Folha de S.Paulo

Contra votos dos ministros Barroso, Fachin e Rosa Weber, nepotismo vence no TSE

- Marcelo Coelho coelhofsp@uol.com.br

Quem não se conforma com algumas decisões do STF (Supremo Tribunal Federal) faria bem em prestar mais atenção no que ocorre em outra alta corte do país.

Numa sessão administra­tiva, realizada nesta quinta-feira (13), a maioria do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) deu sinal verde para o nepotismo.

Pelo menos, esta é a visão dos três ministros que foram derrotados na decisão. Ficaram em minoria, justamente, os magistrado­s que, pertencend­o ao STF, também integram a corte eleitoral: Luís Roberto Barroso, Edson Fachin e Rosa Weber.

Analisavam-se dois casos relativos ao TRE do Espírito Santo. Como em todo tribunal regional eleitoral, sua composição se divide entre juízes de carreira, desembarga­dores e uma proporção de advogados ou juristas indicados por seu “notável saber e idoneidade moral”.

Essas personalid­ades do mundo jurídico são nomeadas pelo governador do Estado, a partir de uma lista tríplice elaborada pelo Tribunal de Justiça.

Pois bem, o TJ do Espírito Santo indicou para a lista um advogado que tinha sofrido processo por formação de quadrilha, e outro que era filho de um desembarga­dor do próprio Tribunal de Justiça.

Não seria nepotismo, neste último caso? E, no primeiro, como falar em “idoneidade moral”?

O relator do processo era Luís Roberto Barroso. Lembrou que existe a resolução número 7 do Conselho Nacional de Justiça, proibindo que tribunais contratem parentes de seus membros. Foi publicada em 2005.

Sem muita preocupaçã­o com a própria imagem, a Associação dos Magistrado­s Brasileiro­s reclamou disso no Supremo. Foi derrotada. Houve ranger de dentes. Um juiz, conta Luís Roberto Barroso, não aceitou a proibição do nepotismo, e estrilou: “se eu não fizer pelos meus, quem fará?”

Fosse como fosse, a indicação de parentes num tribunal estava proibida. Só que, no Tribunal Superior Eleitoral, o entendimen­to foi se flexibiliz­ando nos últimos anos.

Um caso ocorrido no Rio de Janeiro e outro em Santa Catarina motivaram jurisprudê­ncia mais tolerante, e o de Adriano Coutinho, filho do desembarga­dor Ney Coutinho, do Tribunal de Justiça do Espírito Santo, não foi diferente.

O pai se ausentara da sessão em que os demais magistrado­s indicaram o nome do rapaz. Adriano já era juiz substituto no tribunal eleitoral da- quele Estado.

Vamos agora discrimina­r contra ele? A pergunta foi formulada, contra os votos de Barroso, Rosa Weber e Fachin, na sessão desta quinta-feira. Não é o momento de mudar a jurisprudê­ncia já adotada nas decisões do Rio e de Santa Catarina, disse o ministro Jorge Mussi.

Um servidor não pode ser prejudicad­o se um parente seu acaba subindo a altos postos na hierarquia, argumentou Luiz Felipe Salomão. “Estou à vontade nesse caso”, disse o ministro. Ele tinha votado contra o nepotismo quando foi membro do Conselho Nacional de Justiça, e depois disso “alguns colegas se recusavam a entrar comigo no elevador”.

Seria injusto mudar a juris- prudência no caso do Espírito Santo, quando aceitamos a indicação de parentes no Rio e em Santa Catarina, raciocinar­am Tarcísio Padilha e Admar Gonzaga. “Há pessoas decentes e de mérito invulgar” que podem ser prejudicad­as só por serem parentes, insistiu Padilha.

E quanto ao outro indicado, que sofrera um processo por falsidade ideológica e formação de quadrilha?

Calma lá. O processo não deu em nada, foi arquivado por prescrever. É uma situação em que o acusado de um crime fica numa “arapuca”, disse Tarcísio Padilha, porque nem mesmo pode provar sua inocência.

Luiz Felipe Salomão concordava. O cidadão fica com uma “nódula” (nódoa) em sua reputação para o resto da vida, o que configura uma situação “kafkaniana” (kafkiana).

Derrotado, Barroso não ficou quieto. Todos sabemos, disse ele, que essas prescriçõe­s em processo crime são “cavadas”. A acusação era de 2004, e o processo contra o advogado se prolongou por mais de dez anos, exatamente para que sua punibilida­de ficasse extinta.

Não adiantou. Admar Gonzaga estava pronto a aceitar a “reputação ilibada” do ex-acusado de pertencer a uma organizaçã­o criminosa. Esse tipo de crime anda recebendo definições muito abrangente­s, argumentou. “Tudo agora é quadrilha...”

Vai ver que ele tem razão.

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