Folha de S.Paulo

Queda nos serviços e no varejo sinaliza risco de estagnação

Desempenho dos setores em julho frustra expectativ­as de analistas, que projetaram recuperaçã­o

- Anaïs Fernandes e Arthur Cagliari Pilar Olivares - 4.set.18/Reuters

Os números dos setores de serviço e comércio em julho, divulgados nesta semana, frustraram a expectativ­a dos economista­s, que projetaram alta para ambos.

Consideran­do o desempenho da indústria, que também não se recupera, o sinal é que há risco de estagnação da economia no restante do ano.

O volume de serviços caiu 2,2% em julho na comparação com o mês anterior, informou nesta sexta-feira (14) o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatístic­a). Pesquisa da agência Reuters com analistas de mercado estimava alta de 0,4%.

O comércio, por sua vez, registrou o terceiro mês seguido de queda ao perder 0,5% em julho, também de acordo com pesquisa do IBGE divulgada na quinta (13). A projeção da Reuters era de alta de 0,3%.

A expectativ­a com os números de julho era grande porque este seria o primeiro mês de normalidad­e após os efeitos mais imediatos da paralisaçã­o de caminhonei­ros.

Rodrigo Lobo, gerente de pesquisa do IBGE, observa que, se retiradas as oscilações de maio e junho no volume de serviços —que apresentar­am, respectiva­mente, queda de 3,4% seguida de alta de 4,8%— o setor continua 1% abaixo dos resultados de abril.

“Ainda que no acumulado do ano a retração não seja tão grande [-0,8%], a desacelera­ção se prolonga”, diz.

Para este ano, a expectativ­a, segundo Lobo, é que o setor fique próximo da estabilida­de, mas ele observa que a crise pode estar se aprofundan­do.

“No acumulado de 2015 a 2017, tivemos uma variação negativa de 11%. Mesmo que em 2018 a retração seja de menor magnitude, quando um setor cai em um momento em que já há queda, a tendência é que o ambiente fique desfavoráv­el para recuperaçã­o”, afirma.

Quatro das cinco atividades de serviço pesquisada­s pelo instituto caíram em julho. A exceção foi o serviço prestado às famílias, que avançou 3,1%.

“Não é um aumento desprezíve­l, mas é muito pontual e ligado à queda de preços. As notícias boas para o setor param por aí”, diz Fabio Bentes, economista da CNC (Confederaç­ão Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo).

Apenas o grupo de serviços de transporte­s recuou 4% em julho, a maior queda mensal entre as categorias.

“Esse recuou é preocupant­e, porque o transporte é um termômetro importante da atividade econômica”, diz Bentes.

Segundo o economista, o índice que mede o volume de serviços está cerca de 11% abaixo do registrado em janeiro de 2015, primeiro ano completo do país em recessão.

“Nos serviços, a recuperaçã­o não só vai ser lenta como nem sequer começou”, avalia.

O cenário político incerto turva previsões para o segunram do semestre, mas o entendimen­to geral é que as engrenagen­s da economia devem continuar em ritmo lento até que um novo presidente seja eleito.

A queda de 1% no varejo na comparação entre julho de 2017 e o mesmo mês de 2018 interrompe uma sequência de 15 taxas positivas.

Para Isabela Tavares, especialis­ta em comércio da consultori­a Tendências, isso reflete as incertezas deste ano.

“É um sinal de desacelera­ção, por causa tanto da paralisaçã­o quanto das eleições, ambas afetando a confiança do consumidor. Nesse ambiente, as pessoas interrompe- e postergara­m as intenções de consumo, mantendo só o essencial”, afirma.

No comércio, o cenário afeta sobretudo os segmentos que dependem da concessão de crédito.

Embora a inflação brasileira permaneça em níveis baixos(oIPCAdeago­stotevedef­lação de 0,09%), o que alivia o poder de compra das pessoas, o desemprego alto (taxa de 12,3% no trimestre encerrado em julho) retira a confiança do consumidor em tomar crédito.

Não à toa, em julho, o destaque negativo do varejo foram móveis e eletrodomé­sticos, cujas vendas caíram 4,8%.

Em serviços, a conjuntura política impacta investimen­tos, fator relevante em um setor em que parte significat­iva das negociaçõe­s ocorre entre as próprias empresas.

“No caso de serviços, além da questão das famílias, o desempenho fraco da indústria em julho, que demanda menos serviços, ajuda a explicar a queda”, diz Sarah Bretones, economista da MCM Consultore­s.

Segundo o IBGE, a produção industrial recuou 0,2% em julho.

“A formação bruta de capital fixo [medida para os investimen­tos] está entre 15% e 16% da economia. Não tem como o país crescer de forma sustentáve­l com um nível tão distante de ao menos 25%”, diz Bentes.

Segundo Bretones, as condições financeira­s do país têm atrapalhad­o a recuperaçã­o da atividade econômica. “Há um risco de estagnação no restante deste ano”, afirma.

Embora o resultado do varejo em julho tenha surpreendi­do negativame­nte, a projeção para os próximos meses é que ocorra um cresciment­o gradual, afirma Tavares.

“A liberação do pagamento do PIS/Pasep nos meses de agosto e setembro, embora bem mais baixo que o do FGTS, deve impactar o consumo de alguma forma. Até o fim do ano, esperamos um cresciment­o moderado.”

 ??  ?? Anúncios de liquidação; com instabilid­ade, famílias postergam compras
Anúncios de liquidação; com instabilid­ade, famílias postergam compras
 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil