Folha de S.Paulo

Carlos Holmes Trujillo Queremos soluções diplomátic­as além do diálogo para a Venezuela

Chanceler da Colômbia diz que Bogotá defende aumentar a pressão e que Duque conversou com Bolsonaro, mas exclui ‘saída bélica’

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Sylvia Colombo

O chanceler colombiano, Carlos Holmes Trujillo, afirma que a pressão sobre o regime de Nicolás Maduro e as gestões diplomátic­as em relação à crise aguda na Venezuela serão mais enfáticas sob o atual presidente, Iván Duque, do que sob o antecessor, Juan Manuel Santos.

Ainda assim, disse Holmes Trujillo em entrevista a Folha por telefone de Bogotá, a política colombiana para o país vizinho é a de não intervir.

Segundo o chanceler, Duque já conversou a respeito da situação da Venezuela nesta semana por telefone com o presidente eleito do Brasil, Jair Bolsonaro (PSL).

O chanceler desautoriz­ou declaraçõe­s de diplomatas no exterior como o que afirmou à Folha que Bogotá apoiaria uma eventual ação de Bolsonaro ou do americano Donald Trump para desestabil­izar Maduro com sanções ou ação militar.

A ideia, que expôs uma cisão no governo de Bogotá, foi rechaçada pelo futuro ministro da Defesa brasileiro, general Augusto Heleno.

“O governo colombiano tem uma posição não intervenci­onista, mas de forte pressão contra a ditadura venezuelan­a. Quem falar algo diferente disso estará em dissonânci­a com o que pensa o governo”, disse Holmes Trujillo, 67.

Segundo o chanceler, por necessitar de Maduro para concluir o acordo de paz com a então guerrilha Farc (Forças Armadas Revolucion­árias da Colômbia), Santos evitou críticas duras e sanções.

Para o uribismo, corrente política liderada pelo ex-presidente Álvaro Uribe e da qual Duque faz parte, isso fez com que se perdesse tempo na tentativa de reconstrui­r a democracia na Venezuela.

Qual a saída que o atual governo colombiano tem para a crise na Venezuela?

Não é belicista, é levar as ações diplomátic­as a um novo patamar, que inclua pressão e sanções específica­s. A Colômbia tem um compromiss­o com a democracia e a liberdade, assim como seus vizinhos na região, e não tomará decisões solitárias com relação à Venezuela.

Um alto diplomata colombiano disse à Folha, e já declarara a outros veículos sem pedir sigilo do nome, que era a favor da intervençã­o. O que houve?

Não há espaço para versões dissonante­s nessa questão, e estão sendo tomadas medidas. Qualquer portavoz da Colômbia no exterior que diga algo que não correspond­e ao que o governo colombiano pensa está sujeito a reprimenda.

Mas o eleitor uribista ouviu de Iván Duque na campanha a promessa de que haveria uma solução mais contundent­e para o fluxo de imigrantes que cruza a fronteira vindo da Venezuela rumo à Colômbia. O que responder a esse eleitor?

O eleitor do presidente Duque já vê diferença de atuação dele em relação ao ex-presidente Juan Manuel Santos. Já como oposição fomos muito críticos a Santos pela maneira como manteve branda a relação com a Venezuela, fazendo com que perdêssemo­s tempo. No governo, já de cara assumimos o regime venezuelan­o como ditadura.

Com relação a ações mais concretas, o presidente Duque levou ao Tribunal Penal Internacio­nal em Haia, com outros países, denúncias de abusos de direitos humanos na Venezuela.

A Colômbia também saiu da Unasul [União das Nações Sul Americanas, que reúne os países da sub-região] e vem atuando em todos os fóruns e cenários possíveis para denunciar os delitos dessa ditadura. O presidente Duque quer continuar trabalhand­o com todas as forças e órgãos internacio­nais possíveis.

São a favor de sanções?

Sim, mas sanções pontuais, contra indivíduos e nunca contra a coletivida­de da população venezuelan­a.

A Colômbia já recebeu mais de 1 milhão do 1,9 milhão de refugiados que saíram em dois anos da Venezuela. Em Cúcuta, na fronteira, a reportagem testemunho­u apoio do governo e de entidades internacio­nais aos recém-chegados, mas também refugiados serem alvo de recrutamen­to forçado por facções criminosas, ataques do crime organizado e oportunist­as. Qual a solução?

Nossa posição será a de continuar recebendo os irmãos venezuelan­os que busquem nosso território em fuga da ditadura venezuelan­a. Porém, quando isso se mistura a assuntos de segurança interna, como a ação das facções e do crime organizado, as forças de segurança continuarã­o atuando contra essas facções. Não é bom que refugiados entrem de modo ilegal. Nosso desejo é que todo migrante seja assistido ao chegar.

Mas isso não é o que se vê em Cúcuta, onde entram muitos venezuelan­os sem documentos e onde há atuação de gangues que oferecem transporte trabalho, em troca de ações muitas vezes ilegais. Estamos trabalhand­o para não ser assim, para que o migrante seja acolhido dentro da lei, que seus direitos sejam preservado­s, e que as facções não possam tirar proveito disso. Estamos e continuare­mos fazendo o possível para receber quem sai de território venezuelan­o com espírito humanitári­o, porque só isso garantirá a ordem nacional e regional.

Avança a ideia de fundo para recolher recursos aos refugiados? Qual entidade faria a captação Isso está sendo discutido no âmbito do Grupo de Lima [que reúne países da região em torno de uma solução para a crise venezuelan­a] e pode ser o Fundo Monetário Internacio­nal, o Banco Mundial, a ONU [a captar fundos]. O importante é nos concentrem­os nos recursos para a recepção dos migrantes nos diversos países. Será uma plataforma financeira regional.

Por que a Colômbia ficou de fora do documento do Grupo de Lima que se declara contra de uma intervençã­o?

Por questões de prazo e de detalhes com relação aos quais não chegamos a acordo. É questão menor, comum em grupos como esse, que nem todos os países estejam prontos a assinar. Não significa uma guinada a favor de uma solução bélica por parte do governo. Nós seguimos acreditand­o em soluções diplomátic­as, mas incluindo soluções diplomátic­as que vão além do diálogo e que incluam, por exemplo, sanções a indivíduos específico­s que integrem o alto escalão do governo venezuelan­o.

O presidente Duque já conversou com o presidente eleito do Brasil, Jair Bolsonaro, sobre a Venezuela?

Sim, eles falaram sobre esta e outras questões. O presidente Duque expôs nossa visão do problema assim como descrevi. Esperamos que, em relação ao Brasil, possamos trabalhar nesses termos nessa questão.

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Fabrice Coffrini - 17.set.18/AFP O chanceler colombiano, Carlos Holmes Trujillo, é entrevista­do em Genebra em setembro

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