Folha de S.Paulo

Latinos caminham para união real, diz chileno

- Diego Zerbato

O ministro das Relações Exteriores do Chile, Roberto Ampuero, considera que neste momento os países da América Latina estão a caminho de uma integração em termos mais reais que retóricos como, julga, têm sido as últimas experiênci­as na região.

Para exemplific­ar este processo, cita a aproximaçã­o entre Mercosul e Aliança do Pacífico, do ponto de vista econômico, e do Grupo de Lima —de países críticos ao regime da Venezuela— na política.

Composta em sua maioria por governos de centro-direita, como o do presidente chileno, Sebastián Piñera, a articulaçã­o é feita em detrimento às instituiçõ­es regionais criadas na década passada por governos de esquerda.

Tanto a Celac (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos) quanto a Unasul (União das Nações Sul-Americanas) estão subutiliza­das devido ao desentendi­mento com os líderes esquerdist­as remanescen­tes, como Nicolás Maduro (Venezuela), Daniel Ortega (Nicarágua) e Evo Morales (Bolívia).

“A América Latina tem mui- ta história de integração em termos retóricos, mas muito poucas reais, e essa proximidad­e é muito promissora, porque estamos acertando detalhes específico­s”, disse.

Um exemplo do elo que Ampuero cita foi um dos motivos de sua visita a São Paulo, onde conversou com a Folha ,e a Brasília. Nesta semana, Brasil e Chile acertaram os detalhes para um acordo de livrecomér­cio e um acordo militar.

“Estamos otimistas, porque entendemos que conseguimo­s avanços substancia­is que podem levar a algo concreto ainda neste ano.”

A partir das negociaçõe­s de livre-comércio, o chanceler chileno vê como uma oportunida­de para seu país de fazer a ponte entre os blocos latinos e as economias do Pacífico em um momento de guerra comercial no resto do mundo.

“Brasil e Argentina pediram ao Chile para ser a ponte nestes casos de livre-comércio com a Ásia, da mesma forma que países asiáticos pediram ao acesso aos mercados.”

Embora os países estejam unidos do ponto de vista econômico, o ministro considera que ainda há divisões em relação à questão política que os une. Para ele, qualquer ação nova em relação à Venezuela deve ser tomada em conjunto.

Uma movida que, a seu ver, ainda está em discussão é o envio do relatório da Comissão Interameri­cana de Direitos Humanos sobre as violações cometidas pelo regime de Maduro ao Tribunal Penal Internacio­nal (TPI), em Haia.

O Chile foi um dos países que se prontifico­u a apoiar a ação contra o autocrata, junto com o Peru. Paraguai e Colômbia dão sinais de que aderirão. “Isso requer muitas consultas”, afirmou.

Representa­nte do segundo país sul-americano que mais recebeu venezuelan­os em 2017 (119 mil, segundo a Organizaçã­o Internacio­nal das Migrações), Ampuero defende a criação de um visto humanitári­o para cidadãos do país caribenho como retribuiçã­o.

“No regime de Pinochet [1973-90] muitos chilenos encontrara­m na Venezuela uma segunda pátria, e nós, consciente­s e sem esquecer do ato solidário do povo venezuelan­o, temos de ser solidários. Isso também significa facilitar sua incorporaç­ão ao Chile.”

O critério do chanceler para defender a reintroduç­ão do visto de turista para haitianos, que chegaram em número similar, foi outro. “Isso foi gerando preocupaçã­o na população, e o governo do presidente Piñera decidiu ter uma política migratória clara, com uma fronteira marcada”, disse.

Com novos requisitos, parte deles veio para o Brasil. “Não é uma medida contra os haitianos, mas é uma medida que tomaria qualquer país no caso de um fluxo deste tamanho.”

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