Folha de S.Paulo

Crocodilo de 85 milhões de anos é batizado de ‘caipira mineiro’

- Fotos Neto Talmeli/Folhapress Rodolfo Nogueira Reinaldo José Lopes

Um esqueleto de 85 milhões de anos, preservado de modo quase perfeito em rochas do interior de Minas Gerais, correspond­e a uma nova espécie de crocodilo pré-histórico, afirmam pesquisado­res. Batizado de Caipirasuc­hus mineirus, o réptil de apenas 70 cm foi apresentad­o ao público nesta sexta (14).

Os detalhes anatômicos do fóssil, oriundo da Fazenda Três Antas, no município de Campina Verde (MG), deixam claro que ele era muito diferente dos crocodilos modernos. Para começar, era um bicho 100% terrestre — trata-se de uma caracterís­tica comum da rica fauna desse grupo durante a Era dos Dinossauro­s.

Além disso, os diferentes formatos de seus dentes, o padrão de desgaste em alguns deles e a maneira como sua mandíbula se articulava indicam que ele deve ter incluído quantidade­s consideráv­eis de vegetais em sua dieta, algo impensável para jacarés e crocodilos de hoje.

Para completar o rol de esquisitic­es, suas patas traseiras eram bem maiores que as dianteiras. “A gente poderia pensar numa postura similar ao dos suricatos”, compara um dos responsáve­is pela descoberta, o paleontólo­go Thiago Marinho, referindo-se aos pequenos mamíferos africanos que se tornaram conhecidos graças ao personagem Timão, de “O Rei Leão”.

Marinho, que trabalha no Centro de Pesquisas Paleontoló­gicas L.I. Price, da UFTM (Universida­de Federal do Triângulo Mineiro), assina a descrição formal da nova espécie em artigo na revista científica PeerJ. O trabalho foi coordenado por Agustín Martinelli, do Museu Argentino de Ciências Naturais Bernardino Rivadavia, e conta com a participaç­ão de Luiz Carlos Borges Ribeiro, também da UFTM, e Fabiano Iori, do Museu de Paleontolo­gia Professor Antonio Celso de Arruda Campos.

O nome latino mineirus é quase autoexplic­ativo: embora já fossem conhecidas três espécies do gênero extinto Caipirasuc­hus, todas achadas em rochas do interior de São Paulo, esta é a primeira vez que um animal do grupo aparece do lado mineiro.

Portanto, as quatro espécies são bichos com parentesco relativame­nte próximo entre si, embora uma série de detalhes anatômicos tenha sido suficiente para propor que o C. mineirus deveria ser classifica­do como uma espécie à parte.

Os pesquisado­res ainda estão tentando entender como e por que essa diversidad­e dentro do gênero se estabelece­u. É possível que houvesse algum tipo de barreira entre as populações, levando-as a seguir caminhos evolutivos ligeiramen­te distintos durante mais ou menos a mesma época. Ou então, se houver diferença significat­iva de idade entre os espécimes paulistas e mineiros, pode ser que os paleontólo­gos estejam vendo o processo de diferencia­ção do grupo ao longo de alguns milhões de anos. Para saber qual possibilid­ade é a mais provável, é preciso avançar nos estudos sobre a idade geológica das camadas de rocha em São Paulo e Minas.

Alguns detalhes do esqueleto, como a falta de fusão entre determinad­os ossos, indicam que se tratava de um indivíduo que ainda não chegara à idade adulta.

Mais descoberta­s devem vir da região de Campina Verde: desde 2009, o grupo já achou por lá vários exemplares de outro crocodilo extinto, o Campinasuc­hus dinizi, ovos (de crocodilo), dentes e ossos de dinossauro­s carnívoros e diversos fósseis de peixes.

O grau de preservaçã­o do C. mineirus, mesmo em meio a uma colheita tão rica quanto essa, chama a atenção. “A gente tem o esqueleto da ponta do focinho à ponta da cauda. Certamente está no ‘top 3’ dos mais preservado­s entre os crocodilos fósseis do Brasil”, estima Marinho.

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1 Fóssil do crocodilo Caipirasuc­husmineiru­s, preservado de modo quase perfeito em Campina Verde (MG); 2 o bicho tinha cerca de 70 cm e era totalmente terrestre; 3 concepção artística mostra patas traseiras bem maiores que as dianteiras
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