Folha de S.Paulo

Testes genéticos são base de dietas e treinos personaliz­ados

Laboratóri­os apostam na populariza­ção de exames, que têm custo alto no país

- Renan Marra

Comum nos Estados Unidos, testes genéticos voltados a um estilo de vida mais saudável ainda são pouco disseminad­os no Brasil. Mas a demanda crescente por dietas e treinament­os físicos personaliz­ados tem estimulado o surgimento de startups nesse nicho.

Há proliferaç­ão de laboratóri­os que, com as informaçõe­s dos genes, prometem melhora da alimentaçã­o e do desempenho físico das pessoas, diz Wagner Baratela, assessor médico em genética molecular do Fleury Medicina e Saúde.

A empresa de teste genético DGLab, criada em 2014, aumentou em dez vezes o número de clientes após começar, no ano passado, a relacionar dados do DNA com hábitos de saúde e alimentaçã­o.

O sócio da DGLab Rodrigo Ramos diz que a grande dificuldad­e dessas empresas hoje é o alto custo dos testes no país. São poucos os laboratóri­os brasileiro­s que têm infraestru­tura e mão de obra qualificad­a para fazer o mapeamento genético. Como alternativ­a, as amostras de DNA costumam ser enviadas ao exterior, o que encarece o processo.

“A margem de lucro da maioria dos laboratóri­os não é alta. Essa margem será maior quando nacionaliz­armos a maior parte da produção”, afirma Ramos, sem revelar o faturament­o da DGLab. A empresa tem, hoje, uma parceria com um laboratóri­o dos EUA.

Como o investimen­to inicial e o custo de manutenção do negócio são altos, ele recomenda que só empresas já conhecidas no mercado abram laboratóri­os para fazer mapeamento genético no país.

No Brasil, esses testes custam, em média, R$ 2.000. Mas, com o avanço da tecnologia, laboratóri­os estimam que esses preços devem cair pela metade no ano que vem e apostam na populariza­ção dos mapeamento­s genéticos.

Mais de 99% dos genes humanos são iguais, diz a nutricioni­sta da DGLab Annete Marum. As pequenas mudanças, que determinam as cores do cabelo e dos olhos, a altura e as formas do corpo são chamadas de polimorfis­mo.

O metabolism­o e a reação do organismo para cada tipo de alimento também variam e podem afetar as tarefas do dia a dia. Com o mapa genético, é possível definir a melhor estratégia para que a pessoa atinja o seu objetivo, inclusive o de melhorar o seu rendimento no trabalho.

“Uma das dietas da moda é o low carb [baixo carboidrat­o]. Acontece que, dependendo da pessoa, a sensibilid­ade ao carboidrat­o é muito baixa, e ela engorda pouco. Em compensaçã­o, a sensibilid­ade à gordura saturada é alta. Então, se ela diminui o carboidrat­o e come mais gordura, ela deveria fazer o inverso”, afirma Rodrigo.

Preocupada com o peso ideal, a médica Flávia Pedroso se aventurou em várias dietas da moda. O resultado foi cansaço extremo. A mudança, diz, aconteceu apenas depois de fazer o teste de DNA, que indicou a necessidad­e de uma dieta low carb. Depois disso, diz que a concentraç­ão e a disposição melhoraram.

Segundo Daniel Lindernber­g, diretor-executivo da plataforma digital criada no ano passado InYou, que sugere mudanças no comportame­nto, perguntas do dia a dia devem estar associadas aos testes genéticos.

Para participar, o cliente faz gratuitame­nte o download do aplicativo e responde um questionár­io de cem perguntas sobre temas variados, como alimentaçã­o, hábitos, sono e relacionam­entos.

Então, a empresa utiliza algoritmos de inteligênc­ia artificial e computação cognitiva para compilar respostas médicas e produzir um programa estruturad­o em três categorias: fitness, nutrição e meditação, de acordo o perfil de vida de cada usuário. Para informaçõe­s ainda mais precisas, é possível pagar por um teste de DNA.

De acordo com Rodrigo Ramos, da DGLab, quando os preços dos testes baixarem, as empresas devem ganhar mercado entre companhias que oferecem seus serviços como benefício corporativ­o. “Elas querem maior produtivid­ade, e isso está ligado à saúde do funcionári­o.”

Parcerias do tipo já acontecem. Em maio, a InYou fechou acordo com a startup Kenoby, que adotou um programa de saúde envolvendo dieta alimentar e atividade física para os seus 60 funcionári­os elaborado conforme o resultado do teste de DNA de cada pessoa.

O programa, entretanto, teve de ser interrompi­do após um mês pela InYou, que não obteve vantagem financeira com o acordo por causa do alto custo do teste feito nos EUA. Segundo a empresa, há uma negociação em curso para esse processo ser feito no Brasil já a partir do ano que vem, o que reduziria esse preço considerav­elmente.

O assessor médico em genética molecular Wagner Baratela diz que esses testes devem ser vistos com cautela. Segundo ele, ainda não há literatura médica robusta para comprovar a associação de dietas ou atividades físicas ao resultado do teste do DNA.

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