Folha de S.Paulo

Consumidor tenta melhorar nota de crédito para conseguir empréstimo

Empresas esperam que o uso da pontuação se intensifiq­ue por causa do cadastro positivo

- Filipe Oliveira e Anaïs Fernandes

Consumidor­es vêm percebendo que só ter o nome limpo pode não ser o suficiente para conseguir crédito.

Além de consultar informaçõe­s nos cadastros de devedores, quem empresta também avalia o score de seus clientes, uma pontuação que vai de 0 a 1.000 e indica o risco de ele não pagar a conta —quanto menor a nota, maior o risco.

A ferramenta ficou mais conhecida após empresas que atribuem essas notas permitirem que o consumidor consultass­e seu score pela internet.

A página da Boa Vista SCPC, que permite a checagem desde 2017, recebe por mês mais de 1 milhão de visitas de pessoas que querem saber sua nota.

Consumidor­es que descobrira­m que têm nota baixa estão procurando os bureaus de crédito para descobrir como elevar suas pontuações.

A assistente administra­tiva Carla Rocha, 23, foi até a Serasa em São Paulo levar comprovant­e de endereço e de renda para tentar melhorar sua nota na última quinta-feira (13) .

Ela quer financiar um carro, mas não consegue porque seu score está próximo de 200. Carla emitiu boletos na internet e, depois de desistir do que iria comprar não pagou. Além disso, tem poucas contas em seu nome —fazer pagamentos em dia ajuda a aumentar a pontuação.

A empresária Ana Maria Vaz de Almeida, 57, conta que melhorou sua pontuação de 238 pontos para mais de 800 em nove meses. “Hoje tenho carro financiado, tenho cartão de crédito, tudo.”

Para conseguir isso, atualizou informaçõe­s junto à Serasa e aderiu ao cadastro positivo, banco de dados com informaçõe­s sobre empréstimo­s e contas do consumidor.

Segundo o SPC Brasil (Serviço de Proteção ao Crédito), o número de consumidor­es que aderiram ao cadastro positivo pulou de cerca de 6 milhões, há um ano, para 11 milhões.

Mesmo com a alta, empresas do setor consideram a quantidade baixa para que o cadastro tenha impacto no mercado. As companhias apoiam uma lei que tramita no Congresso e torna a entrada no cadastro automática.

Michael Viriato, coordenado­r do laboratóri­o de finanças do Insper, diz que o uso de notas de crédito por consumidor­es é comum nos Estados Unidos e ainda está em estado incipiente no Brasil.

“Com o tempo, os consumidor­es vão reconhecer o score como algo de que você cuida, porque vale dinheiro. Se seu score sobe, tem mais crédito, taxas menores e menos burocracia”, diz Rodrigo Abreu, presidente do Quod (bureau lançado neste ano com grandes bancos como acionistas).

Apesar das promessas de que essas ferramenta­s podem gerar mais justiça na concessão de crédito, entidades que defendem consumidor­es têm críticas em relação a elas.

Rafael Zanatta, líder do programa de direitos digitais do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), diz que o caso brasileiro é muito diferente do americano, onde há uma lei federal sobre como fazer a pontuação justa do consumidor, com dispositiv­os para garantir a não discrimina­ção por questões sociais, raciais e de gênero.

Segundo ele, o consumidor tem o direito de obter um relatório com os elementos utilizados para formar seu score.

Em vez disso, no Brasil rece- be informaçõe­s genéricas, como de que ele deve colocar a conta de luz em débito automático, afirma Zanatta.

Renata Reis, coordenado­ra das áreas técnicas do Procon-SP, acrescenta que, além de não ter informaçõe­s adequadas, o consumidor ainda não se beneficia de juros mais baixos quando tem boa nota.

“A promessa de que o bom pagador vai ser beneficiad­o não vem sendo cumprida”, diz.

As empresas de proteção de crédito afirmam que é uma questão de tempo até que os consumidor­es entendam a importânci­a do score.

“Tudo o que é novo gera dúvidas. Mas investimos em conteúdo para ajudar o consumidor a entender o que é levado em conta”, diz Matheus Moura, do Serasa Consumidor.

Segundo ele, empresas já estão definindo juros de acordo com a pontuação do cliente, e consumidor­es que usam ferramenta de comparação de empréstimo­s recebem propostas diferentes dos bancos.

Pablo Nemirovsky, superinten­dente de serviços ao consumidor da Boa Vista SCPC, diz que existem dúvidas sobre o score por ele ser um assunto novo para a maior parte dos consumidor­es brasileiro­s.

Segundo ele, em países em que já existe cultura do uso da ferramenta, os consumidor­es já sabem o que fazer para aumentar a pontuação.

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Eduardo Anizelli/ Folhapress Carla Rocha, 23 (acima), que tenta reduzir a nota para comprar um carro, e Ana Maria Vaz de Almeida, 57, que conseguiu crédito após triplicar a sua pontuação
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