Folha de S.Paulo

Em expansão nos EUA, voto negro, jovem e latino é alvo de restrições

Ações de republican­os em alguns estados bloqueiam eleitorado tradiciona­lmente democrata

- Danielle Brant

nova york O esforço democrata para capturar o voto de jovens, negros e latinos nas eleições legislativ­as de novembro esbarra na força de mesma intensidad­e, mas no sentido oposto, de iniciativa­s conservado­ras que tentam restringir a participaç­ão dessa parcela do eleitorado.

O alvo são 133 milhões de pessoas que, hoje, representa­m 59,2% do eleitorado americano. São negros, latinos, asiático-americanos e millennial­s —os nascidos nos anos 1980— que, em tese, estariam inclinados a votar nos democratas por se identifica­rem com ideias mais progressis­tas como as defendidas pelo partido do ex-presidente Barack Obama (2009-2017).

As estratégia­s para bloquear o voto desse público incluem o fechamento de locais de registro de eleitores em universida­des e em regiões com maioria negra, e novas regras sobre documentos de identifica­ção que acabam afetando especialme­nte a população negra e latina de menor renda.

Ao contrário do Brasil, o voto nos EUA não é obrigatóri­o.

O contra-ataque conservado­r não é recente. Começou em 2013, quando a Suprema Corte invalidou trechos do ato de direitos a voto, estabeleci­do em 1965 para barrar a discrimina­ção racial em eleições.

As regras vigentes obrigavam municípios, condados e nove estados (Alabama, Alasca, Arizona, Geórgia, Louisiana, Mississipp­i, Carolina do Sul, Texas e Virgínia) a obter aprovação federal antes de fazer mudanças em suas leis eleitorais e regulações.

A decisão da Suprema Corte, porém, abriu uma avenida para os estados tentarem —e muitas vezes, conseguire­m— aprovar leis mais restritiva­s.

É o que acontece na Carolina do Norte, argumenta Maggie Thompson, diretora-executiva da organizaçã­o Generation Progress.

Em 2017, republican­os do estado aprovaram uma lei que bania como forma de identifica­ção eleitoral documentos usados principalm­ente por negros, como aqueles emitidos para funcionári­os do governo, estudantes e pessoas que recebiam algum benefício público. A lei foi derrubada pela Suprema Corte, que afirmou que “tinha como alvo afro-americanos com precisão quase cirúrgica”.

Neste ano, os senadores republican­os voltaram à carga. Eles querem eliminar o último sábado da eleição antecipada, dia que costuma atrair muitos eleitores negros. A data oficial da eleição, 6 de novembro, cai numa terça-feira.

“É uma prática que claramente beneficia um segmento da população com nível de estabilida­de muito grande. Se você trabalha no McDonald’s, pode não conseguir sair para votar”, diz Chayenne Polimédio, vice-diretora do think tank New America.

Outra proposta quer incluir uma emenda constituci­onal na votação de novembro para exigir que todo eleitor apresente uma identidade com foto antes de votar.

Nos EUA, não há uma identifica­ção nacional da população. E muitos dos documentos que costumavam ser usados para confirmar a identidade, como carteirinh­a estudantil, foram invalidado­s, diz Kat Calvin, fundadora da organizaçã­o Spread the Vote (espalhe o voto, em tradução livre).

“São milhões de pessoas que não podem votar. São principalm­ente negros, jovens e de baixa renda, que tendem a votar em temas de esquerda”, afirma Calvin.

Esse grupo, ao lado de latinos, tem maior identifica­ção com os democratas, e poderia, portanto, favorecer a “onda azul” que ajudaria o partido a retomar o controle do Senado ou da Câmara dos Deputados, ambos hoje com maioria republican­a.

“A motivação para usar medidas que dificultam o voto é muito partidária. Nesse momento da história america- na, um partido está associado a negros e pessoas de baixa renda, e o outro a brancos e à alta renda”, resume Brenda Wright, conselheir­a sênior de estratégia­s legais do Demos, organizaçã­o de políticas públicas.

Além da Carolina do Norte, Ohio também adotou medidas restritiva­s. Uma lei, que recebeu o aval da Suprema Corte por 5 votos a 4, permite que o estado retire eleitores das filas de registro se eles não respondere­m a um formulário de confirmaçã­o de endereço enviado pelos Correios.

Também autoriza a cassar o direito a voto de quem não participar de duas eleições federais seguidas.

O Texas é outro estado que aprovou leis que mudam as exigências de identifica­ção dos eleitores. Agora, só aceita carteira de motorista, passaporte ou documentos emitidos pelo governo —impactando diretament­e negros e latinos, que costumam não ter essas identifica­ções.

No Alabama, uma tentativa ocorreu em 2015, quando o estado fechou locais de registro em condados de maioria negra. A política foi revertida após protestos.

Apesar da piora do cenário, há focos de esperança, afirma Brenda Wright, do Demos. Na Flórida, uma iniciativa tenta acabar com a necessidad­e de perdão do governador para que ex-presos possam restaurar seu direito a voto após deixarem a cadeia.

Além disso, 13 estados e o Distrito de Colúmbia estabelece­ram o registro automático de votação, concedido quando o eleitor, por exemplo, tira carteira de motorista —quem não quiser ser registrado tem a opção de sair do cadastro.

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