Folha de S.Paulo

O governo se meter é um tiro no pé

- Leandro Narloch Jornalista, autor de “Guia Politicame­nte Incorreto da História do Brasil”. É mestre em filosofia pela Universida­de de Londres.

Pouca gente sabe, mas os deputados já aprovaram, em 2011, uma lei de equiparaçã­o salarial. Dilma Rousseff planejava aprovar o projeto no Senado e sancioná-lo no 8 do março de 2012, mas desistiu. Temia-se que a lei resultasse “na redução de vagas para mulheres no mercado de trabalho”, segundo O Estado de S. Paulo.

Eis uma rara atitude sensata do governo Dilma. O projeto não distinguia funcionári­os com mais experiênci­a ou tempo de serviço, por isso aumentaria a confusão jurídica e o medo de se contratar mulheres. Está até hoje parado no Senado. O governo não deve combater diferenças salariais porque essa atitude, como boa parte das políticas públicas, seria um remédio que piora a doença. Mas será que os indivíduos e grupos organizado­s deveriam entrar nesse combate?

Depende da estatístic­a e da causa. O número do IBGE, segundo o qual as mulheres ganham 22,5% menos, não trata de salários no mesmo cargo: é uma média da remuneraçã­o de todos os homens e mulheres do país, sem considerar carga horária, profissão, idade e experiênci­a.

Para igualar esse número, seria preciso proibir algumas escolhas femininas. Claudia Goldin, economista de Harvard, explica que quando as mulheres entraram no mercado de trabalho aumentaram a oferta de mão de obra em áreas que costumam preferir, como educação. Por oferta e procura, o salário dessas áreas baixou. E, por mais que feministas reclamem, pesquisas mostram que as mulheres simplesmen­te não se importam tanto quanto os homens em chegar ao topo da carreira. Preferem cargos menos tensos e com mais tempo livre. Deveríamos proibir essas preferênci­as em nome da estatístic­a?

Economista­s desconfiam da desigualda­de salarial para o mesmo cargo porque, se as mulheres ganhassem 22,5% menos para o mesmo trabalho, as empresas só contratari­am mulheres.

Ainda assim, quando se iguala a idade, formação, experiênci­a, as mulheres continuam ganhando entre 5% a 7% menos.

Parte dessa diferença residual certamente se explica pelo machismo, e talvez por uma tendência feminina em ter mais medo de pedir aumento. Nesses dois casos, sim, ações de grupos feministas poderiam ajudar a alertar empresas contra preconceit­os, e mulheres quanto a tendências evolutivas de comportame­nto.

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