Esporte está à margem das candidaturas à Presidência
Área é ignorada ou tratada de forma vaga nos programas de governo da maioria dos candidatos ao cargo
A maioria dos candidatos a presidente da República tem propostas vagas para o esporte ou não apresenta iniciativas para a área em suas plataformas de governo.
Levantamento feito pela Rede Esporte pela Mudança e pela Folha encontrou referências ao esporte nos programas de Ciro Gomes (PDT), Luís Inácio Lula da Silva (PT, candidatura barrada pelo Tribunal Superior Eleitoral), Marina Silva (Rede), Guilherme Boulos (PSOL), João Amoêdo (Novo) e José Maria Eymael (DC).
A pedido da Folha, Geraldo Alckmin (PSDB), Alvaro Dias (Podemos) e Vera Lúcia (PSTU) enviaram propostas.
A assessoria de imprensa de Henrique Meirelles (MDB) afirma que o “capítulo sobre esporte ainda está sob construção” no programa de governo do candidato.
Representantes de Jair Bolsonaro (PSL), João Goulart Filho (PPL) e Cabo Daciolo (Patriota) não responderam aos contatos da reportagem.
“Isso é impactante. Os poucos [candidatos] que têm alguma coisa escrita apresentam ideias muito vagas, que não são mensuráveis. São bastante amadoras, diria”, afirma Rodrigo Albuquerque, sócio da Mazars, empresa de auditoria que atua em clubes como Flamengo e Fluminense.
Os textos das plataformas dos candidatos que apresentaram projetos possuem trechos pouco específicos. O de Ciro Gomes, por exemplo, promete o “desenvolvimento de programas de incentivo ao esporte, como iniciativas regionais e o Bolsa Atleta.”
Marina Silva fala em “aumento substancial” dos recursos federais ao esporte, sem dar qualquer número. Mas, ao mesmo tempo, promete a criação de mecanismos (sem especificar quais) para que o esporte de rendimento seja menos dependente do Estado.
Alvaro Dias quer aumentar “significativamente” o número de escolas em tempo integral para oferecer práticas esportivas e “fortalecer” programas de formação de atletas.
“É um mau sinal, mas nem tudo está perdido. Eles [candidatos] terão a oportunidade de expor na campanha suas ideias. A comunidade esportiva está mobilizada para cobrar propostas. Os candidatos dão atenção a quem pede atenção”, afirma Pedro Trengrouse, coordenador acadêmico do curso FGV/FIFA/CIES da Fundação Getúlio Vargas.
Segundo pesquisa Datafolha de 22 de agosto, Lula tinha 39% das intenções de voto, seguido de Bolsonaro (19%), Marina (8%), Alckmin (6%), Ciro (5%), Dias (3%) e Amoêdo (2%). Meirelles, Boulos, Daciolo e Vera tinham 1% cada um. Goulart Filho e Eymael não atingiram 1%.
A principal proposta do PT é a criação de um Sistema Único do Esporte para definir o papel da União, estados e municípios nos investimentos do setor. Mas há também projetos não explicados, como implantar “mecanismos públicos” de controle do futebol e “participação social” na gestão. Não detalha também de que maneira o BNDES atuaria, como propõe, no Programa de Modernização da Gestão do Futebol, que seria criado.
“O que está demonstrado é que a preocupação dos candidatos é com entidades esportivas e o futebol. Não existe uma visão mais ampla do esporte, que é onde o Estado deve se preocupar”, completa Trengrouse, que cita a Islândia como país que usou o esporte para mudar a sociedade.
Alckmin enviou texto que coloca como diretriz “associar o esporte às políticas públicas de educação, em papel estratégico”. Propõe estratégia de longo prazo para o esporte, com metas de resultado, “monitoramento constante e participação social”. Quer instituir programa para detectar talentos nas escolas e estimular o investimento privado em esportes de alto rendimento.
Os planos mais detalhados disponíveis são de Boulos. Ele apresenta 36 projetos para o esporte e quer regulamentar as negociações de atletas para o exterior, interferir na divisão da venda dos direitos de TV dos torneios de futebol e redefinir o destino dos investimentos no esporte feitos com renúncia fiscal, como a Lei do Incentivo do Esporte.
O candidato do PSOL tem as propostas mais polêmicas, como a de auditar as contas de entidades de direito privado, como a CBF, federações estaduais e o COB, e taxar as vendas de jovens jogadores brasileiros para o exterior.
“Algumas propostas do Boulos teriam impacto significativo. Das 36 ideias que ele apresenta, há coisas que devem ser descartadas porque são ilusórias ou vagas. Mas em outra parte, propõe pelo menos uma discussão do que faz sentido ou não”, diz Albuquerque.
Os planos de Amoêdo estão resumidos assim: “novas formas de financiamento de cultura, do esporte e da ciência com fundos patrimoniais de doações”, fiel ao ideal do partido, de manter o Poder Público apenas em papéis clássicos do Estado, como saúde, educação e segurança pública.
Eymael fala em criar programa chamado “Pró-Amador”, de apoio ao “esporte amador competitivo”, promovendo “políticas públicas para integração da criança e do adolescente na prática do esporte”.
Vera Lúcia defende que as políticas esportivas sejam definidas por conselhos populares a serem criados e que o investimento seja voltado para as periferias das cidades.
“Ao contrário do que acontece agora, nos últimos anos o esporte estava no centro das atenções. O Brasil recebeu um grande evento atrás do outro e foi capital mundial do esporte desde o Pan-Americano de 2007. Foram mais de R$ 100 bilhões investidos no esporte. Isso durou até 2016, quando houve a Olimpíada do Rio”, constata Pedro Trengrouse.
A Folha consultou as assessorias dos candidatos durante as duas últimas semanas a respeito das propostas.
Os pedidos foram feitos pelo menos três vezes por telefone, emails e aplicativos de mensagem, no caso de Daciolo. Outros dados foram coletados nas plataformas de governo apresentadas pelos partidos ao Tribunal Superior Eleitoral e nos sites das candidaturas.