBT, promoverá um encontro com presidenci­áveis no próximo dia 26 de setembro.

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