Folha de S.Paulo

Vielas medievais de Gênova convidam para passeios a pé

Cidade preserva arquitetur­a dos séculos 12 e 13 em mais de 60 palácios, igrejas e galerias

- Fernanda Reis

gênova (itália) Mapas são, ao mesmo tempo, seus melhores amigos e quase inúteis em Gênova. Mesmo com eles, você se perderá por seu labiríntic­o centro histórico, uma das maiores áreas de preservaçã­o da arquitetur­a medieval na Europa. Sem eles, porém, é bem difícil chegar do ponto A ao B e localizar os mais de 60 palácios da cidade.

Há ali igrejas e galerias abertas para visitação, mas boa parte das construçõe­s históricas é fechada. A graça é, justamente, passear a pé pelas vielas do centro, um museu a céu aberto, e aprender sobre o passado da cidade por meio de seus prédios.

A cada esquina, placas contam a história genovesa, que inclui figuras como Cristóvão Colombo, Marco Polo e Giuseppe Garibaldi. Suas construçõe­s mais antigas datam do século 12, como a torre Embriaci, que leva o nome de um conquistad­or da época das cruzadas.

Não se deixe enganar pelo mapa: dois lugares podem parecer distantes no papel, mas só é preciso pegar ônibus, carro ou metrô para conhecer praias mais afastadas do centro. Em dois dias, é possível conhecer seus principais pontos com calma.

Localizada na região da Ligúria, a menos de duas horas de trem de Milão, no norte da Itália, Gênova era uma das cidades mais importante­s para o comércio europeu nos séculos 12 e 13. Antiga potência marítima, foi berço de Colombo (1451-1506).

Uma pequena construção de pedra que supostamen­te foi sua casa é, aliás, um bom ponto de partida para conhecer o local. Nos arredores, ainda é possível ver, nas casas, a arquitetur­a da Idade Média e os restos da Porta Soprana, pela qual se adentrava a cidade quando era murada.

Da casa de Colombo, uma caminhada leva à praça de Ferrari, coração econômico de Gênova no século 19 e um dos lugares mais movimentad­os da cidade. Rodeada por prédios do governo e com uma fonte no meio, tem opções de café com mesas na calçada.

Ali figura uma grande estátua de Garibaldi, integrante de um movimento que lutava por uma Itália republican­a e parte de uma revolta em Gênova em 1834. Condenado à morte na Itália, ele veio ao Brasil onde se aliou a Bento Gonçalves e participou da Revolução Farroupilh­a.

Embora tenha sinais de wifi gratuito na praça, a internet não funciona nas ruas e é rara mesmo em restaurant­es. (Baixe o mapa da cidade no celular para usar quando estiver offline. Será útil.)

A praça abre três caminhos: para o centro, o porto e as galerias. Quem quiser ver lojas de grifes e andar por largas avenidas cobertas que lembram cidades grandes europeias, pode seguir para a galeria Giuseppe Mazzini ou para a via XX Settembre.

O contraste é grande com o centro histórico, de ruas estreitas e lojinhas escondidas —algumas abertas há 200 anos—, que demanda mais tempo para ser explorado.

Tanto o passeio pelo porto quanto pelo centro podem ser iniciados pelo palácio Ducale, hoje um centro cultural. Com sorte, você encontrará na frente dele um mercado de rua, com barracas que vendem o famoso pesto genovês, pães, frutas e doces.

A praça desemboca na via San Lorenzo, onde há uma catedral de mesmo nome, listrada em branco e preto. Não é especialme­nte grande e, como boa parte dos outros prédios da cidade, impression­a mais por fora do que por dentro.

Nesse ponto é preciso escolher: seguir em frente e chegar ao mar, ou enveredar pelo labirinto medieval.

Pelo centro o conselho é: embrenhe-se pelas ruas onde circulam lambretas e aprecie a vista das casinhas de cor clara, com roupas secando penduradas nas janelas. Há pontos em que, de braços esticados, é quase possível encostar os dedos nas paredes.

Fora das vias arteriais pouca gente caminha, e bate poucosol. Masplacass­inalizador­as, embora confusas, facilitam a localizaçã­o e, invariavel­mente, uma pracinha aparece num lugar inesperado.

Mesmo as menores das ruas escondem bons restaurant­es, cafés, lojas e sorveteria­s —onde é difícil encontrar quem fale inglês. As pessoas, porém, são simpáticas e, com um pouco do italiano aprendido nas novelas de Benedito Ruy Barbosa e bastante mímica, é possível se comunicar.

Já quem seguir em frente pela via San Lorenzo desembocar­á no Porto Antico. O clima ali é calmo: há pessoas sentadas em bancos literalmen­te a ver navios, tomando sorvete, caminhando pelo calçadão.

Do Il Bigo, um elevador panorâmico 360º pode-se ver a cidade incrustada no morro. Trata-se de uma interpreta­ção de um antigo guindaste do porto, usado para levantar cargas. Hoje, simboliza a renovação urbana na área portuária, realizada nos anos 1990.

Contornand­o o prédio Magazzini del Cotone, que abriga lojas e bares, têm-se uma bela vista do porto e do farol de Gênova, o mais alto do Medi-

terrâneo, construído em 1128.

É um passeio mais contemplat­ivo, para aproveitar o clima de porto e observar as ruínas e os prédios históricos. Fica ali o palácio onde Marco Polo foi aprisionad­o durante a guerra entre Gênova e Veneza, de onde escreveu relato sobre sua viagem à China.

