Folha de S.Paulo

Luxo não existe no país quando o tema é alta-costura

- Gloria Kalil Consultora de moda, jornalista e autora dos livros ‘Chic’ e ‘Chic Profission­al’

Moda de luxo no Brasil existe? Ou, melhor ainda, luxo no Brasil existe?

Se considerar­mos luxo a alta-costura francesa e italiana, com roupas impecáveis que podem ser usadas pelo avesso tal a perfeição das peças, não. Se considerar­mos que algumas marcas do prêt-àporter internacio­nal entram nessa categoria pelo cuidado com que tratam suas coleções, sempre feitas em preciosos tecidos, também não.

Se pensarmos em bolsas ou paletós feitos por artesãos que praticam a costura do couro há duas ou três gerações e se lembrarmos das grandes marcas de joias nos pescoços, cabeças e mãos da nobreza mun- dial, a resposta seria um rápido, definitivo e convicto, não.

No entanto, apesar de todos esses atributos, verdadeiro­s e inquestion­áveis, a bolha do luxo está inquieta, atrás de um algo mais, uma novidade, um encantamen­to, uma surpresa. Não porque esteja perdendo clientes, ao contrário, o mundo do luxo teve um aumento de 55% no seu faturament­o nos últimos anos.

Nem que esteja envelhecen­do, porque o marketing dessas grandes marcas corteja e mima as novas gerações, buscando nelas as mais lindas garotas, geralmente filhas de antigas clientes ou ex-modelos, cantores conhecidos, as mais selecionad­as blogueiras, as mais exóticas celebridad­es para desfilarem em suas passarelas, sentarem nas primeiras filas e usarem suas peças antes que cheguem às lojas.

Que algo a mais, então? O que mais o luxo procura oferecer aos seus tão mimados, exigentes e famosos clientes?

Uma experiênci­a. Essa tem sido a palavra mágica, a ideia na cabeça dos gestores e das equipes de comunicaçã­o das grandes marcas. Transporta­r os clientes e embaixador­es para experiênci­as em cenários diferentes, onde cheiros, paladares, cores e paisagens contagiem seus atributos para os logos e os produtos. Para que envolvam os arautos de suas marcas nas qualidades do ambiente da experiênci­a e as transmitam imediatame­nte via redes sociais ou em capas de revista e jornais.

E aí entra o Brasil. Bem ou mal, (ainda) somos saudados com um sorriso a cada vez que mencionamo­s o nome do nosso país. Já fizeram o teste? Digam para um estrangeir­o que é brasileiro e imediatame­nte ele sorri, como se descortina­sse diante dele a visão de algumas das qualidades que (ainda) são atribuídas ao país: sol, alegria, festa, música, praia, graça, simpatia, beleza.

Esse pacote representa opl us que toda marca adoraria que o cliente associasse ao seu nome. Esse pacote “é luxo só” e dentro dele vem nossa moda, que jamais será associada ao luxo europeu, calcado em séculos de cultura, ao luxo americano das pilhas de dólares, ao luxo árabe baseado no petróleo e ao oriental de tradição e tecnologia.

Temos a oferecer uma moda casual, mais dinâmica, mais imaginativ­a, fácil de usar, que leva em conta o corpo, o movimento, a identidade de quem a usa. Nossa moda tema oferecera criativida­de e ofres cor que o sorriso do estrangeir­o visualiza e capta quando falamos do país. Ela completa e valoriza o pacote da experiênci­a Brasil. Não é pouca coisa.

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