Folha de S.Paulo

A violinista da ZL que vai estudar em Salzburg

Violinista de Itaquera é aprovada em universida­de na cidade natal de Mozart

- Sílvia Haidar texto Marcelo Justo fotos

As mãos firmes de Nathalia Oliveira, 22, encaixam o violino entre o queixo e o ombro. Os cabelos escuros e cacheados ficam presos em um coque. Afinal, os fios não podem atrapalhar o vaivém preciso do arco sobre as cordas. Entre uma nota e outra, poucos dias antes de ingressar na Universida­de Mozarteum, em Salzburg, na Áustria, ela revela o entusiasmo de quem vai estudar na cidade natal do compositor Wolfgang Mozart.

“A Mozarteum está entre as melhores escolas de violino do mundo”, empolga-se a estudante que integrou por três anos a Orquestra Jovem do Estado.

Moradora de Itaquera, na zona leste de São Paulo, Nathalia começou a estudar música aos seis anos. “Uma vez vi um violino em um desenho animado e fiquei encantada com o instrument­o”, lembra.

A menina insistiu que queria aprender a tocar, e sua mãe a matriculou na Emesp (Escola de Música do Estado de São Paulo). Ela estudou lá até os 17 anos, quando foi aprovada para o vestibular de música, na Unesp.

A influência artística vem de família. Filha única, ela assistia ao pai cantar e à mãe a se apresentar com violoncelo na igreja. Lá, ela conheceu os irmãos Leonardo e João Vitor Carneiro de Salles, que tocam violoncelo e flauta transversa­l, respectiva­mente.

Em 2013, aos fins de semana, o trio saía do bairro na periferia paulistana e viajava de metrô até a avenida Paulista, onde tocava na calçada. Músicos de rua, eles foram tema da reportagem “Acordes da ZL”, publicada na Folha. “Era bem divertido. Às vezes, a gente conseguia um bom dinheiro”, lembra. “Mas tive que parar para estudar mais.”

Leonardo, aliás, embarca para Portugal no mês que vem. Ele vai dar início ao bacharelad­o em música na Universida­de de Aveiro. “Fico muito feliz por ver que a nossa evolução foi andando paralelame­nte até chegarmos aqui”, diz o jovem de 22 anos.

Para quem pretende seguir carreira na música, Nathalia dá uma dica: é preciso ter muita dedicação. “Costumo dizer que nós, músicos, vivemos em um mundo paralelo. Minha rotina sou eu e meu instrument­o. Geralmente, dentro de uma sala trancada”, desabafa.

Quando terminou a graduação, Nathalia decidiu estudar no exterior. Para pôr o projeto em prática, ela buscou a orientação da professora e violinista Maria Fernanda Krug. A preparação durou dois anos.

Nesse período, estudava violino cinco horas por dia, alemão seis horas por semana e aprendeu a tocar piano. Em junho, viajou para Salzburg, onde fez os testes.

Aprovada, a violinista se deparou com outro desafio. “A universida­de não dá bolsa. A taxa anual é de € 1.500, além dos gastos básicos. Então pedi ajuda ao Paulo Zuben, que é o diretor da Emesp.”

Nathalia foi apresentad­a ao maestro João Carlos Martins. “Fiquei tão impression­ado ao ouvi-la tocar, que a convidei para fazer uma demonstraç­ão na peça ‘Concerto para João’, no Teatro da Faap, e para se apresentar sob a minha regência, no Theatro Municipal”, conta. O músico a apoiou a criar uma vaquinha virtual. Em 50 dias, conseguiu arrecadar R$ 70 mil, o necessário para o primeiro dos quatro anos de bacharelad­o. A estudante começou o curso no mês passado.

Os planos para o futuro incluem voltar a São Paulo e, quem sabe, poder ajudar outros jovens com as mesmas aspirações que as dela. “Acho importante agregar conhecimen­to para o seu país. A conquista de qualquer brasileiro não é só dele. É uma conquista para a sociedade.”

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Nathalia Oliveira no Teatro Caetano de Campos
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Em 2013, a violinista tocava na av. Paulista com os irmãos Leonardo (violoncelo) e João Vitor (flauta transversa­l)
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SÁVIO LOPES

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