Folha de S.Paulo

Michelle Obama se consolida como celebridad­e com lançamento de livro

Ex-primeira-dama narra em suas memórias a infância em Chicago e seus anos na Casa Branca

- Fernanda Mena

Fazia -6° C em Chicago na última terça-feira (13) e centenas de pessoas esperaram horas na fila para obter um exemplar autografad­o de “Minha História” (“Becoming”, no original em inglês), o livro de memórias de Michelle Obama.

O frisson em torno da turnê da biografia da ex-primeira-dama indica que ela pode ter deixado a Casa Branca e as amarras da vida institucio­nal para assumir seu posto de celebridad­e com substância.

Julie Shelton, 63, era uma das que passavam frio. Para ela, apesar de Michelle sempre ter tido alta aprovação, “seu contraste com os Trump é tão latente que isso pode estar aumentando ainda mais sua popularida­de”.

A tarde de autógrafos no sul de Chicago, numa livraria a oito quarteirõe­s do casarão onde a família Obama viveu e que mantém na cidade, foi o primeiro dos 15 eventos de lançamento da biografia.

Na mesma noite, ela seria entrevista­da pela amiga e apresentad­ora Oprah Winfrey no estádio do Chicago Bulls, para 14 mil pessoas, evento cujo preço médio do ingresso era R$ 2.300.

O livro foi traduzido para 24 idiomas simultanea­mente e foi lançado no Brasil pela editora Objetiva.

“Eu sou uma pessoa comum em uma jornada extraordin­ária”, escreve ela no epílogo de “Becoming”. A frase funciona bem como slogan, mas é, em parte, traída pelo próprio livro da ex-primeira-dama.

Seria tão comum uma menina de classe baixa, criada no extremo sul de Chicago –pobre, negro e, hoje em dia, extremamen­te violento– se formar em duas das mais prestigios­as universida­des do mundo, Princeton e Harvard?

E quão comum é ter ganho, aos 25 anos, mais dinheiro num grande escritório de advocacia do que seus pais ao longo de toda uma vida?

Por outro lado, a “self-made woman”, emancipada e bemsucedid­a, se tornou figura pública a reboque da trajetória do marido e a despeito de sua falta de simpatia pela política.

“Como sempre me perguntam isso, quero deixar claro: eu não tenho a menor intenção de disputar qualquer cargo político. Nunca fui fã de política e minha experiênci­a ao longo dos últimos dez anos pouco fez para mudar isso”, escreve Michelle, como vacina para os potenciais rumores de que o livro prepararia o terreno para uma candidatur­a.

“Becoming” certamente seria um bom começo. Tratase da história de sua vida privada, antes e depois de Obama, na qual equilibra, em prosa leve, episódios de superação, humildade e honestidad­e. Tudo, no entanto, parece fruto de um cálculo tão bem construído quanto os discursos que levaram Barack à Presidênci­a dos Estados Unidos.

De acordo com o jornal Financial Times, o casal Obama teria negociado a biografia por US$ 65 milhões.

A cada capítulo, “Becoming” revela algo, mas sem causar dano aparente.

Assim, o leitor não deve esperar encontrar detalhes sobre os bastidores das campanhas de Obama e do dia a dia dos mandatos, mas descobrirá que, mesmo quando Bin Laden foi localizado no Paquistão, ele não foi tema do jantar da família Obama, onde o assunto eram eles e as filhas.

O livro é dividido em três partes. A primeira é a de leitura mais saborosa. Michelle começa a narrativa contando como era vida no pequeno apartament­o da avenida Euclides, onde cresceu com os pais e o irmão Graig. Passa pelo despertar sobre a questão racial, na vida estudantil, quando se sentia como “uma semente de papoula num pote de arroz”. E culmina com sua consagraçã­o como advogada de um dos maiores escritório­s de Chicago, onde se tornaria conselheir­a de um estagiário de nome esquisito que a irritou ao se atrasar para seu primeiro dia de trabalho. Era Barack Obama.

Na segunda parte do livro, Michelle relata o início da vida do casal Obama e do despontar da carreira política de Barack, sempre de uma perspectiv­a íntima e familiar.

Trata do difícil episódio da perda do bebê de sua primeira gestação e revela a realização de tratamento de fertilizaç­ão in vitro para a concepção das filhas Malia e Sasha. Ela também toca em um tabu: em tempos de desencontr­os, ela e Barack fizeram terapia de casal na tentativa de acertarem os ponteiros. Deu certo.

A terceira parte remonta aos anos na Casa Branca, em que Michelle se esforçava para manter a vida mais normal possível, tarefa inglória para um contexto com 132 quartos, 35 banheiros e 28 lareiras, em que as janelas nunca podem ser abertas por segurança.

Após oito anos, Michelle já havia incorporad­o os protocolos. E, ainda que os Obama tivessem ensaiado o ritual de passagem da residência para os Trump, foi uma das tarefas mais difíceis desses anos todos, assim como assistir à cerimônia de posse.

“Sentada no palco em frente ao Capitólio pela terceira vez, eu me esforcei para conter minhas emoções. A diversidad­e vibrante das duas últimas posses tinha sido substituíd­a por uma uniformida­de desalentad­ora, branca demais e masculina demais.”

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Kevin Winter - 15.nov.18/AFP Michelle Obama em evento de lançamento do livro na Califórnia
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Minha História Michelle Obama, ed. Objetiva, R$ 59,90 (426 págs.)

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