Folha de S.Paulo

Cannadabis

- Hélio Schwartsma­n helio@uol.com.br

O Canadá acaba de legalizar a maconha para uso recreativo. Não tenho dúvida de que o caminho é esse mesmo.

Do ponto de vista filosófico, não penso que caiba ao Estado controlar o que o cidadão faz com o próprio corpo. Sob uma perspectiv­a mais prática, é preciso reconhecer que a guerra às drogas fracassou. A proibição não é uma forma eficaz de reduzir a prevalênci­a do uso de psicotrópi­cos e acrescenta consequênc­ias penais à lista de problemas com os quais o dependente precisa lidar.

Poderíamos mencionar ainda como argumentos pró-legalizaçã­o o alto custo da repressão e o estímulo à violência que decorre de empurrar o mercado para a ilegalidad­e, isto é, para as mãos do crime organizado.

Estabeleci­das essas premissas, devo dizer que me preocupa o glamour com que a maconha vem sendo retratada pelos meios de comunicaçã­o. É verdade que a Cannabis tem impacto sanitário menos deletério do que o álcool, por exemplo, mas ela está longe de ser uma erva inocente que pode ser consumida ad libitum. A maconha é uma droga e, como tal, oferece riscos à saúde de quem a usa. Para uma pequena minoria da população, as consequênc­ias são devastador­as.

São inquietant­es, por exemplo, as metanálise­s que ligam o consumo de maconha ao desenvolvi­mento de psicose crônica e esquizofre­nia. Ao que parece, a relação é causal e não de mero gatilho.

Pior, praticamen­te todos os estudos que sugerem que a Cannabis é relativame­nte segura foram realizados com uma variedade da droga que já não é a que está em circulação. O produto vendido hoje tem uma concentraç­ão muito maior de THC (e menor de CBD). Mal comparando, seria como tentar lidar com o alcoolismo valendo-se de estudos feitos com cerveja, quando a bebida de fato consumida é o uísque. As diferenças não são desprezíve­is.

Legalizar sim, mas sem glamouriza­r nem deixar de apontar que a maconha é uma droga.

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