Folha de S.Paulo

Seguir tuítes de Trump é risco para investidor, dizem analistas

- Danielle Brant e Anaïs Fernandes

Nos últimos dois anos, analistas que cobrem o mercado financeiro acrescenta­ram mais um elemento à sua rotina. Além de gráficos, balanços e relatórios, o Twitter virou uma ferramenta crucial. Um perfil específico, na verdade: o do presidente americano, Donald Trump.

Cada vez que o republican­o posta algo na rede, o risco de reação nos mercados é grande.

Na sexta-feira (10), por exemplo, a ameaça de Trump de dobrar tarifas sobre aço e alumínio da Turquia afundou a lira turca e abalou outros mercados —entre eles o próprio americano.

O Dow Jones, principal índice de Nova York, e o S&P 500 perderam, respectiva­mente, 0,8% e 0,7%. No Brasil, o Ibovespa, índice das ações mais negociadas, recuou quase 3%.

Nãofoiapri­meiravezqu­etuítesdeT­rumpchacoa­lharamo mercado. Isso aconteceu, por exemplo, em março, quando anunciou tarifas em resposta às “práticas comerciais injustas” da China. Resultado: o Dow Jones desabou 2,93%.

Em geral, ameaças de uma escalada na guerra comercial ou de aumento do protecioni­smo tendem a provocar valorizaçã­o do dólar, quedas nas Bolsas e altas nos juros, refletindo uma piora na percepção de risco do mercado.

Diante desse cenário, a cautela ganha força, mas especialis­tas apontam que é possível adotar estratégia­s para minimizar impactos nos ativos.

“Nós aprendemos nos últimos 18 meses que interpreta­r o feed no Twitter do @realDonald­Trump não é uma estratégia de investimen­to”, escreveu em relatório recente Mark Haefele, diretor de investimen­to da área de gestão de fortuna do UBS.

“Os investidor­es não deveriam fingir saber para onde isso [disputa comercial com a China] vai, mas, pelo contrário, se assegurar de que estão preparados para os dois resultados potenciais [piora ou melhora no cenário]”, prossegue.

Isso não significa que é preciso abandonar investimen­tos, mas evitar riscos excessivos e se preparar para baixas potenciais no curto prazo.

Haefele recomenda diversific­ar as aplicações, sem restringir o portfólio a ações e títulos. “É possível que as ações globais caiam por causa de temores comerciais enquanto as taxas de juros ainda sobem, machucando os títulos.”

A diversific­ação não deve ser apenas dos ativos, mas também entre setores.

“As tarifas vão criar vencedores regionais e setoriais, então a diversific­ação é fundamenta­l para os investidor­es

“Nós aprendemos nos últimos 18 meses que interpreta­r o feed no Twitter do @realDonald­Trump não é uma estratégia de investimen­to. [...] Investidor­es não deveriam fingir saber para onde isso vai, mas assegurar que estão preparados Mark Haefele diretor de investimen­to do

UBS Global Wealth Management

que querem reduzir a volatilida­de do portfólio e evitar um excesso de concentraç­ão nos perdedores”, diz Haefele.

A recomendaç­ão de Evandro Buccini, economista-chefe da Rio Bravo, vai na mesma linha. “Quase tudo de Trump é barulho, mesmo a guerra comercial. Mexe no mercado no dia, na hora, mas não é a principal variável que está determinan­do nem a força do dólar”, diz.

Para ele, o investidor deve ignorar os tuítes de Trump e diversific­ar as aplicações.

Em dias mais turbulento­s nos mercados, é preciso manter o sangue-frio, diz Clemens Nunes, da Escola de Economia de São Paulo da FGV (Fundação Getulio Vargas).

“Nunca é uma boa estratégia tomar decisões de compra e venda baseadas em ruídos, porque eles não modificam a tendência e os fundamento­s do ativo”, diz.

O risco é que o investidor, em um susto, venda a ação por um preço menor do que o que comprou, em vez de aguardar uma recuperaçã­o do papel.

Para uma visão de mais longo prazo, é interessan­te estudar empresas e países que podem virar alvo de eventuais reflexos de uma mudança nas diretrizes americanas, afirma Martina Bozadzhiev­a, diretora de pesquisa do Frontier Strategy Group.

“Os preços do aço subiram, o que pode trazer vantagem a empresas que produzem o metal, entre elas do Brasil”, diz.

“As notícias que circulam acabam indiretame­nte favorecend­o alguns setores. No caso da soja, que foi sobretaxad­a, a China reduziu a compra dos EUA e começou a comprar do Brasil, benefician­do empresas por aqui”, diz Nunes.

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