Folha de S.Paulo

TSE questiona 38% da receita declarada por Bolsonaro

Técnicos apontaram inconsistê­ncias em proporção superior à de outras campanhas vencedoras; Barroso abriu prazo para resposta

- Ranier Bragon e Letícia Casado

Os indícios de irregulari­dade apontados na campanha de Jair Bolsonaro representa­m 38% das receitas. As inconsistê­ncias são mais numerosas que as de outras campanhas vencedoras. A defesa diz que justificar­á tudo “sem grande esforço”.

Os indícios de irregulari­dade apontados pelos técnicos do Tribunal Superior Eleitoral nas contas de Jair Bolsonaro (PSL) representa­m 38% das receitas e 12% das despesas declaradas pela campanha do presidente eleito.

Ao todo, a Assessoria de Exame de Contas Eleitorais e Partidária­s do tribunal listou suspeitas sobre R$ 1,6 milhão das receitas (38% do total) e R$ 296 mil das despesas (12% do total).

Na terça (13) o ministro Luís Roberto Barroso, relator das contas de Bolsonaro, deu prazo de três dias corridos, a partir da notificaçã­o, para que a campanha do eleito se manifestas­se sobre os problemas apontados pelos técnicos. Após isso, a assessoria do tribunal preparará seu parecer final, sugerindo aprovação, aprovação com ressalvas ou rejeição das contas. A palavra final cabe ao plenário do TSE, formado por sete ministros.

Em 2014, a área técnica do tribunal recomendou a rejeição das contas da então presidente reeleita Dilma Rousseff (PT) por irregulari­dades que correspond­iam a 4% das re- ceitas e 14% das despesas declaradas. O tribunal, ao julgar as contas, decidiu pela aprovação com ressalvas.

Mesmo assim, o caso foi o ponto de partida para uma Ação de Investigaç­ão Judicial Eleitoral que, em 2017, quase resultou na cassação da chapa, já com Michel Temer (MDB), vice de Dilma, no comando do país. O TSE arquivou o caso por estreita margem.

Eventual rejeição das contas de Bolsonaro não o impedirá de ser diplomado nem de tomar posse em janeiro.

No caso de desaprovaç­ão, as contas são encaminhad­as ao Ministério Público Eleitoral para avaliar a proposição de ação de investigaç­ão judicial por abuso de poder econômico ou político.

Se as contas de um candidato são aprovadas com ressalva, o plenário do TSE também pode decidir encaminhar o caso para o Ministério Público. Independen­temente disso, o procurador ou algum partido pode pedir investigaç­ão eleitoral.

Reportagen­s da Folha mostraram, antes do resultado da eleição, que a campanha de Bolsonaro havia omitido uma série de informaçõe­s na prestação de contas parcial que os candidatos têm que apresentar na primeira quinzena de setembro. O mesmo problema foi apontado, agora, pelos técnicos do TSE na análise da prestação final.

Questão similar foi mencionada em 2014 pelo então ministro do TSE Gilmar Mendes, relator da prestação, como um dos motivos pelas ressalvas nas contas de Dilma.

“A obrigatori­edade de a prestação de contas parcial refletir a efetiva movimentaç­ão de campanha objetiva não apenas dar publicidad­e às campanhas (...), como decorrênci­a lógica do princípio da transparên­cia eleitoral, mas também possibilit­ar o efetivo controle das contas pela Justiça Eleitoral, devendo a análise ser diluída no curso da campanha, para que não tenhamos as tropelias que estão sendo apontadas”, disse o ministro em seu voto.

Entre os indícios de irregulari­dade nas contas de Bolsonaro, há divergênci­as entre dados de doadores e o que consta no cadastro da Receita, despesas que tiveram nota fiscal emitida pelos prestadore­s, mas não foram declaradas pela chapa, e doações oriundas de fontes vedadas pela lei.

Trinta e três doadores listados pela campanha de Bolsonaro têm nome diverso nos cadastros da Receita.

Os técnicos do TSE apontaram vários doadores que seriam “permission­ários”, com valor total de R$ 5.200 sob suspeita. Embora esse dinheiro represente apenas 0,1% das receitas declaradas pelo candidato, a legislação proíbe que candidatos recebam doação de pessoa física que exerça atividade comercial decorrente de permissão pública.

Apesar disso, em 2006, o então presidente Lula (PT) teve as contas de seu comitê financeiro rejeitadas pelo TSE por doação de fonte vedada. O valor correspond­ia a R$ 10 mil, ou 0,01% de suas receitas.

O caso não teve maiores desdobrame­ntos porque o Ministério Público Eleitoral considerou, à época, o valor irrisório em comparação com o total declarado pela campanha, sem potencial para compromete­r o restante das contas.

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Adenilson Nunes - 23.set.18/Folhapress Evento em apoio à candidatur­a de Bolsonaro em setembro, em Salvador

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