Folha de S.Paulo

Contradiçõ­es

São Paulo aposta em Jardine, de estilo parecido ao de Ceni, demitido do clube

- Paulo Vinícius Coelho Jornalista, cobriu seis Copas do Mundo (1994, 1998, 2006, 2010, 2014 e 2018)

Raí é admirador do trabalho de André Jardine, e Leco o definiu como plano A para 2019. A filosofia de Jardine é oposta à de Diego Aguirre. Gosta da troca de passes, agressivid­ade pelos lados de campo, marcação no campo de ataque. Treinadore­s assim, muitas vezes, começam a cair pelas críticas de nós mesmos, feitas nos jornais e na TV. Exemplos disso são Maurício Barbieri, Thiago Larghi, Roger Machado e Rogério Ceni.

Todos esses desejam o mesmo que Jardine: jogar em alto nível e em busca do gol.

O São Paulo não tem certeza se Jardine está pronto e por isso não o anunciou como efetivo. Também não tem convicção de que o estilo é o ideal para ser adotado numa temporada com Libertador­es, Brasileiro, Copa do Brasil e Paulista. É ótimo jogar para a frente. A roda viva de calendário cheio e dois elencos diferentes no ano atrapalha muito.

Atrapalhou Rogério Ceni. Nesta semana, o técnico campeão da Série B fez uma avaliação do que o impediu de ter, no Morumbi, o mesmo sucesso do Fortaleza. Não tocou na sua inexperiên­cia, mas pôs o dedo em feridas importante­s. Citou perdas de jogadores como David Neres, Luiz Araújo e Thiago Mendes. Tem gente que nem se lembra deles. Os dois últimos eram esteio da equipe.

Rogério citou uma vitória por 2 a 0 sobre o Palmeiras, em maio, quando organizou a equipe para ter Luiz Araújo no mano a mano, nos contraataq­ues. O jovem atacante fez um dos gols. Daquele dia, um ano e meio atrás, o São Paulo já negociou nove titulares.

Nesse ciclo vicioso, é sempre muito mais fácil apostar em “times de resposta”, como o de Aguirre, do que numa equipe planejada para atacar. Mais fácil sempre é fechar a defesa e treinar bolas paradas. É o cardápio do Brasileiro. Poderá ser muito melhor, com mais treinos, menos êxodo de craques e mais sequência de comissões técnicas.

Por tudo isso, apostar em Jardine parece um sopro de inteligênc­ia. Ao mesmo tempo, uma contradiçã­o.

Porque significa apostar no estilo que Rogério Ceni tentava implantar, antes de ser demitido. Com o risco ampliado de Jardine não ter o respeito da crítica e o carinho da torcida que Rogério possui. Mas está fora de questão o retorno de Rogério agora. O clube não quer trabalhar com o mito, e a recíproca é verdadeira, enquanto Leco for o presidente. Se contratass­e Rogério, Raí poderia ser candidato ao prêmio Nobel da paz.

Se apostar em Jardine e der tempo para os resultados aparecerem, fará bem ao São Paulo e ao futebol brasileiro.

Reflexões

O Palmeiras pode ganhar o título na mesma semana em que elegerá seu novo presidente. No passado recente, eleições no clube significav­am o sonho de voltar a ter equipes protagonis­tas. Hoje, o Palmeiras tem. Mas a eleição exige reflexões importante­s, postas pelo candidato da oposição, Genaro Marino.

Está em questão a soberania do clube ou a submissão à patrocinad­ora, Leila Pereira, que contribui com apenas 13% da receita. O Palmeiras conseguiu, na soma das gestões Paulo Nobre-Maurício Galiotte, fazer do sócio torcedor um aliado maior do que o patrocínio. Está em questão a transição do modelo de contrataçõ­es caras para um projeto de ter um terço do elenco vindo da base. Alexandre Mattos diz concordar com isso, mas ainda parece sonho.

Está em debate o que o Palmeiras precisa fazer para ser soberano e forte por décadas, e não por um período rápido, em que estampa uma marca na camisa, como na era Parmalat.

Além de abrir um champanhe, o eleitor palmeirens­e deve pensar no que o clube planeja para seus próximos dez anos.

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