Folha de S.Paulo

McCartney e Givenchy mostram fusão de gêneros sem resvalar na androginia

Grifes aposentam moletom em Paris para lançar mão de alfaiatari­a que suaviza a rigidez dos cortes

- Pedro Diniz Alain Jocard/AFP Gonzalo Fuentes/Reuters

Há uma confusão quando se tenta definir moda “sem gênero”, um tipo de roupa que homens e mulheres podem usar. O varejo traduziu esse padrão, já antiquado nas novas passarelas de verão 2019, ou com androginia ou com quilos de moletom, matériapri­ma usada à exaustão por Stella McCartney e Givenchy em temporadas passadas.

Agora, ambas retomam o embaralham­ento dos guardaroup­as de uma forma mais inteligent­e e difícil de reproduzir, lançando mão de uma alfaiatari­a relaxada que suaviza a rigidez dos cortes com cores, mesclando-a a uma imagem essencialm­ente feminina.

Porta-voz da moda de luxo sustentáve­l, Stella abusou de linhos e viscose ecológica — que quase não leva petróleo na composição— para criar uma alfaiatari­a relaxada e bem amarrada em tons de off-white, rosa, oliva e azuis.

As formas são soltas, têm detalhes assimétric­os e são levemente ajustadas, para criar a imagem feminina em uma seara reservada aos homens. Macacões forrados de zíperes e com gola esportiva potenciali­zam o viés despojado caracterís­tico do estilo da estilista.

Os modelos masculinos, novidade no portfólio da grife, recebem o mesmo tratamento de corte e tonalidade da ala feminina, como extensão do discurso de fundir os gêneros sem separá-los completame­nte.

Não há nem sinal dos moletons, que foram substituíd­os por vestidos de tricô tingido em técnica de tie-dye. Esse padrão, próprio da moda hippie, assume uma imagem luxuosa quando aplicado no “acid jeans”, um tipo de lavagem manchada que usa tons escuros e iluminados.

Os desenhos foram milimetric­amente aplicados nas blusas de gola “V”, nos conjuntos de calça e camisa masculina e no macacão trajado pela modelo Kaia Gerber, filha de Cindy Crawford e uma das recordista­s de passarela desta temporada internacio­nal.

Stella ainda balanceia a coleção com vestidos fluidos, alguns construído­s como lingerie, para reafirmar que sua moda, mesmo relaxada, pende para público feminino.

Bermudas de ciclista, outra aposta já confirmada para o próximo verão, vieram embebidas de estampa floral, padronagem poucas vezes utilizada pela monocromát­ica designer inglesa.

Um nível acima de austeridad­e veio a Givenchy. A estilista Clare Waight Keller, tesoura do vestido de casamentod­a atriz Meghan Markle com o príncipe britânico Harry, permitiu-se usar echarpes, tomara que caia e plissados, mas foi a interseção dos armários que conduziu seu estudo.

A escritora e fotógrafa suíça Annemarie Scwarzenba­ch (1908-1942), que se vestia de homem e é reconhecid­a como uma das primeiras mulheres andróginas do século 20, inspirou a coleção de cartela baseada em verde militar, beges e lavandas.

Trench coats, calças de cintura alta e jaquetas perfecto, estruturad­as com fechos transversa­is e acabadas com zíperes, compuseram o repertório de Keller para o verão 2019 da marca.

A estilista questiona os signos relacionad­os à masculinid­ade e ao conceito de castidade feminina do início dos anos 1910. Por exemplo, em um vestido preto com a parte que vai da linha dos ombros ao pescoço tingida de branco, parecido a um hábito de freira.

No meio, entre o umbigo e a genitália, ela cola linhas metálicas em formato de triângulos com ponta para cima, símbolo da masculinid­ade.

McCartney e Keller parecem querer desafiar as normas da silhueta perfeita, curvilínea e ajustada, para oferecer uma nova versão de feminilida­de, chique, sem rebusco e de alta voltagem imagética.

 ??  ?? À esq., criação da Givenchy; à dir., a modelo Kaia Gerber de macacão Stella McCartney
À esq., criação da Givenchy; à dir., a modelo Kaia Gerber de macacão Stella McCartney
 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil