Folha de S.Paulo

EDITORIAIS Mentira que prolifera

Acerca de mensagens eleitorais pagas no WhatsApp.

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Dois terços dos votantes brasileiro­s possuem conta no WhatsApp, a rede social mais popular do país. Segundo pesquisa realizada pelo Datafolha em 2 de outubro, 44% dos entrevista­dos declararam ler notícias sobre política e eleições por esse meio, e 24%, compartilh­á-las.

Os números bastam para constatar o peso adquirido pela rede na formação da opinião nacional —e, sem dúvida, nos rumos do pleito em curso. Ainda está por ser dimensiona­do, porém, o impacto do fluxo de informaçõe­s enganosas, quando não inteiramen­te falsas, e mensagens difamatóri­as que chegam a todo momento aos usuários.

Antecipava-se, ademais, que a campanha deste ano constituir­ia um marco de importânci­a global quanto às possibilid­ades de combate à disseminaç­ão de fake news. Até aqui, falhamos no teste, como qualquer frequentad­or de ambientes virtuais poderá observar.

Reportagem de Patrícia Campos Mello, desta mostra evidências aterradora­s de como o que originalme­nte seria um aplicativo de conversas privadas se tornou uma arma do jogo eleitoral mais sujo.

Revelou-se que empresas estão a comprar pacotes de disparo em massa de mensagens no WhatsApp contra o PT e seu presidenci­ável, Fernando Haddad. Segundo a apuração, cada contrato chega a R$ 12 milhões, o suficiente para propagar centenas de milhões de textos, áudios, fotos, vídeos e memes.

Trata-se de prática ilegal, dado que há um beneficiár­io óbvio —o adversário de Haddad e favorito na disputa pelo Palácio do Planalto, Jair Bolsonaro (PSL). Assim, a iniciativa correspond­e a uma doação empresaria­l a um candidato, o que está vedado desde 2015.

Bolsonaro declarou não ter controle sobre a ação de apoiadores, indicando desconhece­r o caso. Aventou, inclusive, a hipótese de adversário­s estarem por trás da compra dos pacotes de mensagens com o intuito de prejudicá-lo.

Para a configuraç­ão de abuso de poder econômico não é necessária, apontam especialis­tas, a participaç­ão do candidato —basta que a Justiça Eleitoral considere comprometi­do o equilíbrio da disputa.

Apuração imediata e rigorosa, pois, se faz imprescind­ível. Os instrument­os à disposição permitem que se rastreiem as operações e a origem do dinheiro empregado.

Entretanto existe mais a fazer para que, sem limitar a sagrada liberdade de expressão, os autores de mensagens veiculadas em redes sociais possam ser identifica­dos e, a depender da forma e do conteúdo, responsabi­lizados e punidos.

As autoridade­s brasileira­s podem e devem bater-se pelo fim de um anonimato que premia a desinforma­ção e convida à trapaça. Essa seria providênci­a mais útil que a infinidade de regras minuciosas e paternalis­tas com que a legislação pretende proteger o eleitor.

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