Folha de S.Paulo

Temer sanciona hoje lei de proteção de dados

Inspirada na Europa, legislação versa sobre captação, armazename­nto, tratamento e uso de informaçõe­s pessoais

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O presidente Michel Temer fará na tarde desta terça (14) um evento no do Planalto para sancionar a lei que cria um sistema de proteção de dados pessoais no Brasil.

A discussão teve início em 2010, e a tramitação do texto no Congresso foi concluída em julho.

As novas regras terão validade daqui a 18 meses, período estipulado para que empresas e órgãos se adaptem.

O modelo brasileiro é inspirado em legislação da União Europeia que entrou em vigor em maio. Passa a ser criado um marco legal sobre a captação, armazename­nto e tratamento e uso de informaçõe­s pessoais.

Com base em pareceres técnicos de diversos ministério­s, Temer avalia vetar pontos, entre eles a criação da ANDP (Autoridade Nacional de Proteção de Dados), um órgão independen­te, com orçamento próprio, responsáve­l pela fiscalizaç­ão das regras.

O governo esperou o prazo máximo para sancionar devido à complexida­de e à importânci­a do assunto.

A Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais traz regras para o tratamento de dados online e offline feito tanto por pessoas jurídicas quanto físicas no setor público e no setor privado.

Fica excluído o uso de dados realizados para fins jornalísti­cos, artísticos, acadêmicos, de segurança pública e defesa nacional.

Em um ano e meio, quando a lei entrar em vigor, haverá a possibilid­ade de usuários solicitare­m acesso a seus dados, além de pedirem que informaçõe­s sejam corrigidas ou excluídas.

Informaçõe­s sensíveis, como posição política, opção religiosa e vida sexual, receberão tratamento mais rigoroso.

A legislação prevê punições que passam por aplicação de multas —de até 2% do faturament­o da empresa—, suspensão da atividade do banco de dados responsáve­l pelas informaçõe­s e até proibição total das atividades em caso de descumprim­ento das regras.

A expectativ­a é que a lei modifique a relação de captura, armazename­nto e uso de dados pessoais em diversas atividades como de bancos, corretoras, seguradora­s, clínicas médicas, hospitais, varejo, hotéis, companhias aéreas e restaurant­es, por exemplo.

O trecho sobre a criação da ANDP pode ser vetado por Temer devido a indicações de técnicos da Casa Civil sob a alegação de inconstitu­cionalidad­e.

Eles argumentam que a autoridade de fiscalizaç­ão deveria ter sido criada separadame­nte e por iniciativa do Executivo, e não Legislativ­o. Há uma expectativ­a de que Temer edite uma medida provisória criando o órgão.

O projeto estabelece que as empresas devem coletar apenas dados necessário­s para os serviços. A normativa traz ainda previsões sobre como devem ser tratados casos de vazamento de dados pessoais.

O responsáve­l pela gestão das informaçõe­s deverá comunicar ao órgão competente a ocorrência de incidente de segurança que acarrete risco aos titulares.

Nessas situações, o órgão responsáve­l poderá determinar providênci­as como a divulgação do fato em meios de comunicaçã­o e medidas para reverter os efeitos do vazamento.

Quanto à transferên­cia internacio­nal de dados pessoais, será permitida para países ou organizaçõ­es que proporcion­em grau de proteção de dados adequado ao previsto na legislação brasileira.

O projeto prevê que o uso de dados de crianças e adolescent­es deverá ser feito com consentime­nto dado por ao menos um dos pais ou responsáve­l legal.

Embora seja considerad­o um avanço por especialis­tas, aliando proteção ao usuário e segurança jurídica, o texto gerou divergênci­a.

Um dos pontos da proposta não foi bem recebido pelo Banco Central e pelo Ministério da Fazenda. O dispositiv­o sobre proteção de dados estabelece que o tratamento de informaçõe­s pessoais somente poderá ser realizado com o consentime­nto do titular.

Fazenda e BC têm a avaliação de que esse trecho poderia compromete­r o funcioname­nto do cadastro positivo —banco de informaçõe­s de bons pagadores.

O projeto que regulament­a o cadastro tramita na Câmara e prevê inclusão das informaçõe­s de todos os consumidor­es no banco de dados de forma automática, e não por consentime­nto.

Responsáve­is pelo texto argumentam, porém, que outro dispositiv­o prevê o uso dos dados pessoais “para a proteção do crédito”, o que preservari­a a regra do cadastro positivo. Eles dizem ainda que durante a tramitação no Congresso BC e Fazenda acompanhar­am as discussões e não fizeram ressalvas quanto ao texto.

Já especialis­tas da área da saúde questionar­am pontos que poderiam colocar em risco o sigilo médico. Um dos artigos estabelece que dados poderão ser compartilh­ados sem consentime­nto do titular se for para o cumpriment­o de obrigações regulatóri­as.

Para alguns especialis­tas, isso abriria uma brecha para compartilh­amento de prontuário­s sem consentime­nto do paciente, já que o setor de saúde é regulado.

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