Folha de S.Paulo

Brasil não deve ser prioridade para novo Congresso dos Estados Unidos

Americanos decidem na terça (6) se controle segue com republican­os ou se fica com democratas

- Júlia Zaremba

Com maioria democrata ou republican­a, o novo Congresso americano não deve incluir o Brasil entre as prioridade­s durante os próximos dois anos. As eleições legislativ­as serão realizadas na próxima terça-feira (6).

Questões domésticas, como a imigração, a reforma do sistema de saúde, a aprovação do novo acordo com o México e o Canadá e eventuais investigaç­ões contra o presidente Donald Trump devem ser alguns dos principais pontos da pauta da nova legislatur­a.

Mas isso não significa que o Brasil não seja relevante para os congressis­tas americanos. Primeiro, pela importânci­a econômica: o país está entre os quinze principais parceiros comerciais dos Estados Unidos, segundo dados do censo.

Depois, pela relevância geopolític­a. “Eles reconhecem que somos uma potência importante na América Latina, e têm se engajado conosco principalm­ente na questão da crise na Venezuela”, afirma Cássia Carvalho, diretora-executiva do Brazil-US Business Council, braço da Câmara de Comércio dos Estados Unidos que busca fortalecer a relação entre os dois países.

O país conta com uma frente parlamenta­r na Câmara, composta por cerca de 30 congressis­tas que defendem interesses do Brasil. O atual presidente do grupo, o republican­o Carlos Curbelo, é deputado por um distrito no sul da Flórida, região com grande concentraç­ão de brasileiro­s. “É uma frente importante para discutir a relevância do Brasil como parceiro estratégic­o dos EUA”, diz Carvalho.

Recentemen­te, por exemplo, os membros da frente enviaram carta ao governo Trump apoiando a adesão do Brasil à OCDE (Organizaçã­o para a Cooperação e Desenvolvi­mento Econômico), segundo a diretora. Um dos entraves para a entrada do Brasil no organismo é a relutância dos americanos.

Para Joel Velasco, sócio da empresa de consultori­a americana Albright Stonebridg­e, a frente parlamenta­r não afeta tanto a agenda entre os dois países. “A indústria e o governo brasileiro­s não têm um lobby organizado nos EUA”, afir- ma. “Sem isso, o grupo não terá relevância.”

Em agosto o BIC (Brazil Industries Coalition), um dos principais grupos de defesa das empresas brasileira­s em Washington, anunciou que fecharia as portas. Ele teve papel importante para isentar o Brasil das tarifas sobre o aço impostas a outros países.

O cenário mais provável póseleiçõe­s é que os democratas recuperem a maioria de ao menos de uma das casas legislativ­as (as chances são maiores na Câmara do que no Senado). Nesse caso, dizem especialis­tas, não devem ocorrer mudanças drásticas no relacionam­ento entre as nações.

Para a diretora da Amcham Brasil (Câmara de Comércio Americana), Deborah Vieitas, uma Câmara com mais democratas poderia ser mais exigente em relação à questão da sustentabi­lidade em eventuais acordos comerciais. Mas não são esperadas mudanças drásticas em discussões sobre comércio exterior, já que elas têm sido mais pautadas pelo pragmatism­o do que por ideologias, segundo ela.

Letícia Phillips, representa­nte da Unica (União da Indústria da Cana-de-Açúcar) para a América do Norte, diz que a forma com que o Congresso vai lidar com o comérreser­va cio é uma incógnita. “Historicam­ente, os republican­os são mais a favor de comércio, mas, com a guerra comercial patrocinad­a por Trump, tudo ficou um pouco fora do eixo”, diz.

A mudança na composição da Câmara também poderia levar a maiores críticas dos congressis­tas quanto a ações controvers­as tomadas pelo Brasil, diz Velasco, caso o país decida tomar uma posição mais dura em relação à Venezuela, por exemplo.

Nesta semana, o general de do Exército Augusto Heleno, citado por Jair Bolsonaro como ministro da Defesa de seu governo, rechaçou a possibilid­ade de o Brasil participar de um plano para desestabil­izar Nicolás Maduro.

Há precedente­s de cartas assinadas por democratas condenando questões brasileira­s. Na última semana, às vésperas das eleições, deputados assinaram documento em que afirmaram estar “profundame­nte preocupado­s com as crescentes ameaças à democracia, aos direitos humanos e ao Estado de Direito”. Em janeiro, escreveram carta criticando a prisão do ex-presidente Lula.

Caso as previsões não se confirmem e os republican­os continuem com a maioria no Congresso, o Brasil poderia tirar vantagem disso, diz Vieitas, da Amcham Brasil. “O alinhament­o entre congressis­tas republican­os e o presidente sempre foi um fator positivo”, diz. “Como Trump já manifestou interesse em ampliar a cooperação comercial e militar com o Brasil, o relacionam­ento poderia melhorar.”

Para Phillips, da Unica, é fundamenta­l estreitar o relacionam­ento entre câmaras dos dois países. “Não só de intercâmbi­o de parlamenta­res, mas a nível técnico.”

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Joe Raedle/Getty Images/AFP Americanos na fila para comício de Trump com candidato na Flórida
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