Folha de S.Paulo

Diretor de ‘Debi & Loide’ vence em Toronto

Com drama sobre racismo, cineasta Peter Farrelly desbanca Lady Gaga no festival canadense e se aproxima do Oscar

- Guilherme Genestreti

Em tempos de bommocismo, besteiróis como “Debi & Loide” e “Quem Vai Ficar com Mary?” talvez nem seriam feitos. Quem diria que o diretor deles, o americano Peter Farrelly, estivesse a um passo do Oscar, a quintessên­cia do politicame­nte correto?

Pois com a vitória no Festival de Toronto de “Green Book”, seu primeiro drama, é difícil imaginar o contrário.

O longa segue a receita que comove a Academia: uma história real sobre racismo com tom conciliató­rio. Viggo Mortensen vive um chofer ítaloameri­cano encarregad­o de conduzir um músico negro (Mahershala Ali) pelo sul dos EUA. Só que tudo acontece no início dos anos 1960, quando a segregação racial imperava na porção meridional do país.

Escolhido pelo público na mostra canadense, “Green Book” larga com vantagem para disputar o Oscar. Terá como possíveis concorrent­es outros títulos que deram as caras por Toronto, sobretudo “Nasce uma Estrela”, terceiro remake sobre a ascensão de uma aspirante à fama, agora com Bradley Cooper e Lady Gaga.

No lado dos perdedores, não houve um diretor mais desafortun­ado do que o canadense Xavier Dolan. Seu “The Death and Life of John F. Donovan”, que tivera uma produção turbulenta, foi esculhamba­do pela crítica. Primeira obra em inglês do cineasta, o longa traz um roteiro mal amarrado sobre o suicídio de um popstar no armário (Kit Harington).

Já entre os vencedores, ninguém sai mais satisfeito do que a Netflix, que enfim conseguiu chegar a festivais estrangeir­os. A gigante do streaming, enxotada de Cannes por pressão de cinemas franceses, lançou sete títulos no Canadá na esperança de um ao menos chamar a atenção e ganhar peso para o Oscar.

“Roma”, de Alfonso Cuarón, cumprirá o requisito. Vencedor do Leão de Ouro em Veneza e ovacionado em Toronto, o drama social já é a aposta do México para o prêmio de produção estrangeir­a na Academia e não seria estranho se aparecesse também na categoria de melhor filme.

Fora a premiação, um aspecto intrigante desta edição foi a quantidade de diretores nascidos e criados fora dos EUA mirando regiões e temas caros à identidade americana. Não raro, situam as tramas em áreas empobrecid­as e focam a classe proletária da América.

O inglês Steve McQueen tratou da violência em Chicago com “As Viúvas”, o australian­o Joel Edgerton abordou fundamenta­lismo religioso no Arkansas em “Boy Erased”, e o francês Yann Demange falou de guerra ao crack em Detroit com “White Boy Rick”. Já o israelense Guy Nattiv se voltou ao ódio racial com “Skin”.

Dependênci­a química entre americanos foi tema para o belga Felix van Groeningen (“Beautiful Boy”) e para a londrina Sam-Taylor Johnson (“A Million Little Pieces”). Já o parisiense Jacques Audiard quis com “The Sisters Brothers” subverter o gênero que é ianque por excelência, o faroeste.

Estrangeir­os no país de Trump, esses cineastas criam um fetiche em torno do americano comum, como se a partir dele tirassem uma resposta sobre os humores turbulento­s dos tempos atuais.

 ?? Patti Perret/Divulgação ?? Mahershala Ali e Viggo Mortensen em ‘Green Book’, drama de Peter Farrelly vencedor do Festival de Toronto
Patti Perret/Divulgação Mahershala Ali e Viggo Mortensen em ‘Green Book’, drama de Peter Farrelly vencedor do Festival de Toronto

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil