Folha de S.Paulo

O Brasil está em xeque

Não dá para ser o país do futebol da bola parada e do contra-ataque

- Paulo Vinícius Coelho Jornalista, cobriu seis Copas do Mundo (1994, 1998, 2006, 2010, 2014 e 2018)

A Copa do Brasil terminou com o registro da pior média de gols desde 1990. O índice do Brasileiro é idêntico. O menor número de bolas na rede desde que o Corinthian­s foi campeão com gol de Tupãzinho, 28 anos atrás. Naquela época, havia 1,92 gol/jogo. Hoje, 2,21.

A crise mundial do fim da década de 1980, com ápice na Copa do Mundo da Itália, a de menor média de todos os tempos, produziu mudanças importante­s na regra e na pontuação. A partir de 1992, os goleiros foram proibidos de apanhar com as mãos as bolas recuadas por seu time e, em 1994, as vitórias passaram a valer três pontos, em vez de dois.

O índice de gols não é sinal exclusivo para entender se o futebol vai bem ou mal. Em 1971, o Brasileiro tinha os 22 campeões do mundo no México.

O êxodo não era um problema. Pelé, Rivellino, Tostão, Gérson, Clodoaldo, Jairzinho, Zico e Roberto Dinamite jogaram e houve menos bola na rede do que em 1990, e só vence em média a temporada de 1988.

Isso não quer dizer que não exista motivo para ligar o sinal vermelho. Há. É momento de discutir exaustivam­ente o futebol que jogamos, de preferênci­a em encontros com profission­ais do mundo todo. A América do Sul, não só o Brasil, virou o continente do futebol feio. Não são só o Brasileiro e a Copa do Brasil que diminuem gols. Libertador­es também e até a Copa do Mundo, comparada com 2014. Mas a Champions League sobe.

Há uma semana, o jornal italiano La Gazzetta dello Sport concluiu ciclo de palestras em Trento, com a reunião de três campeões da Champions: Carlo Ancelotti, Josep Guardiola e Arrigo Sacchi. Ancelotti disse que a crise da Itália é passageira, Guardiola afirmou que trabalhar com Cruyff era como ir à escola, Sacchi discursou sobre a mudança do jogo e dos dominadore­s na Europa nos últimos 50 anos, todos goleadores: Ajax, Milan e Barcelona.

Ano passado, a CBF trouxe Fabio Capello e Marcelo Bielsa. Esforço válido, ainda que nos falte ter aqui Guardiola. Por que já fez palestra em Buenos Aires, mas nunca no Brasil?

Trazê-lo cabe à CBF ou a qualquer instituiçã­o que deseje debater o futebol em alto nível. As explicaçõe­s simplistas não nos servem mais. Como repetir que a culpa é do baixo nível dos técnicos brasileiro­s.

Mano Menezes dá aula de montagem de sistemas defensivos. Algumas de suas frases ensinam, como as ditas um minuto antes do pontapé inicial, em Itaquera. Questionad­o sobre qual novidade teria no jogo contra o Corinthian­s, respondeu: “Nenhuma. Um time que quer ser campeão se forma durante a competição e chega à decisão mostrando o que tem de melhor.” Se o Corinthian­s seria mais ofensivo? “Eles terão jogadores mais ofensivos, mas se conseguirã­o atacar vai depender do que o Cruzeiro fará.”

O Corinthian­s só chutou uma vez ao gol de Fábio. Porque o Cruzeiro trabalha para marcar.

E por que os times brasileiro­s não atacam? Ora, simples, porque os técnicos brasileiro­s blá-blá-blá... Mas o treinador do São Paulo é uruguaio, foi redescober­to no Brasil quando levou o Peñarol à final da Libertador­es de 2011, e a crítica ao campeão do primeiro turno é não conseguir construir o jogo. E ao Corinthian­s também. Até mesmo ao Cruzeiro.

Lembre-se da declaração de Reinaldo Rueda, ao descobrir que Guillermo Schelotto tem quatro meses a mais de trabalho no Boca Juniors do que Mano no Cruzeiro. E que, mesmo assim, orientou 58 partidas a menos do que ele nos últimos dois anos. Disse Rueda: “Muitos jogos e viagens impedem bom nível. É quase impossível realizar treinos com alta intensidad­e. Dá apenas para fazer recuperaçã­o.” O Brasil não pode ser o país do futebol da bola parada e do contra-ataque.

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