Colômbia deixa Unasul por causa de Venezuela
Novo governo acusa instituição de ‘cumplicidade com ditadura’ e agrava crise regional; Brasil pode reavaliar atuação
O recém-empossado governo colombiano anunciou nesta sexta-feira (10) que está se retirando da Unasul (União de Nações Sul-Americanas), por considerar a instituição “cúmplice da ditadura venezuelana” e disse que países como Chile, Argentina e Peru poderão fazer o mesmo.
A decisão, comunicada pelo chanceler Carlos Holmes Trujillo, veio acompanhada da declaração de que Bogotá buscará uma “coalizão democrática internacional” para defender eleições livres na Venezuela, que enfrenta uma grave crise política, humanitária e econômica e de onde já fugiram quase 900 mil pessoas rumo ao país vizinho.
A saída da Colômbia da Unasul, promessa de campanha do presidente Iván Duque, que tomou posse na terça (7), é mais um golpe na organização que está paralisada, sem recursos e sem secretário geral há 20 meses.
“Estamos em consultas com outros países que, aparentemente, querem seguir o mesmo caminho; se chegarmos a consenso nessas consultas, faremos isso em conjunto. Se não, nós vamos nos retirar de qualquer jeito”, disse Holmes Trujillo, em entrevista coletiva em Bogotá.
O chanceler disse que o governo colombiano está em contato com Argentina, Chile e Peru a respeito do tema.
O governo brasileiro, que soube da decisão colombiana pela imprensa e ainda não foi informado oficialmente, não pretende deixar a Unasul no momento. Mas, caso a instituição continue paralisada e outros países sigam o exemplo da Colômbia, o Brasil pode repensar sua decisão, segundo apurou a Folha.
A posição do Brasil é a de que a instituição criada em 2008 é necessária para a integração da América do Sul e deve ser reformada, e que a decisão da Colômbia atropela esse processo de reforma.
“É lastimável, estamos vivendo a desintegração da América do Sul, e uma das causas é o desinteresse do Brasil”, disse à Folha o ex-chanceler Celso Amorim, um dos idealizadores da Unasul.
A organização foi criada pelos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010), Hugo Chávez (Venezuela) e Néstor Kirchner (Argentina) — Kirchner morreria em 2010, e Chávez, em 2013.
O objetivo era aumentar a integração na região e funcionar como órgão regional sem influência dos EUA, um contraponto à Organização dos Estados Americanos (OEA).
“Ao contrário do que dizem, a Unasul não é uma organização que se identifica com o bolivarianismo; a função pacificadora e conciliadora da Unasul na região é essencial, ela foi muito importante para evitar uma guerra entre Colômbia e Venezuela e um conflito na Bolívia”, disse Amorim, citando a crise que levou ao rompimento de relações diplomáticas entre Bogotá e Caracas em 2010, e ao conflito em Pando, na Bolívia, em 2008.
Conforme revelou a Folha, a Unasul está sem secretáriogeral, sem chefe de gabinete e tem apenas dois de cinco diretores. A instituição conta com menos de 25% do necessário para cobrir seu orçamento, corre o risco de perder sua sede em Quito e, desde o início do ano, não fez nenhuma reunião significativa.
Em abril, Brasil, Argentina, Paraguai, Colômbia, Chile e Peru suspenderam sua participação e seus pagamentos à entidade, por causa do bloqueio da Venezuela à nomeação do embaixador argentino José Octávio Bordón para o cargo de secretário-geral.
O governo colombiano vinha criticando o silêncio da Unasul em relação às acusações de violações de direitos humanos na Venezuela e de irregularidades nas eleições de maio no país. Em Bogotá, a organização já era percebida como braço do bolivarianismo por não condenar o regime de Nicolás Maduro antes da posse de Duque.
Mas a saída da Unasul consolida a guinada à direita esperada do novo governo, com vistas a inserir o país em organizações fora da região.
Sob o centrista Juan Manuel Santos, Bogotá já havia aderido à OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico) e se tornado o primeiro sócio global da Otan na América Latina.