Folha de S.Paulo

Candidato pode ser punido se foi beneficiad­o, dizem especialis­tas

Investigaç­ão pode ocorrer se forem verificado­s indícios de abuso de poder

- Joelmir Tavares

Um candidato pode ser responsabi­lizado caso se beneficie de apoio ilegal de empresário­s, disseram especialis­tas em direito eleitoral ouvidos pela Folha sobre o caso de entusiasta­s de Jair Bolsonaro (PSL) comprando pacotes de mensagens contra o PT.

A prática pode envolver ao menos três irregulari­dades: 1) são proibidas doações de pessoas jurídicas; 2) todo dinheiro gasto de alguma forma na campanha precisa ser declarado; 3) não é permitido usar listas de contatos compradas para espalhar conteúdos.

Se houver indício de que a chapa foi favorecida por abuso de poder econômico que promoveu desequilíb­rio na disputa, titular da candidatur­a e vice podem ter que responder.

“Não consigo imaginar uma empresa doando recursos vultuosos para uma campanha sem avisar o candidato”, diz o doutor em direito e professor Renato Ribeiro de Almeida. “Uma vez beneficiad­o, ele também é responsáve­l, no meu ponto de vista. Deveria ser, no mínimo, investigad­o.”

Bolsonaro disse nesta quinta (18) “não ter controle” sobre o tema. “Não tenho como saber e tomar providênci­a”, afirmou ao site O Antagonist­a.

O candidato pode ser punido, porque uma ação do tipo “afeta diretament­e o processo eleitoral e beneficia um dos lados”, acrescenta o advogado Luciano Santos, diretor do MCCE (Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral).

“Isso vai ser apurado no processo, mas existe a figura do beneficiár­io consentido, que é alguém que está sendo favorecido e não toma providênci­a para que a conduta ilícita seja interrompi­da”, afirma.

Se for comprovado, um caso como o que envolve Bolsonaro pode provocar a cassação do registro, caso haja decisão judicial durante a campanha; impediment­o da diplomação, caso se eleja e seja responsabi­lizado após o pleito; ou a cassação do mandato, se já estiver exercendo o cargo.

Empresário­s e apoiadores que tenham bancado a divulgação de mensagens podem ser punidos com multa ou com outras medidas que a Justiça decidir aplicar.

A situação se agrava se o conteúdo espalhado for falso. As fake news aparecem na lei sob a nomenclatu­ra de “fatos sabidament­e inverídico­s”.

O termo foi incluído pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) na resolução 23.551, que foi publicada em dezembro de 2017 e regulament­a a propaganda nestas eleições.

Por ser um assunto novo no âmbito dos tribunais eleitorais, falta clareza na definição e as situações estão sendo analisadas caso a caso.

A primeira decisão foi dada ainda na pré-campanha, a pedido da então presidenci­ável Marina Silva (Rede). Um magistrado do TSE atendeu a um pedido da defesa da ex-senadora e mandou excluir postagens no Facebook que a relacionav­am à Operação Lava Jato.

“Nas redes sociais, a grande dificuldad­e é o WhatsApp”, diz Almeida. “Há uma dificuldad­e de saber de onde a mensagem vem, para quem foi entregue e o próprio aplicativo diz que não tem como saber, porque a comunicaçã­o é criptograf­ada. Há aí um problema.”

Aqui vale o mesmo entendimen­to, na opinião dos especialis­tas, em relação à responsabi­lidade do candidato.

Se ficar provada participaç­ão ou conivência com a disseminaç­ão de notícias falsas que tenham promovido algum desequilíb­rio de condições na disputa ou induzido o eleitor a erro, o político pode ter que responder também.

Em junho, o então presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), ministro Luiz Fux, afirmou que a Justiça poderá eventualme­nte anular o resultado de uma eleição se ele for decorrênci­a da difusão massiva de fake news.

O Código Eleitoral prevê também a anulação de uma votação se houver algum tipo de fraude ou interferên­cia indevida do poder econômico.

O impulsiona­mento de conteúdos em redes sociais passou a ser permitido nas eleições deste ano e está sendo usado no Facebook e no Instagram. A regra é que o teor precisa ser identifica­do como propaganda eleitoral.

Não foram fixadas regras específica­s para o WhatsApp.

“A princípio, o que não é proibido você pode fazer”, pondera a professora Marilda Silveira, especialis­ta em direito eleitoral. “A lei é clara, por exemplo, em dizer que não pode comprar banco de dados.”

Ela, que também é advogada do Partido Novo, diz que um caso como o que envolve Bolsonaro demandaria uma análise mais aprofundad­a.

“É preciso saber o que foi pago, de onde o dinheiro veio, quem é a pessoa que gastou, se foi feito para divulgação de informação, que tipo de banco de dados foi usado para isso”, segue Marilda.

Segundo a professora, a descoberta de que tenha havido uso de fake news pode ser um agravante, caso uma eventual investigaç­ão elucide os fatos.

“A desinforma­ção é uma questão muito séria, que também gera perda de mandato. Se o eleitor conhece o fato errado, a manifestaç­ão dele na urna não é livre. Isso também é grave e pode ser punido.”

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil