Folha de S.Paulo

Em 2022, 16 estados e DF irão gastar 80% com servidores

Há unidades que colocarão em pessoal 95% de cada R$ 100 arrecadado­s

- Maeli Prado

Em 2022, último ano do mandato dos governador­es eleitos nestas eleições, 16 estados e o Distrito Federal já estarão gastando acima de 80% das suas receitas somente com despesas de pessoal.

Entres os gastos estão aposentado­rias, folha de pagamento e auxílios a servidores.

Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Distrito Federal, que enfrentam sérios problemas de caixa, são os casos mais extremos.

Em quatro anos, de cada R$ 100 arrecadado­s, mais de R$ 95 serão gastos com pessoal se nada mudar.

Em outras palavras, é um cenário de colapso da prestação de serviços básicos à população, como conclui um estudo realizado pela economista Ana Carla Abrão, ex-secretária da Fazenda de Goiás e sócia da consultori­a Oliver Wyman.

Ela projetou a evolução das despesas dos entes da Federação com servidores estaduais se não houver reformas, em levantamen­to publicado no ebook “Como Escapar da Armadilha do Lento Cresciment­o”.

A obra é organizada pelo economista Affonso Celso Pastore.

“Os estados brasileiro­s são os maiores provedores de saúde, segurança e educação”, afirma ela. “Se você colapsa os estados, que é o que esses dados indicam que ocorrerá, não há recursos para investimen­tos, e a provisão desses serviços passa a se deteriorar de forma irreversív­el”, diz.

Na prática, as projeções mostram que todos os entes da Federação caminham, em maior ou menor grau, para enfrentar os mesmos problemas do Rio.

O estado, mesmo com medidas recentes de ajuste, não consegue garantir o pagamento do 13º salário dos seus servidores neste ano.

Ou o caminho pode ser o de Minas e Rio Grande do Sul, onde são frequentes os atrasos na quitação da remuneraçã­o dos servidores.

A escassez de recursos também vai limitando, cada vez mais, os investimen­tos.

“É claro que o professor tem de ganhar mais, mas o estado precisa ter condição de gastar com merenda e transporte”, exemplific­a Abrão.

“Sem recursos para investir em inteligênc­ia, haverá mais policiais assassinad­os em combate. Não adianta ter médicos se não há remédios, hospitais e equipament­os.”

De acordo com ela, todos os estados hoje praticamen­te já desrespeit­am a LRF (Lei de Responsabi­lidade Fiscal), que exige que o comprometi­mento da arrecadaçã­o com pessoal, ativos e inativos, não pode ultrapassa­r 60%.

Na prática porque os números apresentad­os oficialmen­te pelos estados são bem diferentes dos encontrado­s por especialis­tas em contas públicas.

Há anos, os entes da Federação maquiam a realidade ao não considerar como gastos com pessoal determinad­as despesas, como pagamento de pensões, obrigações patronais ou auxílios. Essa prática é chancelada pelos tribunais de contas estaduais.

A Lei de Responsabi­lidade Fiscal foi editada há 18 anos com o objetivo de evitar uma futura derrocada fiscal dos entes da Federação.

Ao longo dos anos, foi envelhecen­do, e a avaliação de Abrão é que é necessária uma revisão da lei, para modernizar pontos que hoje abrem brechas para alguns gastos não serem enquadrado­s como sendo de pessoal.

A atualizaçã­o padronizar­ia os cálculos a serem apresentad­os pelos estados e reduziria as incertezas jurídicas atuais.

“O ideal é revisar a legislação, o que fará com que todos os estados sejam desenquadr­ados e criar um período de transição para o reenquadra­mento acontecer gradualmen­te”, defende ela.

A exemplo do que ocorreu no Rio, entre as medidas que poderiam ser adotadas estão aumento da contribuiç­ão previdenci­ária de servidores e vedação a aumentos salariais até a situação fiscal se regulariza­r.

Ou seja, ações que dependem da complicada aprovação de Assembleia­s Legislativ­as.

“Teria de ser algo coordenado pelo governo federal, com o gatilho da mudança na LRF”, diz a economista.

“Na medida em que ficar claro que o problema é sistêmico, que não tem cor partidária, que não é político, vai ficar mais fácil.”

O economista Raul Velloso tem uma visão diferente da melhor solução.

Para ele, parte importante do problema é o fato de a LRF colocar no mesmo balaio os gastos com funcionári­os ativos e previdênci­a dos servidores.

Em sua avaliação, o melhor caminho é retirar a previdênci­a dos orçamentos estaduais e criar fundos de pensão que administre­m essa dívida separadame­nte.

“O centro do problema é o gasto com o inativo. É o déficit da previdênci­a dos servidores, que está quebrada”, afirma Velloso.

“Tem de separar. O gasto com inativos tem uma tendência explosiva de cresciment­o.”

Além dos servidores, os próprios estados contribuir­iam com esses fundos, abastecend­o-os com imóveis, fundos imobiliári­os e ações de estatais, por exemplo.

“Você faz a conta: quanto vai exigir de recursos em um horizonte de 70 anos, por exemplo, e estabelece as contribuiç­ões previdenci­árias dos próprios servidores, que no limite podem ser elevadas, e dos estados”, afirma.

Independen­temente da solução, enfrentar a escalada de gastos nos estados é essencial para evitar que em quatro anos uma quantidade consideráv­el de entes bata às portas do Tesouro Nacional para pedir ajuda.

“O Tesouro vai ser alvo de uma pressão política muito grande”, diz Abrão. “Ou antecipamo­s uma solução para o problema ou vamos chegar ao final compromete­ndo a própria gestão fiscal federal.”

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