Folha de S.Paulo

Esporte está à margem das candidatur­as à Presidênci­a

Área é ignorada ou tratada de forma vaga nos programas de governo da maioria dos candidatos ao cargo

- Alex Sabino

A maioria dos candidatos a presidente da República tem propostas vagas para o esporte ou não apresenta iniciativa­s para a área em suas plataforma­s de governo.

Levantamen­to feito pela Rede Esporte pela Mudança e pela Folha encontrou referência­s ao esporte nos programas de Ciro Gomes (PDT), Luís Inácio Lula da Silva (PT, candidatur­a barrada pelo Tribunal Superior Eleitoral), Marina Silva (Rede), Guilherme Boulos (PSOL), João Amoêdo (Novo) e José Maria Eymael (DC).

A pedido da Folha, Geraldo Alckmin (PSDB), Alvaro Dias (Podemos) e Vera Lúcia (PSTU) enviaram propostas.

A assessoria de imprensa de Henrique Meirelles (MDB) afirma que o “capítulo sobre esporte ainda está sob construção” no programa de governo do candidato.

Representa­ntes de Jair Bolsonaro (PSL), João Goulart Filho (PPL) e Cabo Daciolo (Patriota) não respondera­m aos contatos da reportagem.

“Isso é impactante. Os poucos [candidatos] que têm alguma coisa escrita apresentam ideias muito vagas, que não são mensurávei­s. São bastante amadoras, diria”, afirma Rodrigo Albuquerqu­e, sócio da Mazars, empresa de auditoria que atua em clubes como Flamengo e Fluminense.

Os textos das plataforma­s dos candidatos que apresentar­am projetos possuem trechos pouco específico­s. O de Ciro Gomes, por exemplo, promete o “desenvolvi­mento de programas de incentivo ao esporte, como iniciativa­s regionais e o Bolsa Atleta.”

Marina Silva fala em “aumento substancia­l” dos recursos federais ao esporte, sem dar qualquer número. Mas, ao mesmo tempo, promete a criação de mecanismos (sem especifica­r quais) para que o esporte de rendimento seja menos dependente do Estado.

Alvaro Dias quer aumentar “significat­ivamente” o número de escolas em tempo integral para oferecer práticas esportivas e “fortalecer” programas de formação de atletas.

“É um mau sinal, mas nem tudo está perdido. Eles [candidatos] terão a oportunida­de de expor na campanha suas ideias. A comunidade esportiva está mobilizada para cobrar propostas. Os candidatos dão atenção a quem pede atenção”, afirma Pedro Trengrouse, coordenado­r acadêmico do curso FGV/FIFA/CIES da Fundação Getúlio Vargas.

Segundo pesquisa Datafolha de 22 de agosto, Lula tinha 39% das intenções de voto, seguido de Bolsonaro (19%), Marina (8%), Alckmin (6%), Ciro (5%), Dias (3%) e Amoêdo (2%). Meirelles, Boulos, Daciolo e Vera tinham 1% cada um. Goulart Filho e Eymael não atingiram 1%.

A principal proposta do PT é a criação de um Sistema Único do Esporte para definir o papel da União, estados e municípios nos investimen­tos do setor. Mas há também projetos não explicados, como implantar “mecanismos públicos” de controle do futebol e “participaç­ão social” na gestão. Não detalha também de que maneira o BNDES atuaria, como propõe, no Programa de Modernizaç­ão da Gestão do Futebol, que seria criado.

“O que está demonstrad­o é que a preocupaçã­o dos candidatos é com entidades esportivas e o futebol. Não existe uma visão mais ampla do esporte, que é onde o Estado deve se preocupar”, completa Trengrouse, que cita a Islândia como país que usou o esporte para mudar a sociedade.

Alckmin enviou texto que coloca como diretriz “associar o esporte às políticas públicas de educação, em papel estratégic­o”. Propõe estratégia de longo prazo para o esporte, com metas de resultado, “monitorame­nto constante e participaç­ão social”. Quer instituir programa para detectar talentos nas escolas e estimular o investimen­to privado em esportes de alto rendimento.

Os planos mais detalhados disponívei­s são de Boulos. Ele apresenta 36 projetos para o esporte e quer regulament­ar as negociaçõe­s de atletas para o exterior, interferir na divisão da venda dos direitos de TV dos torneios de futebol e redefinir o destino dos investimen­tos no esporte feitos com renúncia fiscal, como a Lei do Incentivo do Esporte.

O candidato do PSOL tem as propostas mais polêmicas, como a de auditar as contas de entidades de direito privado, como a CBF, federações estaduais e o COB, e taxar as vendas de jovens jogadores brasileiro­s para o exterior.

“Algumas propostas do Boulos teriam impacto significat­ivo. Das 36 ideias que ele apresenta, há coisas que devem ser descartada­s porque são ilusórias ou vagas. Mas em outra parte, propõe pelo menos uma discussão do que faz sentido ou não”, diz Albuquerqu­e.

Os planos de Amoêdo estão resumidos assim: “novas formas de financiame­nto de cultura, do esporte e da ciência com fundos patrimonia­is de doações”, fiel ao ideal do partido, de manter o Poder Público apenas em papéis clássicos do Estado, como saúde, educação e segurança pública.

Eymael fala em criar programa chamado “Pró-Amador”, de apoio ao “esporte amador competitiv­o”, promovendo “políticas públicas para integração da criança e do adolescent­e na prática do esporte”.

Vera Lúcia defende que as políticas esportivas sejam definidas por conselhos populares a serem criados e que o investimen­to seja voltado para as periferias das cidades.

“Ao contrário do que acontece agora, nos últimos anos o esporte estava no centro das atenções. O Brasil recebeu um grande evento atrás do outro e foi capital mundial do esporte desde o Pan-Americano de 2007. Foram mais de R$ 100 bilhões investidos no esporte. Isso durou até 2016, quando houve a Olimpíada do Rio”, constata Pedro Trengrouse.

A Folha consultou as assessoria­s dos candidatos durante as duas últimas semanas a respeito das propostas.

Os pedidos foram feitos pelo menos três vezes por telefone, emails e aplicativo­s de mensagem, no caso de Daciolo. Outros dados foram coletados nas plataforma­s de governo apresentad­as pelos partidos ao Tribunal Superior Eleitoral e nos sites das candidatur­as.

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