ONG pede plano regional para venezuelanos
Falta de política única cria obstáculos a refugiados e países receptores, diz Human Rights Watch a dias de reunião
Em relatório divulgado nesta segunda (3), a dois dias da reunião de urgência da Organização dos Estados Americanos, a ONG Human Rights Watch insta os países da região a adotarem um regime comum de proteção temporária aos venezuelanos.
Com essa proteção regional, os venezuelanos teriam autorização de trabalho e suspensão da deportação enquanto pedidos de refúgio são analisados, defende a HRW.
Um mecanismo semelhante é adotado nos EUA para facilitar a permanência de cidadãos de determinados países afetados por desastres humanitários ou conflitos armados, como Haiti e Nicarágua, durante certos períodos.
Diante de medidas mais restritivas adotadas nas últimas semanas por países da região, como a exigência de passaportes para conseguir permissão de residência em Chile, Peru e Equador, e de reações xenofóbicas como as ocorridas em Pacaraima, Roraima, a organização diz ser essencial uma resposta padronizada.
“A migração venezuelana não vai parar tão cedo e, até agora, todas as respostas dos governos da região foram ad hoc [específicas para cada caso]”, diz a autora do relatório, Tamara Taraciuk Broner.
A OEA (Organização dos Estados Americanos), que reúne todos os países das Américas, marcou para esta quarta (5) uma reunião de urgência para debater a crise migratória venezuelana, em Washington.
A convocação levou o governo equatoriano a antecipar para esta segunda (3) uma reunião que teria nos dias 17 e 18 para debater maneiras de regularizar os migrantes venezuelanos e obter fundos externos para lidar com o êxodo e seus impactos.
A Venezuela não mandou representante à reunião. No fim da semana passada, o ditador Nicolás Maduro, diante da saída de 2,3 milhões de venezuelanos do país em quatro anos, instou os emigrados a deixarem de “limpar privadas” no exterior e voltarem. Na segunda-feira, a vice-presidente Delcy Rodriguez afirmou que os fluxos migratórios são “normais” e que estavam sendo exagerados por outros países para justificar uma intervenção militar.
No Brasil, entraram cerca de 127 mil venezuelanos desde o fim de 2015, sendo que cerca de 60% já saíram. A HRW estima que 58 mil venezuelanos ainda estejam no país, sendo que 32,7 mil entraram com pedido de refúgio e 25,3 mil têm autorização de residência por dois anos.
Segundo a organização, a Colômbia recebeu cerca de 1 milhão de venezuelanos; o Peru, 395 mil; o Equador, 250 mil; o Chile, 84,4 mil; a Argentina, 78 mil; os EUA, 72,7 mil.
Como os migrantes seguem o périplo de um país a outro, o saldo final é difícil de precisar.
Nesta segunda-feira (3), o presidente colombiano, Iván Duque, afirmou que uma intervenção militar estrangeira na Venezuela liderada pelos Estados Unidos “não é o caminho” para resolver a crise.
O Brasil adota a lei do refúgio e o Estatuto do Refugiado de 1951, que caracterizam desta forma aqueles que sofrem perseguição por causa de sua raça, religião, afiliação política e outros. Já a autorização de residência se aplica a cidadãos de países fronteiriços e vale por dois anos, com renovação por mais dois. Mas exige um número maior de documentos, que muitos venezuelanos não têm, e não impede que eles sejam deportados.
A HRW e o Acnur, órgão da ONU para os refugiados, defendem que o Brasil leve em conta também a Declaração de Cartagena de 1984, que adota uma definição mais ampla de refugiado e prevê proteção a pessoas que estejam fugindo de “violação maciça dos direitos humanos ou outras circunstâncias que tenham perturbado gravemente a ordem pública”, o que se aplica à Venezuela, onde há hiperinflação e escassez de alimentos, remédios e serviços públicos, e violência.
Não existe consenso dentro do Conare, órgão que analisa os pedidos de refúgio no Brasil e é composto por vários ministérios, sobre facilitar a concessão de status de refugiados para venezuelanos. Para alguns, há a percepção que isso geraria uma avalanche de entradas de venezuelanos.
Segundo o estudo da HRW, a exigência de passaporte estudada por Chile, Peru e Equador inviabilizaria a entrada dos venezuelanos nos países, já que obter o documento leva até dois anos.