O porto abriga também aquele que é o maior aquário da Europa, com mais de 12 mil animais de 600 espécies.

O passeio Il Bigo, que tem a vista do mar para a cidade, fica completo com uma visita ao Belvedere Luigi Montaldo, que dá a vista da cidade para o mar. Para chegar a ele, pegase a via Garibaldi, patrimônio mundial da Unesco.

A rua, uma das mais famosas de Gênova, é minúscula (são apenas 250 metros de compriment­o e 8 de largura), mas abriga um palácio ao lado do outro. Antigas residência­s de famílias ricas, essas construçõe­s erguidas no século 16 abrigavam visitas importante­s à cidade —quanto mais ilustre era o hóspede, melhor o palácio em que ficava.

O lugar é tão estreito que é difícil contemplar os prédios —fotografar, então, é impossível. Mas, no palazzo Rosso, há uma sala multimídia, com entrada gratuita, que conta a história da rua e tem uma maquete dos edifícios.

Chega-se ao mirante Luigi Montaldo por um elevador ou por escadas que partem da via Garibaldi. Quem for a pé precisa ter pernas: você sobe o primeiro lance e há uma curva, que revela mais um lance de escadas. Isso se repete por muitas vezes, até você pensar que será impossível chegar ao fim (são mais de 370 degraus, fora as rampas).

Mas vale a subida: de lá o viajante avista o porto e a cidade incrustada nas montanhas. Uma luneta facilita a observação e há muitos bancos sob a sombra de árvores para o descanso depois do exercício. E, de volta à via Garibaldi, não faltam opções de sorvetes. Procurar um espaguete à carbonara ou uma lasanha à bolonhesa em Gênova é tarefa árdua. Cada destino na Itália tem seu prato típico: em Milão, por exemplo, é o risoto milanês, à base de açafrão. Em Gênova, é o pesto.

Feito de manjericão, azeite, queijos parmesão e pecorino, pinoli e sal, o molho é onipresent­e. Até na sorveteria Gelatina há um sabor pesto.

“É melhor experiment­ar antes, não é todo o mundo que gosta”, sugere a atendente, oferecendo uma colherzinh­a de sorvete verde. O conselho é sábio: meio salgado, meio doce, é 100% esquisito.

Já nos restaurant­es, uma massa ao pesto é infalível. Mais comum que o espaguete é o trofie, macarrão típico da região da Ligúria, pequeno, cilíndrico e levemente torcido.

Nas pequenas casas do centro histórico, onde garçons não falam inglês, encontra-se ainda uma versão de trofie ao pesto com batatas e vagens.

Para comer na rua, boas opções são a focaccia genovesa e a farinata. A primeira é uma espécie de pão com cerca de dois centímetro­s de altura, cortado em retângulos cobertos com sal grosso. A segunda lembra uma panqueca feita de farinha de grão-de-bico — uma massa fina, salgada, que pode ser coberta com ervas.

Pequenas portas no centro vendem os dois salgados —em versões com cebola, queijo e pesto—, para comer de pé, no balcão, ou andando.

Como boa cidade italiana, Gênova tem sorveteria­s aos montes. A Gelatina é uma opção com sabores que mudam a cada dia, atendiment­o simpático (falam inglês) e cadeirinha­s na calçada.

Mais escondida, numa rua perto da praça de Ferrari, é a U Gelato du Caruggiu, com sorvetes bem cremosos, em sabores tradiciona­is ou exóticos, como açafrão com gengibre.

Também escondida fica a Romeo Viganotti, loja de chocolates de 1866. Placas indicam o caminho —parece que você está entrando numa cilada, numa portinha dentro de uma viela. Lá, encontram-se chocolates com pimenta, rosa, lavanda, sal, canela, frutas vermelhas em versões ao leite, amargas e brancas.

Na visita da reportagem, a atendente não falava uma palavra de inglês, mas, com mímica e um português pronunciad­o devagar foi possível sair com um saquinho de chocolates comprados por quilo.

A Romeo Viganotti tem também uma sorveteria e um café que serve docinhos e biscoitos como o canestrell­o —um amanteigad­o que se encontra em todo lugar— a poucos passos dali. Mas, atenção: cada loja tem um horário diferente.

Mais afastado do centro, mas a uma caminhada de dez minutos da praça de Ferrari, está o Mercato Orientale, que dá um panorama da culinária da Ligúria. Há queijos, vegetais como o aspargo roxo, frutas e massas secas —trofie, croxetti (redonda e achatada) e foglie d’ulivo (em formato de folha). E, é claro, pesto.

 ?? Henryk Sadura/Fotolia ?? Torres de Sant’Andrea, na porta Soprana,em Gênova
Henryk Sadura/Fotolia Torres de Sant’Andrea, na porta Soprana,em Gênova
 ?? Jack F/Fotolia ?? Praça de Ferrari, coração econômico da cidade no século 19
Jack F/Fotolia Praça de Ferrari, coração econômico da cidade no século 19
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 ??  ?? Acima, interior do palácio Ducale, hoje um centro cultural; à esq. a galeria Giuseppe Mazzini, com lojas de grife
Acima, interior do palácio Ducale, hoje um centro cultural; à esq. a galeria Giuseppe Mazzini, com lojas de grife
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 ??  ?? Acima, massas típicas da Ligúria no Mercato Orientale; à esq., passarela na porta Soprana, pela qual se entrava na cidade, naIdade Média
Acima, massas típicas da Ligúria no Mercato Orientale; à esq., passarela na porta Soprana, pela qual se entrava na cidade, naIdade Média
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