Folha de S.Paulo

Novo governo terá R$ 87 bi em pendências

Caberá ao próximo governo avaliar projetos de leilões, obras paradas e discussões regulatóri­as

- Taís Hirata

O próximo presidente do Brasil herdará projetos que somam ao menos R$ 87,46 bilhões de investimen­tos —que dependerão do seu aval e de sua vontade política para se concretiza­rem.

São empreendim­entos em diferentes setores que já estão encaminhad­os, com estudos técnicos prontos, projetos de lei enviados ao Congresso ou obras interrompi­das.

No entanto, muitos deles são alvo de questionam­entos e poderão passar por revisões ou mesmo ser abandonado­s pelo próximo governo.

Alguns exemplos: a renovação antecipada de concessões ferroviári­as, que poderiam render R$ 25 bilhões de investimen­tos; o leilão de aeroportos regionais, em análise pelo TCU, e que pode gerar R$ 3,52 bilhões; a usina de Angra 3, cujas obras bilionária­s estão paradas e que demandaria­m cerca de R$ 14 bilhões para serem concluídas.

Essa herança que será passada ao próximo governo pode ser ainda maior se for incluído na conta o megaleilão de petróleo da área conhecida como cessão onerosa.

O certame poderá render a espantosa cifra de R$ 420 bilhões em investimen­tos para viabilizar a produção, segundo cálculo da ANP (Agência Nacional de Petróleo).

O leilão, porém, ainda depende da aprovação de um projeto de lei no Senado e de acordos com a Petrobras.

O novo governo poderá mudar totalmente o rumo desse projeto, avalia Giovani Loss, sócio da área de óleo e gás do Mattos Filho.

“Há fortes incentivos para que o leilão ocorra, como a crise fiscal, que torna difícil para o governo negar uma receita desse nível. Mas a verdade é que ele pode ser cancelado a qualquer momento”, diz.

Esse não é o único projeto que pode ser abortado ou alterado na próxima gestão.

As privatizaç­ões, principalm­ente a da Eletrobras, dificilmen­te passarão incólumes pela transição presidenci­al, afirma Fernando Vernalha, sócio especialis­ta em infraestru­tura do VGP Advogados.

Além delas, estão sujeitos a mudanças de curso os empreendim­entos de setores cuja regulação é menos madura no país —caso de portos, ferrovias e saneamento básico, de acordo com Marcos Ganut, sócio da consultori­a Alvarez & Marsal.

Há também grandes obras de infraestru­tura, hoje paralisada­s, que deverão ter seu destino definido pelo próximo presidente.

Um estudo da CNI (Confederaç­ão Nacional da Indústria) apontou três casos emblemátic­os: a transposiç­ão do rio São Francisco, a Fiol (Ferrovia de Integração Oeste-Leste) e a Ferrovia Nova Transnorde­stina.

Essas obras, bilionária­s, foram interrompi­das devido a problemas técnicos e de falta de governança. Portanto, precisarão passar por uma reanálise, segundo Ilana Ferreira, especialis­ta em políticas e indústria da entidade.

“Houve casos de obras iniciadas sem que o projeto todo estivesse concluído, o que não faz o menor sentido. Houve falta de planejamen­to de prazos, de financiame­nto e de demandas realistas”, diz.

Para ela, seria viável que ao menos a transposiç­ão do rio São Francisco e a Fiol fossem concluídos pelo próximo governo, com os devidos ajustes.

Outro exemplo é a usina nuclear de Angra 3, cujas obras foram paradas em 2015, com cerca de 60% de sua execução. Estima-se que o valor necessário para sua conclusão seria de cerca de R$ 14 bilhões.

Analistas do setor preveem que as obras poderão ser retomadas com a possível entrada de um novo parceiro privado, mas ainda não há uma saída clara para a questão.

Para concluir o grupo de pendências que serão repassadas ao novo presidente, há também as propostas de renovação antecipada de concessões ferroviári­as e a relicitaçã­o de concessões (principalm­ente rodoviária­s e de aeroportos) que tiverem problemas financeiro­s —ambas extremamen­te polêmicas.

Para as operadoras de ferrovias do país, a renovação antecipada das concessões vigentes é um dos principais pleitos. Em troca dessa prorrogaçã­o dos contratos, as concession­árias seriam obrigadas a fazer investimen­tos adicionais de cerca de R$ 25 bilhões.

“Essa medida teria um impacto maior do que os próprios projetos de ferrovias novas”, diz Fernando Paes, diretor-executivo da ANTF (Associação Nacional dos Transporta­dores Ferroviári­os).

A proposta, porém, é alvo de críticas de procurador­es, políticos e mesmo analistas do setor, que questionam o custo-benefício de fazer uma prorrogaçã­o em vez de uma nova licitação.

Para Fernando Marcondes, sócio da L.O. Baptista Advogados, a renovação antecipada não é positiva. “Ela perpetua o controle das ferrovias nas mãos de poucas empresas”, diz ele.

Já o caso da relicitaçã­o é um pleito principalm­ente das concession­árias de rodovias que estão em dificuldad­e financeira. Essas empresas querem devolver suas concessões, para que estas possam ser novamente levadas a leilão.

Há uma lei, em vigor desde o ano passado, que autoriza o processo, mas a regulament­ação nunca saiu, o que impede que a devolução ocorra na prática.

O presidente Michel Temer chegou a anunciar que publicaria um decreto com as regras, mas até agora elas não saíram, e a expectativ­a é que não sejam publicadas.

“É um ponto polêmico que tende a ser objeto de reanálise pelo próximo governo”, avalia

“A alternânci­a no governo federal não tem um impacto tão forte. Há uma expertise técnica que já debateu projetos com vários governos. O setor de infraestru­tura não é tão sensível

Letícia Queiroz de Andrade Advogada especializ­ada em concessões e infraestru­tura

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Fotos Divulgação Da esq. para a dir.: rodovia Dutra, que liga SP ao RJ, obras da usina nuclear Angra 3 e o aeroporto do Recife; projetos são alvo de estudos para serem licitados ou receberem investimen­tos
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Ronny Santos - 2.jun.2018/Folhapress
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