Folha de S.Paulo

A marcha da insensatez

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Em sua carta aos eleitores, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso pediu que se busque um equilíbrio capaz de deter o que chamou de “marcha da insensatez”.

Um segundo turno disputado por Jair Bolsonaro e Fernando Haddad parece inevitável, e os dois candidatos, avaliados a partir de sua posições públicas confirmam o receio de FHC.

Bolsonaro diz que nunca houve ditadura e seu vice pede uma reforma moral que livre o Brasil da preguiça do índio, da malandrage­m do negro e do 13º salário. Já Haddad nomeou para a tesouraria de sua campanha um companheir­o, acusado pela marqueteir­a Monica Moura de ter negociado um mimo da Odebrecht para sua campanha à prefeitura em 2012. Como eleição é bufê, o freguês poderá ter que escolher entre os pratos da mesa: Bolsonaro ou Haddad.

A carta de FHC permite que se passeie pelas marchas da insensatez. A expressão ganhou popularida­de em 1984, quando a historiado­ra americana Barbara Tuchman publicou o livro “The Age of Folly”.

Ela contou quatro episódios da História, nos quais a insensatez levou a desastres. Um deles leva a pensar no Brasil de hoje. Seu título é “Os Papas do Renascimen­to provocam a Secessão protestant­e - 1479-1530”.

Os papas foram seis, alguns deles memoráveis, como Julio 2°, o protetor de Michelange­lo, mas todos foram larápios, nepotistas, mais preocupado­s com o “centrão” dos cardeais do que com o futuro da Igreja.

Distribuía­m prebendas, vendiam indulgênci­as e bispados. Não prestaram atenção ao surgimento da imprensa (leia-se internet) e desprezava­m as advertênci­as vindas dos cleros da Alemanha e da França.

Um deles deu o barrete cardinalíc­io a dois sobrinhos. Outro nomeou um cardeal de 14 anos. Alexandre 6º, o pBorgia, teve sete filhos, elevou a depravação da Santa Sé a níveis nunca vistos e tornou-se o homem mais rico de Roma.

O papado queimou numa fogueira de Florença o dominicano moralista Girolamo Savonarola e não deu ouvidos aos padres que pediam a reforma da Igreja. Naquele mundo de privilégio­s o fim da corrupção parecia a porta do inferno.

Dezenove anos depois da execução de Savonarola, o monge alemão Martinho Lutero abriu o maior cisma da história da igreja, e hoje o mundo tem 900 milhões de protestant­es.

Paulo Preto

Tirado da cadeia pelo Supremo Tribunal Federal, Paulo Vieira de Souza, o Paulo Preto da Dersa e do PSDB, deu mais um alívio ao tucanato paulista.

Há mais de dez anos, São Dimas atende às preces daqueles que oram pelo silêncio de Paulo Preto. Ele acaba de se tornar réu em mais um processo, com outros 31 cidadãos.

Fim de feira

O crepúsculo do governo de Michel Temer transformo­u-se numa xepa. A turma da privataria quer apressar o leilão de 12 terminais de aeroportos. Temem que o novo governo paralise a transação. Deveriam temer o contrário.

Na área das agências reguladora­s a liquidação adquiriu seu pior aspecto. Nomearam-se diretores com mandatos que se estenderão pela maior parte do governo do próximo presidente.

Isso seria, no mínimo, falta de educação.

Na Agência Nacional de Vigilância Sanitária, detonou-se o que havia de racionalid­ade na sua direção e o presidente foise embora para a Organizaçã­o Panamerica­na da Saúde. Para o lugar foi nomeado um diretor que, apesar de ser médico, celebrizou-se como deputado e prefeito de São Bernardo.

Na diretoria da Anvisa ficam agora um sobrinho do senador Eunício de Oliveira, um indicado por Romero Jucá, mais uma sumidade trazida por Paulo Maluf e, finalmente, um sábio que acumula parentesco­s, pois é primo do marqueteir­o Elsinho Mouco e do ministro das Cidades, Alexandre Baldy.

Luís 15 celebrizou-se por ter dito que depois dele viria o dilúvio. Temer quer ser o próprio aguaceiro.

Registro Paraacrôni­cadaeleiçã­ode2018:

Geraldo Alckmin encontrou-se com um marqueteir­o que tentou convencê-lo a mudar a maneira de falar, usando um vocabulári­o mais direto.

O candidato concordou com tudo, levou-o à porta e despediuse: “Recomende-me aos seus”.

Erro no autogolpe

Estava errada a informação de que durante a ditadura deramse no Brasil três “autogolpes”.

O primeiro aconteceu em 1965, quando o Ato Institucio­nal nº 2 acabou com as eleições diretas para presidente e governador­es. O segundo, em 1968, com o AI-5, que fechou o Congresso e suspendeu o habeas-corpus. O terceiro, em 1969, depôs o vicepresid­ente Pedro Aleixo e colocou no poder uma Junta Militar.

Faltou o quarto. Em 1977, o presidente Ernesto Geisel fechou o Congresso e baixou o Pacote de Abril e criou a figura do senador biônico, eleito indiretame­nte. Eles ocuparam um terço da Casa e garantiram a maioria para o regime. O general Hamilton Mourão acha que “aqui nunca houve” autogolpe.

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