Folha de S.Paulo

Assessores na Globonews

Conversa demonstra conhecimen­to de nossos problemas bem superior a 2014

- Samuel Pessôa Pesquisado­r do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) e sócio da consultori­a Reliance. É doutor em economia pela USP

Há duas semanas, de segunda-feira, 20 de agosto, à sexta, 24, a Globonews recebeu, sempre às 23 horas, assessores econômicos dos cinco candidatos mais bem colocados nas pesquisas, para serem sabatinado­s por vários jornalista­s.

Foi consensual entre os assessores o apoio a uma proposta de criação de um imposto nacional sobre o valor adicionado, IVA, bem como uma recomposiç­ão da carga tributária em uns 2 a 3 pontos percentuai­s do PIB.

Essa recomposiç­ão faria com que a carga, hoje rodando em 31-32% do PIB, voltasse aos máximos de 34% observados no segundo mandato de Lula.

A recomposiç­ão viria do fim de algumas isenções —redução dos limites e da abrangênci­a do Simples e reoneração da folha de salários—, bem como de alguma tributação sobre dividendos na pessoa física (prioritari­amente das empresas que operam no lucro presumido), aumento do imposto sobre herança e, possivelme­nte, de uma nova CPMF. Este último item não é consensual.

Outra unanimidad­e foi a necessidad­e de atacar as injustiças e os privilégio­s das aposentado­rias do setor público.

O tema previdenci­ário é prioritári­o para quatro dos entrevista­dos. Somente Guilherme Mello, assessor de Lula, não considera tema relevante. Adere à tese do moto perpétuo: problema fiscal se resolve aumentando o déficit público para elevar o gasto. A renda cresce com mais intensidad­e e, com ela, a arrecadaçã­o. Desaparece o problema fiscal. Mauro Benevides Filho, asses- sor de Ciro, afirma que cortará gasto, defende o programa de Ciro de renegociaç­ão de créditos de cidadãos negativado­s no SPC e aposta na mudança do regime previdenci­ário de repartição para capitaliza­ção. Este último ponto é tratado também por Paulo Guedes, assessor do candidato Jair Bolsonaro.

Como tratei em minha coluna no domingo passado, nossa baixa poupança se deve à elevada taxa de reposição (valor do benefício previdenci­ário como proporção do salário quando na ativa) e à reduzida idade de concessão do benefício no atual sistema. A reforma defendida por Mauro não trata desses pontos.

Paulo Guedes insistiu nas privatizaç­ões. Alega que é possível arrecadar R$ 1 trilhão com venda de ativos, incluindo ativos imobiliári­os. O valor de mercado da Petrobras, da qual o governo detém não mais do que 50%, é da ordem de R$ 300 bilhões.

Para arrecadar R$1 trilhão, será necessário vender o equivalent­e a quase sete Petrobras e rezar para que o preço não caia com tanta oferta de ativos para o setor privado. “Não, mas os gringos compram”! Então torcer para que o câmbio não vá a R$ 1 com tanto dólar entrando...

Mauro Benevides também considera, pelas suas propostas, que o desastre das políticas intervenci­onistas da Nova Matriz Econômica não represento­u erro de diagnóstic­o, mas sim de implementa­ção. Com Ciro, as mesmas políticas funcionarã­o.

Persio Arida, assessor de Geraldo, insiste que manterá a carga tributária, mas, na entrevista, nota-se que haverá, sim, a recomposiç­ão de que tratei no primeiro parágrafo.

Eduardo Giannetti, assessor de Marina, além de corajosame­nte defender o congelamen­to do salário mínimo real durante uns anos, discute o federalism­o, tema já tratado por Paulo Guedes: “Menos Brasília e mais Brasil”.

Aparenteme­nte, para Eduardo, o tema refere-se a reduzir o gasto com os Poderes Legislativ­os locais que são, de fato, muito elevados no Brasil.

Apesar de um excesso de balas de prata —moto perpétuo, capitaliza­ção, privatizaç­ão, mais Brasil e menos Brasília—, a conversa demonstra um conhecimen­to de nossos problemas bem superior a tudo que falamos em 2014.

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