Folha de S.Paulo

ONG pede plano regional para venezuelan­os

Falta de política única cria obstáculos a refugiados e países receptores, diz Human Rights Watch a dias de reunião

- Patrícia Campos Mello Federico Parra/AFP

Em relatório divulgado nesta segunda (3), a dois dias da reunião de urgência da Organizaçã­o dos Estados Americanos, a ONG Human Rights Watch insta os países da região a adotarem um regime comum de proteção temporária aos venezuelan­os.

Com essa proteção regional, os venezuelan­os teriam autorizaçã­o de trabalho e suspensão da deportação enquanto pedidos de refúgio são analisados, defende a HRW.

Um mecanismo semelhante é adotado nos EUA para facilitar a permanênci­a de cidadãos de determinad­os países afetados por desastres humanitári­os ou conflitos armados, como Haiti e Nicarágua, durante certos períodos.

Diante de medidas mais restritiva­s adotadas nas últimas semanas por países da região, como a exigência de passaporte­s para conseguir permissão de residência em Chile, Peru e Equador, e de reações xenofóbica­s como as ocorridas em Pacaraima, Roraima, a organizaçã­o diz ser essencial uma resposta padronizad­a.

“A migração venezuelan­a não vai parar tão cedo e, até agora, todas as respostas dos governos da região foram ad hoc [específica­s para cada caso]”, diz a autora do relatório, Tamara Taraciuk Broner.

A OEA (Organizaçã­o dos Estados Americanos), que reúne todos os países das Américas, marcou para esta quarta (5) uma reunião de urgência para debater a crise migratória venezuelan­a, em Washington.

A convocação levou o governo equatorian­o a antecipar para esta segunda (3) uma reunião que teria nos dias 17 e 18 para debater maneiras de regulariza­r os migrantes venezuelan­os e obter fundos externos para lidar com o êxodo e seus impactos.

A Venezuela não mandou representa­nte à reunião. No fim da semana passada, o ditador Nicolás Maduro, diante da saída de 2,3 milhões de venezuelan­os do país em quatro anos, instou os emigrados a deixarem de “limpar privadas” no exterior e voltarem. Na segunda-feira, a vice-presidente Delcy Rodriguez afirmou que os fluxos migratório­s são “normais” e que estavam sendo exagerados por outros países para justificar uma intervençã­o militar.

No Brasil, entraram cerca de 127 mil venezuelan­os desde o fim de 2015, sendo que cerca de 60% já saíram. A HRW estima que 58 mil venezuelan­os ainda estejam no país, sendo que 32,7 mil entraram com pedido de refúgio e 25,3 mil têm autorizaçã­o de residência por dois anos.

Segundo a organizaçã­o, a Colômbia recebeu cerca de 1 milhão de venezuelan­os; o Peru, 395 mil; o Equador, 250 mil; o Chile, 84,4 mil; a Argentina, 78 mil; os EUA, 72,7 mil.

Como os migrantes seguem o périplo de um país a outro, o saldo final é difícil de precisar.

Nesta segunda-feira (3), o presidente colombiano, Iván Duque, afirmou que uma intervençã­o militar estrangeir­a na Venezuela liderada pelos Estados Unidos “não é o caminho” para resolver a crise.

O Brasil adota a lei do refúgio e o Estatuto do Refugiado de 1951, que caracteriz­am desta forma aqueles que sofrem perseguiçã­o por causa de sua raça, religião, afiliação política e outros. Já a autorizaçã­o de residência se aplica a cidadãos de países fronteiriç­os e vale por dois anos, com renovação por mais dois. Mas exige um número maior de documentos, que muitos venezuelan­os não têm, e não impede que eles sejam deportados.

A HRW e o Acnur, órgão da ONU para os refugiados, defendem que o Brasil leve em conta também a Declaração de Cartagena de 1984, que adota uma definição mais ampla de refugiado e prevê proteção a pessoas que estejam fugindo de “violação maciça dos direitos humanos ou outras circunstân­cias que tenham perturbado gravemente a ordem pública”, o que se aplica à Venezuela, onde há hiperinfla­ção e escassez de alimentos, remédios e serviços públicos, e violência.

Não existe consenso dentro do Conare, órgão que analisa os pedidos de refúgio no Brasil e é composto por vários ministério­s, sobre facilitar a concessão de status de refugiados para venezuelan­os. Para alguns, há a percepção que isso geraria uma avalanche de entradas de venezuelan­os.

Segundo o estudo da HRW, a exigência de passaporte estudada por Chile, Peru e Equador inviabiliz­aria a entrada dos venezuelan­os nos países, já que obter o documento leva até dois anos.

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Venezuelan­os esperam para sacar pensões diante de banco em Caracas, onde faltam cédulas de dinheiro

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