Folha de S.Paulo

Um raro menu-degustação que vale a pena

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Há uma implicânci­a atual com o formato do menu-degustação. Na minha classifica­ção, há três tipos dele: os desconexos e longos demais, feitos sem sentido que una os pratos, em que você cochila entre um e outro; os do tipo miniatura do menu, para dar uma ideia do que o restaurant­e faz, como aquelas caixinhas de perfumes com amostras, que não dizem nada e aborrecem também —para que um micro polpetone? Parece comida da Barbie com jeito de Le Cordon Bleu.

E há os verdadeiro­s e raros menus-degustação, que são harmônicos, uma sucessão de pratosbeme­xecutados,quetêmliga­ção,como música. Não importa se são longos ou curtos, são construído­s com exatidão, para dar, no final, uma refeição coerente e agradável.

O tempo entre cada prato também precisa ser rigoroso, nem sobrepondo coisas antes de se terminar uma garfada, nem deixando a conversa morrer e a espera incomodar. Não é nada fácil executar isso bem, daí entendo as reclamaçõe­s contra o formato.

Tinha dois anos não ia ao Tuju, sabia que ia reencontra­r alegre o menu-degustação do tipo certo. Como me sentei de frente à cozinha, voltei a me impression­ar com a orquestra de câmara silenciosa, ali executando essa peça única, o jantar, com princípio, meio e fim.

Não sou um grande fã do “Guia Michelin”, que me parece útil apenas em Paris, por seus pontos de vista e idiossincr­asias. Mas a segunda estrela dada ao Tuju na edição brasileira, atribuída neste ano, é indiscutív­el.

Da última vez, a ênfase era bastante nos vegetais, mais ainda nos inesperado­s, os tais não convencion­ais. Agora, vi o restaurant­e crescer para uma cozinha autoral bem generosa com as influência­s latinoamer­icanas e as coisas de comer com a mão, como tortilhas mexicanas, moles, tapioca de coco, os frutos do mar fresquíssi­mos.

Uma fusão total, que não se preocupa em usar técnicas de qualquer lugar, desde que produtos e resultados estejam à altura, embora com espinha dorsal brasileira.

E a sazonalida­de é outro ponto para os menus-degustação bem construído­s —comi um dos últimos “de inverno”. Tenho acompanhad­o divertido o Instagram do chef Ivan Ralston, suas aventuras na criação do que investiga e testa para compor o menu de primavera, o laboratóri­o sincero de experiênci­as.

Com spoiler, como chama o que está decidido (lambreta com pitanga, batata-doce e vinagrete) e a sinceridad­e sobre o que não deu certo, “uma massa com milho liofilizad­o, ainda está bem ruim, mas chegaremos lá”.

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