Protesto contra governo do México acaba em massacre
Episódio na praça de Tlatelolco ocorre a dez dias do início da Olimpíada
2 de outubro de 1968 Pouco mais de 10 mil pessoas participavam de uma manifestação pacífica contra o governo de Gustavo Díaz Ordaz na região central da Cidade do México, no final da tarde deste dia 2 de outubro.
Liderado por estudantes, o protesto na praça das Três Culturas, também conhecida como Tlatelolco 1 , reunia ainda professores e operários, além de famílias.
Durante o discurso de um líder estudantil, dois helicópteros sobrevoaram a manifestação, emitindo uma luz verde. O sinal estava aberto, pareciam indicar as aeronaves.
Atiradores localizados em um prédio vizinho à praça abriram fogo contra o público. Enquanto corpos caíam ao chão, os demais participantes do ato, desesperados, tentavam deixar o local, mas poucos conseguiram escapar.
Não bastassem as muralhas de um complexo de ruínas astecas no entorno da praça, bloqueios organizados por policiais impediam a fuga dos manifestantes. Alguns tentaram se proteger dos tiros entrando na histórica igreja de Santiago (construída pelos espanhóis no século 16), mas as portas estavam fechadas.
De acordo com as fontes oficiais, foram cerca de duas dezenas de mortos. Os estudantes, por sua vez, indicaram centenas de mortos e mais de mil feridos. Considerando os cadáveres amontoados pelas ruas da área central da capital mexicana, os números anunciados pelos jovens opositores do governo Díaz Ordaz parecem mais factíveis 2.
A jornalista italiana Oriana Fallaci, que cobria o protesto para a revista L’Europeo, foi atingida com três tiros 3.
Os policiais chegaram a invadir casas próximas de Tlatelolco para prender manifestantes que tinham escapado do cerco organizado pelas forças de segurança.
O episódio acontece a dez dias da abertura da Olimpíada da Cidade do México.
Díaz Ordaz se preocupa em mostrar ao mundo que o seu país está preparado para um evento desse porte, o que implica, entre outras medidas, manter os grupos antigoverno sob severo controle. O presidente disse recentemente que tomaria todas as ações necessárias para evitar a perda de prestígio do México.
Os opositores acusam o mandatário de linha conservadora pelo massacre em Tlatelolco. Dizem que, depois de uma série de protestos nas últimas semanas, o presidente resolveu reagir com ainda mais truculência.
O governo negou responsabilidade pelo massacre
Eleito em 1964, Díaz Ordaz, do PRI (Partido Revolucionário Institucional), passou a ter a legitimidade do seu governo questionada em meados de seu quarto ano de mandato.
A inquietação popular cresceu a partir de um episódio aparentemente prosaico. No dia 22 de julho, houve uma briga entre integrantes de duas escolas secundaristas rivais da Cidade do México.
Um dia depois, aconteceu uma nova confusão, desta vez envolvendo estudantes e membros de gangues, seguida de uma reação excessiva da polícia. Alguns alunos e professores foram espancados por mais de três horas.
As manifestações ganharam força nas semanas posteriores. Os protestos se voltavam principalmente contra a violência policial, mas os estudantes também gritavam contra o comportamento da imprensa, muito alinhada ao PRI, e pediam mais autonomia para as universidades e liberdade para os colegas presos nas últimas semanas.
Os jovens mexicanos também têm sido influenciados pelas insurreições estudantis recentes em outros países, como a França e os EUA.
A brutalidade das forças do governo vem aumentando a cada dia. Em 18 de setembro, o Exército cercou o campus da Universidade Nacional Autônoma do México (Unam), a maior do país.
Na ocasião, estudantes e professores estiveram sob a mira de baionetas dos soldados, e mais de mil pessoas foram presas. O reitor da Unam pediu demissão.
Cinco dias depois, policiais invadiram a Escola Politécnica, e os universitários reagiram com pauladas. O Exército interveio e disparou tiros contra os estudantes. Cerca de 40 pessoas ficaram feridas.
Nos dias seguintes, cresceu o apoio da população às causas estudantis, o que resultou em mais gente nos protestos pelas ruas da Cidade do México.
Com esse episódio sangrento de 2 de outubro, em Tlatelolco, a tensão definitivamente dá lugar à tragédia.