Alvos da Lava Jato querem mudança na lei, e Moro reage
Futuro ministro diz que proposta, que abranda punição para diversos crimes, é problemática e deve ser deixada para a próxima legislatura
Grupo de parlamentares de partidos envolvidos nas investigações da Lava Jato pressiona o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), a colocar em votação, nas próximas semanas, projeto que altera a execução penal. A ideia é coibir a superlotação carcerária.
O texto afrouxa punição a diversos crimes, incluindo os de colarinho branco.
Para Sergio Moro, futuro ministro da Justiça, o tema é controverso e não deveria ser votado nesta legislatura. “Confio que o Congresso terá a sensibilidade de aguardar”, disse à Folha.
brasília Um grupo de parlamentares de partidos envolvidos nas investigações da Lava Jato pressiona o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), a colocar em votação nas próximas semanas projeto que altera as regras de execução penal no Brasil, afrouxando a punição a diversos crimes, incluindo os de colarinho branco.
Integrantes do PP —uma das siglas mais implicadas no escândalo da Petrobras e a terceira maior bancada na Câmara—, entre outros partidos, dizem ser essa uma das condições para o apoio a Maia, que tentará a reeleição ao cargo em fevereiro.
Questionado se irá colocar o projeto na pauta de votações, o presidente da Câmara afirmou: “Estou estudando o assunto e ouvindo algumas pessoas antes de decidir”.
Investigado em inquérito decorrente de delação da Odebrecht, ele nega que haja colegas propondo o apoio em troca da votação. “As condições pra votar este e outros projetos é que possam caminhar em harmonia com os outros Poderes e o Ministério Público.”
A Folha confirmou a existência da pressão na semana passada com parlamentares que falaram sob a condição de se manter no anonimato.
Procurado, o futuro ministro da Justiça de Jair Bolsonaro, Sergio Moro, disse que a proposta tem vários pontos controversos. “Entendo que a apreciação de projetos de reformas da lei penal deve ser adiada para a próxima legislatura para que o novo governo possa apreciá-los. O PL 9054/17 tem pontos muito problemáticos”, disse Moro.
Ele cita o caso de progressão de pena antecipada em casos de presos de unidades superlotadas e a exigência de sentença para o reconhecimento de falta grave de um presidiário, o que, segundo ele, pode levar anos. “O projeto pode inadvertidamente implicar a soltura antecipada de presos perigosos e prejudicar a disciplina nas prisões. Confio que o Congresso terá a sensibilidade de aguardar”, afirmou Moro, que foi o juiz responsável pela Lava Jato em Curitiba até o início do mês.
Questionado sobre os casos de abrandamento de punição a crimes de colarinho branco, ele não fez mais comentários.
Responsável pela articulação política de Michel Temer, o ministro Carlos Marun afirmou que o governo não tem opinião sobre a proposta, mas externou sua posição pessoal: “Defendo que o Brasil busque consensos. E penso que o primeiro deles deveria ser o absoluto respeito, por todos os Poderes, da literalidade da lei. Chega de vermos interpretações criativas balizando sentenças e atitudes de autoridades.”
Temer é alvo de duas denúncias sob acusação de corrupção passiva e organização criminosa. Elas estão congeladas e serão retomadas após o fim de seu mandato.
Elaborado por uma comissão de juristas instalada pelo Senado e que concluiu seu trabalho no final de 2013, o projeto foi assinado pelo então presidente do Senado, Renan Calheiros (MDB-AL), também alvo da Lava Jato, e foi aprovado na Casa em 2017.
O texto de 37 páginas tem como eixo principal o abrandamento de penas e regras com o objetivo de combater a superlotação do sistema penitenciário, facilitar a ressocialização de presos e reduzir a burocracia do sistema. Para isso, abranda a punição para diversos tipos de crimes, desde que atendidos alguns pressupostos.
Uma das mudanças possibilita a substituição da prisão por pena restritiva de direitos (proibição de sair de casa após determinado horário, por exemplo), nos casos de condenação a penas inferiores a cinco anos (desde que se trate de crimes não praticados com violência), como associação criminosa e fraude em licitações.
Outra permite ao Ministério Público negociar a suspensão do processo para crimes com pena mínima de três anos, em vez de um ano, como é hoje. O autor ficaria com diretos restringidos no período e, ao final, pode ter a punição extinta.
“Em sendo aprovada tal redação, possível será, em tese, a aplicação do instituto a diversos crimes de significativa ofensividade, em especial, crimes financeiros e contra a administração pública, a saber: peculato, corrupção passiva e ativa, lavagem de capitais e organização criminosa”, escreveu no ano passado o Centro de Apoio Operacional das Promotorias Criminais, do Júri e de Execuções Penais do Ministério Público do Paraná em estudo sobre a proposta.
O projeto também eleva de 8 para 9 anos a exigência de que os condenados comecem a cumprir a pena em regime fechado e coloca na lei a previsão de mutirões da Justiça para antecipar benefícios a presos em caso de superlotação, entre outros pontos.
Na visão dos juristas que participaram da formulação das propostas, as alterações vão conferir ao sistema penal “coerência necessária aos reclamos nacionais”. “A comissão procurou modernizar e inovar, tendo em vista o binômico que preside toda a execução penal: garantia de direitos fundamentais dos sentenciados e garantia dos direitos fundamentais da sociedade diante do fenômeno da criminalidade”, dizia o relatório final do grupo.
Em 2016, a Câmara tentou votar de surpresa projeto gestado nos bastidores da Casa que visava abrir uma brecha para anistiar políticos na mira da Lava Jato. A manobra foi abortada após vir à tona.
“O projeto pode inadvertidamente implicar a soltura antecipada de presos perigosos e prejudicar a disciplina nas prisões. Confio que o Congresso terá a sensibilidade de aguardar a análise do próximo governo, a fim de aprimorar o projeto Sergio Moro futuro ministro da Justiça
“Estou estudando o assunto e ouvindo algumas pessoas antes de decidir Rodrigo Maia presidente da Câmara, sobre a possibilidade de votar a proposta