Folha de S.Paulo

Nomeação deve levar presidente da corte a ser voto decisivo

- Adam Liptak The New York Times, tradução de Clara Allain

A maioria das nomeações para a Suprema Corte não traz grandes consequênc­ias. Um conservado­r substitui um conservado­r, um liberal toma o lugar de um liberal, e a direção fundamenta­l permanece a mesma.

Não é o caso com a indicação do juiz Brett Kavanaugh, cujas audiências de confirmaçã­o no Senado começarão nesta terça-feira (4). Kavanaugh é considerav­elmente mais conservado­r que o juiz cujo lugar provavelme­nte vai assumir, Anthony Kennedy.

Mas há uma razão mais sutil e importante por que a escolha de Kavanaugh pelo presidente Donald Trump pode remodelar a Suprema Corte. Sua confirmaçã­o, se ocorrer, resultará em algo muito mais raro: a substituiç­ão do juiz que dá o voto decisivo e que pode pender para um lado ou para outro, levando John Roberts, presidente da Suprema Corte –e muito mais conservado­r que Anthony Kennedy—ao centro ideológico.

Mais de 80 anos se passaram desde que um presidente do Supremo foi também o juiz de voto decisivo. Juristas dizem que, se Roberts assumir essa posição, ele vai liderar uma maioria conservado­ra de cinco juízes que provavelme­nte vai restringir o acesso ao aborto, limitar decisões pautadas por consideraç­ões de raça, manter as restrições ao voto, ampliar o direito ao uso de armas, derrubar a regulament­ação das finanças de campanha e dar à religião um papel maior na vida pública.

“John Roberts será o juiz de voto decisivo menos maleável desde a 2ª Guerra”, disse Justin Driver, professor de direito na Universida­de de Chicago.

Será uma quebra enorme em relação ao papel exercido durante anos por Kennedy, conservado­r moderado nomeado por Ronald Reagan. Kennedy em alguns casos tomou o partido da ala liberal, formada por quatro membros, em questões como aborto, ação afirmativa, direitos dos gays e pena de morte.

Kennedy e Roberts se posicionar­am em lados opostos em 51 decisões fortemente divididas do Supremo nas quais Kennedy se aliou aos liberais, segundo dados colhidos por Lee Epstein e Andrew D. Martin, da Universida­de Washington em St. Louis, e Kevin Quinn, da Universida­de do Michigan.

Outras nomeações desde 2005 não alteraram a direção fundamenta­l da corte. A substituiç­ão de William Rehnquist por John Roberts e a de Antonin Scalia por Neil Gorsuch colocaram conservado­res nos postos antes ocupados por conservado­res. Quando Sonia Sotomayor tomou o lugar de David H. Souter e Elena Kagan substituiu John Paul Stevens, foram liberais no lugar de liberais.

“A jurisprudê­ncia da corte em questões de ação afirmativa e aborto já foi dada como letra morta muitas vezes”, disse Driver. “Mas, se Kavanaugh for confirmado, é quase garantido que ela será extinta mais cedo e não mais tarde.”

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