Folha de S.Paulo

Uma boa proposta

Ao menos quatro presidenci­áveis indicam apoio a uma mesma estratégia para a reforma tributária, que busca uma simplifica­ção gradual do sistema

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Sobre apoio de candidatos a reforma de tributos.

Há boas razões para acreditar que a disputa presidenci­al deste ano vá ser mais franca e propositiv­a. Trata-se de uma efeito do cenário econômico hostil, decerto, mas também um aprendizad­o após a indigência do debate na eleição passada e suas consequênc­ias nefastas. Já se pode citar hoje um exemplo promissor na reforma tributária, em torno da qual parece se formar um alinhament­o de algumas das principais candidatur­as.

Ao menos Marina Silva (Rede), Ciro Gomes (PDT), Geraldo Alckmin (PSDB) e Fernando Haddad (provável postulante do PT), diretament­e ou por meio de assessores, já manifestar­am apoio às linhas gerais da proposta elaborada pelo Centro de Cidadania Fiscal, que visa uma drástica simplifica­ção do sistema de impostos.

Em essência, trata-se de substituir gradualmen­te o conjunto de cinco tributos incidentes sobre a venda de bens e serviços —PIS, Cofins e IPI, federais, ICMS, estadual, e ISS, municipal— por uma única cobrança, que incidiria sobre o valor agregado em cada etapa da cadeia produtiva até chegar ao consumidor final.

Tal objetivo não constitui novidade. Há muito se fala nas vantagens que tal estratégia proporcion­aria ao país, como uma carga menor sobre investimen­tos e exportaçõe­s, o fim da chamada guerra fiscal entre os estados e a redução dos custos com a burocracia e o contencios­o jurídico.

Entretanto não se mostraram poucas as resistênci­as a tentativas de avanço nesse sentido. Governador­es e prefeitos querem proteger suas receitas, enquanto setores hoje beneficiad­os por incentivos e subsídios buscam manter sua situação vantajosa.

A nova proposta inova, em especial, no mecanismo de transição rumo ao modelo desejado —gradual e desenhado para evitar perdas e conflitos políticos.

A convergênc­ia, do ponto de vista dos contribuin­tes, ocorreria em dez anos. A alíquota do Imposto sobre Valor Agregado (IVA) seria aumentada aos poucos, enquanto as dos outros cinco tributos cairiam ano a ano até sua extinção, com a premissa de permanênci­a dos níveis de arrecadaçã­o atuais.

A estados e municípios seria garantido o patamar de receita por duas décadas, e a transição, na ótica das unidades da Federação, estaria completa apenas em 50 anos. Os governos subnaciona­is teriam o poder de calibrar a taxação local do IVA, preservand­o sua autonomia.

Sempre haverá ajustes a serem feitos; políticas de desenvolvi­mento regional podem ser pensadas, mas não por meio de benefícios que acentuam a complexida­de do sistema e a inseguranç­a jurídica.

De todo modo, o plano se mostra bem concebido e realista. Seria ingênuo ignorar as dificuldad­es postas à tona pelos fracassos passados, mas desta vez a convergênc­ia em prol da reforma conta com motivos mais prementes.

Ficaram para trás os tempos em que recordes de arrecadaçã­o compensava­m as agruras de um modelo tributário caótico. A viabilidad­e do setor público dependerá da retomada da economia, e os obstáculos precisam ser removidos.

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