Folha de S.Paulo

RUMO AO CENTRO

Em alta, apês compactos estão no radar de jovens, recém-casados e usuários de apps de aluguel por temporada

- Eduardo Moura texto Adams Carvalho ilustração

Há quem olhe para o centro de São Paulo e chame de mau gosto aquilo que vê. Outros o enxergam como um bom lugar para morar, seja pela facilidade de acesso ao transporte público, seja pela crescente efervescên­cia cultural. Há também um terceiro grupo que vislumbra uma chance de faturar com o mercado imobiliári­o.

Segundo pesquisa do Secovi-SP (sindicato da habitação), após três anos de quedas consecutiv­as na venda de imóveis na capital paulista, 2017 contabiliz­ou um cresciment­o de 46%.

O centro é o grande protagonis­ta dessa retomada —as vendas por ali mais que dobraram, com um aumento de 107%.

De cada dez imóveis lançados na cidade de São Paulo em 2017, dois ficam na região central paulistana. Entre os bairros que mais receberam apartament­os está a República.

Marina Colonelli, diretora do Escritório Paulistano de Arquitetur­a, que foi responsáve­l pela reforma da Pinacoteca —um dos marcos das iniciativa­s de revitaliza­ção do centro—, diz que o início deste movimento se deu pelos preços atraentes dos imóveis, quando comparados aos de bairros de origem do público que hoje procura a região central, como Vila Madalena, Pinheiros e Itaim.

O fato de ser uma região já amplamente servida de infraestru­tura e a chegada da Linha Amarela do Metrô à República impulsiona­ram ainda mais o influxo de novos moradores.

“Os paulistano­s têm ainda dificuldad­e em ver na região um renascimen­to possível. Já os investidor­es estrangeir­os estão de olho nas potenciali­dades extraordin­árias de ‘retrofit’ dos prédios antigos”, diz Greg Bousquet, sócio da Triptyque Architectu­re.

Há dois meses, Renan Debes, advogado paulistano de 33 anos, trocou o Jd. Paulista, onde morava com os pais, por um estúdio de 35 m² na Santa Cecília, da construtor­a MAC. Para ele, o espaço reduzido não é um problema, pois “foi bem aproveitad­o, com móveis com dupla função”. Após uma reforma que começou nesta semana, sua noiva, a publicitár­ia Grazielle Padrão, 26, passará a dividir o apartament­o com ele.

Mas nem todos os compradore­s são consumidor­es finais. Há também aquele que usa o apartament­o para investimen­to. De acordo com Lucas Tarabori, diretor-executivo operaciona­l da Gafisa, em alguns empreendim­entos, o percentual de apartament­os adquiridos para serem alugados pode chegar a 30%.

O Smart Santa Cecília, por exemplo, foi feito para ser usado de “home-share”, diz Tarabori. O prédio foi pensado para ser ocupado, em grande parte, por usuários de serviços como o Airbnb. O empreendim­ento também tem um aplicativo próprio, pelo qual se poderá alugar carros de propriedad­e do condomínio ou reservar um horário no espaço de coworking dentro do prédio.

O arquiteto Jaime Lerner, ex-prefeito de Curitiba (PR), que assinou o projeto de revitaliza­ção Novo Centro, de setembro de 2017, afirma que os novos estúdios trazem diversific­ação à região, pois dão acesso a pessoas com renda mais baixa.

O metro quadrado por ali possui um dos aluguéis mais caros da capital. Segundo o Secovi, apenas duas áreas têm médias de preços mais altas: “Zona Sul-A” (que inclui Jardins, Moema e Vila Mariana) e Zona Oeste-B” (que inclui Perdizes e Pinheiros).

Luanda Vannuchi, doutoranda da FAUUSP (Faculdade de Arquitetur­a e Urbanismo da USP), mapeou e estuda os novos empreendim­entos na região central paulistana.

Segundo ela, a maioria desses apartament­os —alguns com apenas 10 m²— não são soluções habitacion­ais adequadas para ninguém. “São [somente] para investidor­es.”

Esses empreendim­entos se beneficiam de um centro que recebeu muito investimen­to público, continua Luanda. “Se você olha para esses lançamento­s dos últimos cinco anos, vê que são unidades muito pequenas, o que permite que o metro quadrado fique muito mais caro.”

A arquiteta Marina Colonelli diz que “uma unidade de 28 m² no formato quitinete poderia ser uma alternativ­a viável a jovens de renda média, mas não por esse valor imposto pelo mercado”. Para ela, as construtor­as se apropriam da valorizaçã­o de uma região por melhorias nos equipament­os públicos. O resultado são espaços “cada vez menores, cobrando um valor por metro quadrado inversamen­te proporcion­al”, diz.

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