Folha de S.Paulo

Franca decadência

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Acerca de impactos da recessão econômica na ZFM.

São incontávei­s os programas de governo que, a princípio meritórios, acabam por se perpetuar devido a pressões de grupos de interesse, sem adequada avaliação de resultados e custos para o contribuin­te. Nesse grupo, a Zona Franca de Manaus merece atenção extra por sua relevância nas dimensões econômica, social e ambiental.

Estabeleci­da em 1967, com propósito declarado de promover o desenvolvi­mento na região amazônica e a ocupação do território, a ZFM é uma área de livre comércio que goza de incentivos tributário­s para a instalação de negócios, como compensaçã­o pela distância dos centros consumidor­es do país.

Sua vigência foi reafirmada pela Constituiç­ão de 1988 e tem sido prorrogada sucessivam­ente. A última extensão, há quatro anos, fixa o longínquo 2073 como prazo final.

O custo para os cofres públicos, na forma de renúncia tributária, chegará a R$ 24 bilhões em 2018, quantia não muito diferente da que o governo espera destinar ao Bolsa Família (R$ 28 bilhões).

Os mais de 50 anos de existência —e os 55 que ainda estão por vir— tornam imperativo um exame rigoroso de prós e contras da ZFM.

No âmbito econômico, é no mínimo duvidoso que os objetivos de uma área de livre comércio tenham sido atingidos. Ao contrário de zonas especiais em outros lugares do mundo, a de Manaus não constitui um polo de exportaçõe­s e competitiv­idade, tendo se convertido em centro produtor para o mercado nacional em razão de impostos reduzidos.

Sem um esforço de integração com as demais regiões do país, o que pressupõe melhoria dramática da infraestru­tura e da logística, será difícil que a ZFM escape da obsolescên­cia, hoje agravada pelo impacto da crise econômica.

Conforme reportagem desta Folha, as fábricas ali instaladas fecharam, desde 2012, cerca de 43 mil postos de trabalho —1 de cada 3 existentes. A taxa de desemprego chega a 17,2%, contra média nacional de 12,4%. A despeito da Zona Franca, Manaus tem o terceiro pior serviço de esgoto entre as capitais.

Mesmo no quesito ambiental, não se mostra evidente o alegado papel de preservaçã­o da ZFM. Ainda que isso possa ocorrer nos arredores da capital, são nebulosos os efeitos no restante do território.

Há meios mais inteligent­es para a promoção do desenvolvi­mento regional, mesmo que demandem verbas do Tesouro Nacional —a serem definidas com transparên­cia no Orçamento. Não se trata, pois, de retirar recursos da Amazônia, mas de cuidar melhor desse grande patrimônio e de sua população.

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