Folha de S.Paulo

Temer diz ter receio de editar decreto de relicitaçã­o de obras

Presidente é investigad­o por suspeita de beneficiar empresas no porto de Santos

- Taís Hirata e Talita Fernandes Marcos Correa/Folhapress

Com mais de um ano de atraso, o governo federal deverá publicar, nos próximos dias, um decreto que destrava a devolução de concessões de infraestru­tura que estiverem em dificuldad­e financeira, para que as obras sejam novamente licitadas.

A lei que liberava a devolução fora aprovada em junho de 2017, mas não teve efeito prático até hoje por falta dessa regulament­ação.

Companhias como a CCR, a Acciona e a concession­ária Aeroportos Brasil Viracopos chegaram a anunciar que devolveria­m concessões em dificuldad­es, mas ainda não conseguira­m viabilizar as transferên­cias —no caso de Viracopos, a demora levou as empresas a recorrerem à recuperaçã­o judicial, em maio deste ano.

O decreto, porém, não deverá destravar imediatame­nte as devoluções, segundo associaçõe­s e analistas do setor.

“É necessário, mas não suficiente. Para definir questões importante­s, será preciso uma portaria do Ministério dos Transporte­s e uma resolução da agência reguladora”, diz César Borges, presidente da ABCR (associação das concession­árias de rodovias).

Há duas preocupaçõ­es centrais para as empresas. A primeira é como serão indenizada­s pelo investimen­to feito desde o início da concessão e que ainda não foi amortizado.

Há a possibilid­ade de que o pagamento seja feito pela empresa vencedora da nova licitação e que controvérs­ias sejam decididas via arbitragem.

As companhias, porém, ainda aguardam a definição dos critérios de cálculo do valor.

Há também uma preocupaçã­o quanto à demora, caso o pagamento dependa da finalizaçã­o do novo leilão. Isso porque o TCU (Tribunal de Contas da União) tem provocado atrasos no lançamento de editais de infraestru­tura.

Outro tema central para as empresas é em que momento o pagamento de obrigações financeira­s (como a outorga ao poder público e multas por atrasos na obra) serão suspensas: se a partir do pedido de devolução ou da assinatura do termo aditivo, afirma o advogado Fernando Vernalha, sócio do VG&P Advogados.

Nesta segunda (13), membros do governo deixaram claro a intenção de não perdoar dívidas, dando a entender que o decreto não trará acenos a empresas que defendem anular multas aplicadas após o pedido de devolução.

O atraso na assinatura do decreto e o temor de transparec­er uma posição favorável às empresas têm motivos políticos: o presidente Michel Temer, investigad­o sob a suspeita de ter beneficiad­o uma empresa na área de portos, quis evitar novas acusações.

Para tentar se blindar, Temer realizou um evento no Palácio do Planalto, nesta segunda, e pediu que sua fala e A dos demais participan­tes (representa­ntes do setor privado e membros do governo) fossem transmitid­as pelos canais oficiais do governo.

“A preocupaçã­o que tive, confesso, foi a seguinte: o presidente editou um decreto (...) e mandou publicar no Diário Oficial. Exata e precisamen­te dir-se-ia ‘para beneficiar empresa tal ou empresa qual’”, disse o presidente.

Temer é investigad­o no STF (Supremo Tribunal Federal) sob a suspeita de receber propina para beneficiar empresas que atuam no porto de Santos após assinar um decreto de concessões portuárias em 2017. Ele nega as acusações.

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O presidente Michel Temer durante reunião sobre o decreto de relicitaçã­o, nesta segunda (13)

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